Suprema Corte julga disputa entre governo e Microsoft.
Órgão vai definir se pedido de governo por dados de usuários da empresa armazenados no exterior é ilegal; caso pode influenciar discussões no Brasil
A Suprema Corte dos Estados Unidos vai começar a julgar hoje um caso que pode influenciar as discussões sobre privacidade na internet e armazenamento de dados pessoais de usuários em servidores fora de seus países no mundo todo. É uma disputa entre o Departamento de Justiça americano (DoJ) e a Microsoft, gerada depois que o governo do país pediu acesso a dados de emails de usuários da empresa.
Em resposta, a Microsoft negou o acesso, alegando que os dados estavam armazenados na Irlanda e que um mandado de justiça local não teria abrangência internacional. O DoJ retrucou, alegando que, como a Microsoft é uma empresa americana, o mandado seria válido.
O caso, que começou em 2013, atraiu a atenção de outras empresas de tecnologia, como Google, IBM, Apple e Amazon, e de ativistas de privacidade, uma vez que a decisão da Suprema Corte americana pode gerar precedentes para outras discussões de mesmo calibre no cenário de uma internet global.
Precedente. Governos estrangeiros, como Irlanda e Grã-Bretanha, entregaram à Suprema Corte documentos levantando preocupações com a posição do governo norte-americano; o mesmo foi feito pelo centro de pesquisa em direito e tecnologia brasileiro InternetLab.
“Uma decisão favorável ao governo americano pode fazer com que a lei passe por cima da soberania de outros países”, disse Dennys Antonialli, diretor do InternetLab e professor de direito da Universidade de São Paulo, em entrevista ao Estado.
“É preciso que o conflito de leis seja resolvido de forma adequada, como via acordos de cooperação internacional.” Além disso, segundo o professor, a vitória do DoJ poderia influenciar na disseminação de leis semelhantes em outros países, como o Brasil. Recentemente, autoridades de investigação do País têm enfrentado na Justiça diversas empresas de tecnologia, como Google e WhatsApp, por pedidos similares.
Em instâncias inferiores, a Microsoft venceu em 2016, mas viu o governo Trump recorrer da decisão no ano passado. A decisão final da Suprema Corte deve vir em junho. Para Brad Smith, presidente da Microsoft, uma vitória dos EUA pode gerar um precedente perigoso. “É uma receita para o caos internacional”, disse ele, considerando que um ato unilateral de pedido de dados do governo americano pode gerar acesso a informações pessoais de cidadãos de outros países.
Já o advogado do governo na Suprema Corte, Noel Francisco, disse que uma decisão favorável à Microsoft pode “causar danos aos esforços contra terroristas no país.” Caso a Microsoft vença, o governo dos EUA pode ainda ter acesso aos dados, mas terá um caminho tortuoso pela frente, via acordos de cooperação jurídica internacionais – para isso, seria preciso entrar na Justiça irlandesa pedindo a liberação dos dados.