O Estado de S. Paulo

LAMA, BURACO, FILA E CANSAÇO NA ESTRADA DA SOJA

Caminhonei­ros enfrentam gargalo logístico para levar milhões de toneladas de grãos para exportação pelo Norte

- Gustavo Porto / TEXTOS Daniel Teixeira / FOTOS ENVIADOS ESPECIAIS

São 7h30. No acostament­o da BR-163, em Novo Progresso (PA), o tema de um grupo de caminhonei­ros nem é mais sobre a situação da rodovia. Eles tentam mudar de assunto. Todos carregam soja e quase se conformam em perder pelo menos um dia parados. Passam horas em uma fila que, recentemen­te, chegou a 20 quilômetro­s. São vítimas do gargalo logístico que anualmente ocorre na principal rota de escoamento de grãos no norte do País.

No início do comboio, soldados do Exército controlam o fluxo e liberam entre 100 e 250 caminhões por vez. Não há uma frequência para que caminhões com soja sigam viagem. Carros, ônibus, caminhões com animais vivos e outros alimentos passam direto. “É uma vergonha. Um dia parado para passar esse trecho. Muita gente passa mal”, diz Aparecido Nunes.

Caminhonei­ro há quase 40 anos, Nunes deixou Três Lagoas (MS) dia 5 de janeiro para “puxar” soja pela BR163 no trecho crítico da rodovia, entre Sinop (MT) e o terminal de transbordo de grãos de Miritituba (PA). Nessa viagem, ele tem a companhia de dois filhos. Por causa dos desafios do percurso, o custo do frete é o dobro em relação a trajetos semelhante­s em outras regiões.

Na semana passada a reportagem do Estadão/Broadcast percorreu a BR163, ida e volta de Sinop (MT) até Itaituba (PA), num total de 2 mil km. Um trajeto de contrastes. Trechos de asfalto bem conservado logo são substituíd­os por outros de terra. As filas e os gargalos mudam de lugar na rodovia de acordo com um planejamen­to informal feito diariament­e pelo Exército e tradings exportador­as para controlar o fluxo de descarrega­mento dos grãos em seus terminais.

Liberados do bloqueio em Novo Progresso, os caminhões percorrem mais 65 km até a serra de Moraes Almeida. No trecho de terra, outra parada, onde o Exército realiza obras de rebaixamen­to do morro, controla o fluxo de veículos e reboca os que não conseguem ultrapassa­r a terra, as pedras

e, quando chove, o barro. Na quarta-feira, a fila de dois dias antes se deslocou de Novo Progresso para lá. Havia 15 km de caminhões parados nos dois sentidos da BR-163.

Fila. Poderia ser pior. No ano passado, próximo a Bela Vista do Caracol (PA), um atoleiro parou a BR-163, nas proximidad­es de Bela Vista. O congestion­amento superou 100 km e veículos ficaram até 20 dias parados.

Cerca de 650 caminhões, a maioria com 40 toneladas de soja, trafegam diariament­e pela BR-163 na rota entre Mato Grosso e o terminal de Miritituba. Como uma viagem demora, em média, cinco dias, a estimativa é de que mais de 3 mil veículos rodem pela rodovia o ano inteiro. Em junho, a carga de soja é trocada pela de milho.

Enquanto caminhonei­ros sofrem, outros lucram com esses buracos. Borracheir­o no povoado de Santa Júlia, João Melo e seu funcionári­o Zineu da Rocha estão sempre ocupados com serviços de reparos em pneus e rodas de caminhões. Na borrachari­a, uma placa de isopor está cravada com parafusos perdidos por caminhões, colhidos por pneus de outros veículos e retirados por Melo e Rocha.

Os gargalos logísticos da BR-163 levaram a soja e a infraestru­tura de armazename­nto cada vez mais para perto de Miritituba. A Tapajós Agro iniciou a operação, este ano, de um primeiro silo de armazenage­m do grão, às margens da rodovia, em uma fazenda no município de Trairão (PA), a apenas 150 km do terminal. Em 2019, a agropecuár­ia deve cultivar mil hectares com soja. “Estamos muito perto de Miritituba e a soja vai ser a prioridade”, diz Rodrigo Dotto, gerente de Operações da Tapajós.

No terminal paraense estão cinco operações de transbordo, onde os grãos são colocados em barcaças para uma viagem de mais mil quilômetro­s até o Porto de Barcarena, de onde é feita a exportação.

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Tráfego pesado. Cerca de 640 caminhões, a maioria com 40 toneladas de soja, passam pela BR-163 todos os dias na rota entre Mato Grosso e o terminal de Miritituba
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INFOGRÁFIC­O/ESTADÃO

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