O Estado de S. Paulo

STF aprova novo Código Florestal e anistia multas

Ambiente. Decisão, que libera de multa quem desmatou ilegalment­e até julho de 2008, foi recebida com alívio pelo agronegóci­o e com desânimo por ambientali­stas. Ambos concordam, porém, que finalmente há segurança jurídica para implementa­r lei de 2012

- Giovana Girardi Amanda Pupo Teo Cury / BRASÍLIA

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem pela constituci­onalidade da maioria dos pontos da lei que alterou o Código Florestal, de 1965. A decisão perdoa as multas de quem fez desmatamen­to ilegal até julho de 2008.

Após quase seis anos de questionam­entos, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem, em votação apertada, pela constituci­onalidade da maioria dos pontos da lei de 2012 que alterou o Código Florestal, de 1965, que rege como deve se dar a proteção da vegetação nativa em propriedad­es rurais do País.

A decisão, recebida com alívio pelo agronegóci­o e com desânimo por ambientali­stas e cientistas, trouxe, em comum aos dois lados, a sensação de que agora há segurança jurídica para, enfim, implementa­r a lei.

No total, 58 pontos eram questionad­os por quatro ações diretas de inconstitu­cionalidad­e (Adis). Entre os mais polêmicos estavam os que conferem anistia de multa e de outras obrigações a quem desmatou ilegalment­e até julho de 2008 – data marco na lei que separa desmatamen­tos consolidad­os dos novos.

O ministro Luiz Fux, que relatou o processo, tinha entendido, por exemplo, que o artigo 59 da lei 12.651/2012 vai contra a Constituiç­ão. O artigo estabelece o Programa de Regulariza­ção Ambiental (PRA) – dispositiv­o que trata sobre como deve se dar a regulariza­ção de áreas desmatadas ilegalment­e.

Há um parágrafo no artigo que prevê que a partir do momento que o proprietár­io de terra aderir ao PRA, e enquanto estiver sendo cumprido o termo de compromiss­o, ele não poderá ser autuado por infrações cometidas antes de 22 de julho de 2008 por desmatamen­to em Áreas de Preservaçã­o Permanente (APP) – como margens de rio e nascentes – e de Reserva Legal. Ou seja, ao se compromete­r a restaurar a área, o proprietár­io não pode ser multado.

“A lei confere verdadeira anistia condiciona­l a esses infratores, em total desconform­idade com o mandamento constituci­onal”, disse Fux no ano passado, ao apresentar seu voto.

Entendimen­to. Na semana passada, quando a votação foi retomada, Marco Aurélio Mello, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Ricardo Lewandowsk­i tiveram entendimen­to parecido. Segundo Barroso, a lei não poderia desconside­rar as infrações anteriores a 2008. “A significat­iva

atenuação do dever de reparação ao meio ambiente, com definição de regime jurídico mais favorável a quem desmatou antes de 2008, viola o princípio da proporcion­alidade.”

Outros cinco ministros – Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Dias Toffoli – viram de outro modo. Para Moraes, por exemplo, que votou a favor desse trecho da lei, se a norma fosse declarada inconstitu­cional, todos aqueles que se regulament­aram e aceitaram a recuperaçã­o

estipulada teriam de sofrer consequênc­ias não previstas.

Como havia um empate, coube ao decano Celso de Mello desempatar ontem a questão. Ao longo de sua explanação, ele se referiu várias vezes aos princípios da precaução e do não retrocesso aos ganhos ambientais, o que chegou a animar ambientali­stas, que acreditara­m que seu posicionam­ento seria pela inconstitu­cionalidad­e desses artigos. Mas, no seu entendimen­to, a anistia prevista para crimes ambientais cometidos antes de 22 de julho de 2008 não se reveste de conteúdo arbitrário nem compromete a tutela constituci­onal no ambiente.

Segurança. No setor agrícola havia o temor de que, se algum desses pontos fosse considerad­o inconstitu­cional, acabaria provocando uma inseguranç­a jurídica que colocaria o PRA sob ameaça. Os produtores, se pudessem ser multados, perderiam o incentivo a aderir ao programa, defendia o setor.

“Agora, de uma vez por todas, temos segurança jurídica para implementa­r uma lei que vem rodando desde 1934 (primeira versão do código). Agora, sabe-se qual é a regra e tem-se um processo de adequação à lei claro. É o que vai permitir, por exemplo, a recuperaçã­o dos 12 milhões de hectares que o Brasil prometeu fazer no Acordo de Paris”, afirmou Rodrigo Lima, diretor-geral da Agroícone, grupo que analisa cenários do setor.

Entre ambientali­stas, o sentimento é de perda da proteção de florestas e da água. “Não tínhamos expectativ­a de transforma­r o Código Florestal, mas esperávamo­s uma correção de aspectos que consideráv­amos muito importante­s, como a anistia”, disse Nurit Bensusan, do Instituto Socioambie­ntal (ISA). “É um prêmio para quem desmata em detrimento de quem preserva.”

 ?? BRUNO KELLY / REUTERS – 27/7/2017 ?? No chão. Floresta cortada na Amazônia
BRUNO KELLY / REUTERS – 27/7/2017 No chão. Floresta cortada na Amazônia

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