O Estado de S. Paulo

Corte valorizado

Restaurant­es apostam em pratos com cupim.

- Ana Paula Boni

Cupim, sobrenome churrasco. Essa associação perdurou por muito tempo, mas chefs andam tirando esse corte da monotonia do espeto de rodízio para empratá-lo com diferentes versões de preparo e apresentaç­ão. Pode ser cozido na panela, tostado no forno, amolecido horas e horas a vácuo, servido desfiado, em lâminas, em cubos.

Não que ninguém nunca o tivesse tratado com olhar contemporâ­neo na cidade – no Ema e no Jiquitaia, os pratos com cupim são servidos há pelo menos três anos; no Sal, há uma década. Nos idos de 2012, a chef Bel Coelho já servia um pintxo (tapa) de cupim com geleia de mel no extinto Dui.

Mas nos últimos meses rolou uma enxurrada por aqui: Paribar, Balaio, Quitand’arte, Riviera, Hospedaria, Petí, Firin Salonu, até Sympa e Oui, restaurant­es franceses, de culinária nada acostumada a lidar com esse corte. Localizado na corcunda de bois do tipo zebuíno, asiático (leia abaixo), o cupim é rico em gordura e colágeno, bem marmoreado. A longa e lenta exposição ao calor é o modo ideal de cocção, dizem os chefs, para derreter essa gordura e amolecer as fibras.

No Sympa, o chef Thiago Cerqueira Lima passou a servir nas últimas semanas o cupim braseado por 18 horas (com nhoque de mandioca e emulsão de agrião). Como faria com o clássico boeuf bourguigno­n, sela a peça na panela na boca do fogão, depois põe os vegetais (cebola, salsão, cenoura), temperos, tomate, vinho tinto. Só então a carne vai coberta para o forno, a 120º graus por 18 horas.

No Jiquitaia, Marcelo Correa Bastos também usa a dupla boca de fogão + forno para o cupim que está no menu-executivo às segundas, com purê de mandioca e farofa de agrião. Também volta e meia oferece o corte no Vista, com arroz caldoso feito das aparas do assado da véspera. “A particular­idade da carne é a gordura, é o que dá a sua qualidade. Mas a gordura tem de cozinhar bem para ficar gostosa.”

No Paribar, onde há dois pratos com cupim desde o fim do ano, Luiz Campiglia cozinha a carne em fogo baixo por 14 horas com especiaria­s, como pimenta-da-jamaica, para servir desfiada em um arroz caldoso. O cupim vai também no espeto do churrasco grego ao lado de fraldinha e contrafilé, para o sanduíche que ele serve na porta do restaurant­e, do almoço ao jantar. “Ele tem um marmoreio incrível, ajuda a temperar as outras carnes do espeto.”

Além da gordura particular, o sabor é outro diferencia­l, devido à localizaçã­o do corte, na corcunda do boi. “A circulação intensa de sangue no músculo do pescoço dá o seu sabor”, conta o chef Fred Caffarena, do Firin Salonu. Ali, vira e mexe ele põe no cardápio o cupim braseado com aceto balsâmico, vinagre de maçã e melaço de romã.

Em época de poucos recursos no caixa, o cupim se sobressai. “É um corte barato, dá margem boa nas contas”, diz Thiago. No Sympa, depois que tira a carne do forno, o chef a prensa como se fosse um bloco e deixa de um dia para o outro na geladeira. “Aproveito 100%. Quando corto, parece um wagyu, bem marmorizad­o.” No Oui, Caio Ottoboni também gela por uma noite a peça cozida. Há uma semana, ele lançou um sanduíche de fatias de cupim marinado em saquê-mirim, shoyu e alho. (O formato sanduíche também é sucesso no Pipo, no Rio, e no Petí Panamerica­na, onde recentemen­te um taco de cupim desfiado com guacamole esteve no brunch, com chance de voltar.)

Para a peça não desmanchar, Fellipe Zanuto, do Hospedaria, cozinha no vácuo. “Cupim é um prato comum a todos da equipe, todas as famílias faziam, a maioria na panela de pressão.”

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Oliveira primeiro marina a peça do cupim para depois assá-la no forno por uma noite; é servido em cubinhos com molho de cerveja preta, cuscuz e vinagrete de fava
No Balaio. Ali, o chef Rodrigo Oliveira primeiro marina a peça do cupim para depois assá-la no forno por uma noite; é servido em cubinhos com molho de cerveja preta, cuscuz e vinagrete de fava

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