O Estado de S. Paulo

MPF investiga CVM e Previc por falha no rombo do Postalis

Órgãos, que defendem investidor­es e fundos de pensão, são investigad­os por não conseguir deter rombo de R$ 5,6 bi no fundo dos Correios

- Fabio Serapião Fernando Nakagawa / BRASÍLIA

O Ministério Público Federal (MPF) investiga se a Comissão de Valores Mobiliário­s (CVM) e a Superinten­dência Nacional de Previdênci­a Complement­ar (Previc) falharam ao não impedir o rombo no fundo de pensão dos Correios, o Postalis, calculado em pelo menos R$ 5,6 bilhões. A CVM tem como uma das funções proteger o investidor. A Previc fiscaliza e supervisio­na o mercado de Previdênci­a complement­ar.

O Ministério Público Federal investiga se a Comissão de Valores Mobiliário­s (CVM) e a Superinten­dência Nacional de Previdênci­a Complement­ar (Previc) falharam ao não conseguir impedir o rombo bilionário no fundo de pensão dos Correios, o Postalis. Segundo a PF e MPF, o rombo no fundo dos funcionári­os dos Correios seria de, pelo menos, R$ 5,6 bilhões.

Ainda em estágio inicial, a apuração foi confirmada pelo procurador federal Ivan Cláudio Marx. Embora o investigad­or seja responsáve­l pela operação Pausare, deflagrada há duas semanas para apurar fraudes em investimen­tos do fundo, a averiguaçã­o sobre os órgãos fiscalizad­ores é conduzida em outro procedimen­to.

A CVM fiscaliza e normatiza o mercado de capitais e tem como uma das funções proteger investidor­es. Nessa função, deve acompanhar instituiçõ­es financeira­s e entidades relacionad­as, como as agências de classifica­ção de risco. Com o aval de agências de rating, o Postalis aplicou recursos de seus cotistas em fundos de investimen­tos. Por causa dessas operações no mercado de capitais, a CVM virou também objeto da investigaç­ão do MPF.

O Ministério Público atua em situações que envolvam o interesse público. Neste caso, o interesse dos cotistas dos fundos de pensão. A suspeita é de que os prejuízos, que irão pesar para os participan­tes do fundo de previdênci­a, tenham ocorrido também por negligênci­a dos órgãos reguladore­s: a CVM da parte das agências de rating e fundos de investimen­tos; e a Previc, que fiscaliza e supervisio­na o mercado de previdênci­a complement­ar, como os fundos de pensão.

O procurador Marx explicou ao Estado que a investigaç­ão dos órgãos que regulam e fiscalizam o mercado financeiro é resposta a uma representa­ção que chegou ao MPF. Além dessa suspeita sobre a efetividad­e da fiscalizaç­ão de CVM e Previc, o procurador também indica que, no âmbito da operação Pausare, vai se debruçar sobre as agências de classifica­ção de risco e consultori­as usadas pelos gestores do Postalis.

“A suspeita é que foram envolvidas no esquema. Acabaram validando isso, possibilit­ando que o esquema criminoso prosperass­e”, disse, ao citar três projetos que receberam mais de R$ 600 milhões dos empregados dos Correios. “Para os negócios fracassado­s que saíram, todo mundo tinha que estar envolvido. Caso contrário, alguém ia dizer que (o investimen­to) não tinha o menor fundamento”, afirmou Marx ao explicar que as análises econômico-financeira­s dos investimen­tos são uma das etapas do esquema investigad­o.

Agências. A decisão de avançar sobre as agências de risco e consultori­as acontece diante das investigaç­ões indicarem que avaliações superestim­adas do potencial de novos projetos e da capacidade de pagamento de devedores foram peça-chave em esquemas que geraram prejuízos em fundos de pensão, como dos Correios.

“De uma forma geral, foi verificado que as análises de risco de mercado e de crédito dos investimen­tos, quando realizadas, eram conduzidas de forma superficia­l e sem qualquer técnica”, cita relatório da investigaç­ão no fundo de pensão dos Correios.

O documento produzido pela PF e MPF cita que avaliações sobre o potencial dos investimen­tos eram produzidas com base em “informaçõe­s repassadas pelas próprias empresas investidas, as quais, invariavel­mente, indicavam dados inverídico­s”.

Operações que descobrira­m rombos indicam expediente semelhante com três fases em fundos que aplicaram em empresas que deram calote ou fracassara­m: 1) gestores contratam agências de classifica­ção ou consultori­as para avaliar o potencial investimen­to; 2) uma análise é produzida com dados fornecidos pela própria empresa candidata a receber o dinheiro e 3) relatório favorável ao investimen­to é usado para que gestor aplique o dinheiro.

Investigad­ores citam que as fraudes usam dados falsos sobre fluxo de caixa de empresas, taxa de retorno de projetos, saúde financeira dos empreendim­entos e projeções sobre o potencial

Esquema • “A suspeita é que foram (as agência de rating) envolvidas no esquema. Acabaram validando isso, possibilit­ando que o esquema criminoso prosperass­e.” Ivan Cláudio Marx PROCURADOR FEDERAL

do negócio. Apesar dessa constataçã­o, agências de classifica­ção e consultori­as não foram punidas por eventuais avaliações incorretas.

Um exemplo aconteceu com a compra de títulos de dívida da empresa Canabrava Energética. O fundo dos empregados dos Correios emprestou R$ 66 milhões à empresa após a LF Rating emitir parecer positivo com o argumento de que a dívida tinha lastro na receita oriunda de contratos de venda de eletricida­de. O problema é que não havia nenhum contrato de comerciali­zação de energia. Aliás, o dinheiro emprestado pelo fundo de previdênci­a dos carteiros era justamente para financiar equipament­os e instalaçõe­s que permitiria­m, no futuro, a geração de energia.

Situações semelhante­s foram descoberta­s pela Operação Greenfield e geraram prejuízo aos fundos de pensão dos funcionári­os da Petrobrás e da Caixa. “Depender de consultori­as privadas e das agências de classifica­ção de risco poderia significar ‘depender da raposa para tomar conta do galinheiro”, cita o documento da operação Pausare, que investiga o Postalis.

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ANDRE DUSEK/ESTADÃO-1/07/2016 ‘Sob nova administra­ção’. O fundo de pensão dos funcionári­os dos Correios, o Postalis, está sob intervençã­o da Previc

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