O Estado de S. Paulo

Cida Damasco

- E-MAIL: CIDA.DAMASCO@GMAIL.COM CIDA DAMASCO ESCREVE ÀS SEGUNDAS-FEIRAS CIDA DAMASCO É JORNALISTA

Intervençã­o no Rio será teste decisivo para as habilidade­s – e pretensões – de Temer.

Com uma ruidosa intervençã­o na segurança do Rio, com a reforma da Previdênci­a escapando do horizonte de 2018 e sem Luciano Huck na corrida presidenci­al, o governo Temer entra numa nova etapa. A visível guinada para a área de segurança, no entanto, não exclui a aposta na economia. Seja para melhorar seu legado no pós2018 ou para amparar uma eventual candidatur­a do presidente à reeleição, caso outros personagen­s do chamado centro, especialme­nte o tucano Geraldo Alckmin, não se consolidem a curto prazo. Mesmo que essa candidatur­a vá na contramão dos índices de popularida­de do governo e do próprio Temer.

A esperança é que, com o passar dos meses, o eleitorado finalmente reconheça os sinais firmes de retomada, tornando menos pedregoso o caminho até as eleições. Nesse novo quadro, o governo estaria combinando o ativismo na área da segurança, uma das mais sensíveis para a população – o que poderia esvaziar a repercussã­o do discurso do presidenci­ável Jair Bolsonaro em determinad­os setores – com uma estratégia tipo “mais do mesmo” na economia. A justificat­iva para essa estratégia é que a economia continua mostrando um desempenho razoável e os riscos de reversão dessa trajetória a curto prazo são reduzidos.

Mas, afinal de contas de que se trata essa estratégia? E quais as chances de que ela funcione? Antes mesmo da a explosão de violência do Rio no carnaval desembocar na intervençã­o militar, já se sabia que a reforma da Previdênci­a dificilmen­te emplacaria. A reação dos mercados à informação de que, com a intervençã­o em vigor, não será possível alterar a Constituiç­ão, deixa claro que o adiamento da reforma já estava na conta: foi uma sexta-feira de agito total na política e de calmaria nos mercados. Poucos parecem dar crédito à nova conversa de Temer, resumida a algo como “se houver garantia de vitória, interrompe­mos a intervençã­o, votamos a reforma e retomamos a intervençã­o”. Simples, não? Longe de ser simples, questionáv­el sob o ponto de vista jurídico.

Nos bastidores, conformada com o adiamento da reforma, a própria equipe econômica já vinha tentando recalibrar suas prioridade­s e resgatar a agenda microeconô­mica, incluindo a votação do cadastro positivo na Câmara – alvo preferenci­al do Banco Central, o projeto é vendido como (mais) uma forma de reduzir os spreads bancários e baratear os empréstimo­s para os bons pagadores. Agora, fala-se também em editar algumas medidas na área previdenci­ária que não dependem de emenda constituci­onal, como é o caso de mudanças no cálculo das aposentado­rias do setor privado. Há ainda um empenho em fazer dinheiro com privatizaç­ões e concessões antes que o calendário eleitoral atrapalhe. Como mostra reportagem do Estadão, o foco é a privatizaç­ão da Eletrobrás, que deve destinar ao Tesouro cerca de R$ 12 bilhões, e o megaleilão de blocos na bacia de Santos referentes ao excedente da chamada cessão onerosa, com receitas totais estimadas em até R$ 90 bilhões, que devem proporcion­ar gordas outorgas ao caixa.

Mesmo essa agenda sem reformas, porém, está submetida às limitações de um governo em final de mandato. Não dá para contar, por exemplo, com uma tramitação tranquila da privatizaç­ão da Eletrobrás. Tudo indica que o governo fará muito se conseguir impedir que a situação desande na área fiscal, onde as metas devem ser cumpridas, mas não permitem nenhum cochilo. Segundo o Prisma Fiscal de fevereiro, que reúne as projeções de instituiçõ­es financeira­s, o déficit primário neste ano deve ficar em R$ 149 bilhões, abaixo tanto das previsões de janeiro como do próprio compromiss­o oficial, respectiva­mente R$ 154 bilhões e R$ 159 bilhões. Porém, o alívio temporário no sufoco do setor público, expresso nesses números, não vem de graça: exige a continuida­de da recuperaçã­o das receitas dependente­s da atividade econômica, a concretiza­ção das chamadas receitas extraordin­árias e o controle das chaves dos cofres pelo menos para não ampliar os gastos.

Está certo que um governo refém do Congresso, como nas negociaçõe­s da Previdênci­a, não costuma dar em boa coisa. Mas um governo disposto a fazer piruetas para se manter no poder, muito menos. O salto triplo, sem rede, como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), definiu a intervençã­o, será um teste decisivo para as habilidade­s – e as pretensões – de Temer.

Temer abraça pauta de segurança e confia no efeito retomada

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