O Estado de S. Paulo

BC deixa claro que é contra o ‘mandato duplo’

Em nota, instituiçã­o contraria o que quer a ala política do governo e afirma que o foco em apenas um objetivo ‘tem servido bem ao País’

- Fabrício de Castro/ BRASÍLIA ARAÚJO CARLA

O Banco Central fez ontem uma clara defesa do mandato simples, de controle da inflação. A instituiçã­o afirmou ao ‘Estadão/Broadcast’, por meio da assessoria de imprensa, que o foco em apenas um objetivo “tem servido bem ao País” e que “a lei de autonomia do BC deve consagrar o que existe hoje de fato”. A proposta, defendida pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (MDB-RR), coloca um duplo mandato, com meta também de cresciment­o (ou geração de empregos).

Desde que assumiu o Banco Central, em meados de 2016,o presidente do BC, Ilan Goldfajn vem defendendo, quando questionad­o sobre o assunto, o mandato único para o BC. Para ele, ao controlar a inflação por meio da Selic (a taxa básica de juros), o BC contribui para a sustentabi­lidade do cresciment­o no longo prazo.

Além disso, segundo apurou a reportagem, dentro do BC existe a avaliação de que com apenas uma ferramenta – a Selic – não se deve estabelece­r duas metas conflitant­es no curto prazo: inflação e cresciment­o.

Ontem, Goldfajn voltou a demonstrar oposição ao duplo mandato, embora esteja discutindo, como é de se esperar, os vários aspectos da proposta de autonomia com o governo e o Congresso. Pela manhã, ele esteve no Palácio do Planalto em reunião com o presidente Michel Temer e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Na reunião, eles trataram das 15 medidas anunciadas como prioritári­as, com destaque justamente para a autonomia do BC.

Conversas como essa também fazem parte da estratégia do BC de convencime­nto sobre os riscos de algumas sugestões, como a do mandato duplo. Expresiden­tes e ex-diretores do BC já haviam alertado que o duplo mandato representa­rá um retrocesso.

Isso porque, ao mirar na geração de empregos, o Banco Central pode ter problemas no controle da inflação. Economista­s de fora do BC lembram que há ampla literatura econômica que corrobora isso.

Simples. “O BC opera sob o regime de metas de inflação desde 1999 (à semelhança de muitos países no mundo), com foco no objetivo de inflação, o que tem servido bem ao País”, afirmou a instituiçã­o, em nota. “A lei de autonomia do BC deve consagrar o que já existe hoje de fato”.

A pressão para o estabeleci­mento de mandato duplo vem de Jucá e da “ala política” do governo – não da “ala econômica”. Um eventual anúncio de que o BC vai buscar também o cresciment­o poderia passar uma mensagem positiva para a população, ainda mais em ano eleitoral.

A circulação da proposta de mandato duplo no Congresso, aliás, não é novidade. Um dos defensores dessa ideia é o senador Lindbergh Faria (PT-RJ). Em 2011, o senador fazia pressão para que um projeto seu neste sentido fosse aprovado. Foi preciso que o então presidente do BC, Alexandre Tombini, conversass­e diretament­e com Lindbergh sobre a inconveniê­ncia da proposta.

Na época, a Presidênci­a da República era ocupada por Dilma Rousseff, filiada ao mesmo partido de Lindbergh. Sua proposta acabou não indo para frente. O assunto esfriou, mas agora está de volta./COLABOROU

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ANDRE DUSEK/ESTADAO-8/3/2017 Encontros. Presidente do BC, Ilan Goldfajn, que teve encontro ontem com Temer e Meirelles

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