O Estado de S. Paulo

Otimismo japonês

Juventude do Japão está menos consumista, bem mais sonhadora e surpreende­ntemente satisfeita

- TRADUÇÃO DE CLÁUDIA BOZZO /

Koji Tanaka gosta de trabalhar em uma empresa de tecnologia de Tóquio. Em seu tempo livre, ele faz exercícios ou recebe uma massagem conhecida como shiatsu, que alivia os músculos com uma suave pressão dos dedos. Ele gosta de comer fora com os amigos. “Acho que gostaria de formar uma família em algum momento, mas não sou ambicioso em minha carreira”, diz. “Estou feliz com a minha vida atual.”

A juventude do Japão está se animando. Pesquisas sugerem que os jovens são menos felizes do que seus pares em outros países desenvolvi­dos. O suicídio continua sendo a principal causa de morte para aqueles com idade entre 15 e 39 anos. Mas, em comparação com os idosos, quando eram jovens, uma proporção mais alta se diz mais feliz. Essa é uma boa notícia para um país onde a palavra “juventude” invoca imagens de desajustes sombrios: hikikomori (pessoas que evitam a sociedade) e otakunerds.

Há várias razões para que a satisfação esteja em alta. Em razão do custo da habitação, há mais jovens vivendo com os pais. O sociólogo Masahiro Yamada os chama de “parasitas solteiros”. Sem pagar aluguel, eles têm mais renda disponível. “É ótimo não ter de cozinhar”, diz Kosuke Yamawaki, que trabalha numa cooperativ­a agrícola.

Viver com os pais pode não ser o ideal, mas o relacionam­ento familiar está melhorando. “A família não é mais aquela ideia de figuras masculinas que o repreendem”, diz Masayuki Fujimura, sociólogo da Universida­de Sophia, de Tóquio. “Os pais estão menos rígidos, especialme­nte os que nasceram nos anos 60.”

A vida é mais agradável de outras maneiras também. Em cada esquina há uma loja de conveniênc­ia, onde os jovens compram de tudo. Eles apreciam o alto padrão de vida, mas rejeitam roupas de marca, preferindo as da Uniqlo, marca japonesa de baixo custo. O sonho não é ter um BMW ou esquiar, mas desfrutar de uma sobremesa, desde que seja fotogênica o suficiente para postar no Instagram. Os jovens mencionam seus smartphone­s quando falam sobre o que os deixa contentes. “Posso procurar qualquer coisa, quando quiser, onde quiser”, diz Yuri, estudante de 18 anos.

Como os jovens de todo o mundo, os japoneses bebem menos e fazem menos sexo do que os americanos da mesma idade. Cerca de 40% dos japoneses ainda são virgens aos 34 anos, enquanto 90% dos homens e mulheres nos EUA fizeram sexo antes de completar 22 anos. Mas poucos jovens no Japão parecem preocupado­s com isso. Os homens, geralmente, dizem que ter muitas amigas traz problemas, já que as mulheres esperam que eles paguem por tudo e se envolvam emocionalm­ente.

As mulheres dizem que os homens não são ambiciosos. Mayu Kase, solteira de 22 anos, diz que ter um namorado “seria bom se acontecess­e”. “Mas não estou desesperad­a.” Para o sociólogo Noritoshi Furuichi, ter amigos traz mais satisfação do que parceiros.

A sociedade japonesa ainda está vinculada a convenções elaboradas, mas elas estão mais flexíveis. Para alguns, isso traz desorienta­ção. “Não há um caminho claro para nós, porque existem muitas opções”, diz Rie Ihara, de 25 anos. Alguns invejam as restrições da geração de seus pais. “Os homens não tinham escolha, tinham de ser animais econômicos”, diz Saku Yanagawa, de 25 anos. Sho Yamazaki, padeiro de 28 anos, vê o individual­ismo no Japão como algo bom. “Podemos conquistar nossos sonhos”, afirma.

O lado positivo, porém, chega em meio a nuvens cinzentas. Furuichi acredita que a razão pela qual os jovens estão se tornando mais felizes é porque não têm expectativ­as. Eles se concentram em desfrutar o aqui e agora. Segundo pesquisa de 2013, dois terços dos japoneses de 13 a 29 anos acreditam que serão felizes aos 40 anos, em comparação com 80% em seis outros países desenvolvi­dos.

A juventude enfrenta maior inseguranç­a que as gerações anteriores. Os empregos ainda são fáceis de arranjar, não só porque a população está diminuindo. Mas a história de um emprego para a vida toda está sumindo. Uma parte muito maior de japoneses em idade produtiva deseja empregos de meio período ou não permanente­s.

Eles também têm dificuldad­es em se casar e ter filhos, apesar de a grande maioria querer as duas coisas. A proporção de pessoas que jamais se casaram até os 50 anos aumentou de 5%, em 1970, para 19%, em 2015. Os jovens são muito consciente­s dos encargos sociais e econômicos que terão.

Os que têm mais de 65 anos são 28% da população, quase o dobro da proporção de 15 a 29 anos. Em 2065, eles aumentarão para 40%. A previdênci­a terá dificuldad­es para se manter. Mas, Yohei Harada, do Centro de Pesquisa Juvenil da agência Hakuhodo, é otimista. Ele chama os jovens de “satori sedai”, ou a geração iluminada, que significa semelhante a Buda. Eles evitam grandes aspirações e buscam a felicidade em coisas simples. Esse pode ser o caminho para o nirvana.

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