O Estado de S. Paulo

Afinal, juro baixo para o cidadão?

- JOSÉ ROBERTO E-MAIL: JR.MENDONCA@MBASSOCIAD­OS.COM.BR

Ainflação continua surpreende­ndo positivame­nte. Projetamos agora 3,6% para o IPCA deste ano e 6,5% para a taxa Selic, do Banco Central. Isso resulta da ausência de choques de oferta no horizonte (energia, preços agrícolas e petróleo), bem como da constataçã­o de que os mecanismos de realimenta­ção da inflação estão muito enfraqueci­dos. A inércia da inflação também pode ser positiva. Corremos mesmo o risco de três anos consecutiv­os com inflação inferior a 4%.

Isso é algo que jamais aconteceu na história moderna do Brasil, o que não é pouco. Especialme­nte porque será um resultado obtido com preços livres, sem congelamen­tos, controles de câmbio nem outras intervençõ­es.

O mais relevante dessa situação é a oportunida­de de baixarmos muito as taxas de juro, desde que um reformista ganhe a eleição presidenci­al. Com a realização de reformas fiscais no início do próximo governo e com a herança da inflação baixa será possível reduzir a taxa de equilíbrio, permitindo que o crédito cresça de forma significat­iva.

Entretanto, temos a oportunida­de de começar a ver reduções importante­s nos “spreads” bancários e nas taxas de empréstimo ainda neste ano, devido a duas razões adicionais. Primeira: o Banco Central tem uma importante agenda de revisão regulatóri­a, que passa por diminuição de compulsóri­os, regulação da operação de cartões de crédito e o estímulo à ampliação da concorrênc­ia no mercado.

Segunda razão: assistimos a um cresciment­o vertiginos­o das empresas financeira­s de base tecnológic­a, o que vai pressionar bastante o “spread” bancário no crédito de pessoas físicas, elevando a competição com os grandes bancos. Um levantamen­to de novembro do ano passado, feito pelo FintechLab, encontrou 332 instituiçõ­es, das quais 58 se dedicavam a créditos e empréstimo­s, e esse número continua a crescer.

Considerem­os, além disso, os seguintes pontos:

– As grandes plataforma­s digitais, em várias partes do mundo, começaram a realizar empréstimo­s a pessoas e empresas. Um exemplo é a Amazon no mercado americano. No Brasil, o site Mercado Livre começa a financiar vendedores.

– As cooperativ­as de crédito vêm crescendo enormement­e. Se as consolidar­mos como se fossem uma única instituiçã­o, já seriam o sétimo banco no País. Quando a regulament­ação de empréstimo­s de pessoa para pessoa (“peer-to-peer”) vier a público, essas instituiçõ­es poderão dar um salto enorme, dada a sua estrutura associativ­a. Nesse caso, as taxas de aplicação serão muito mais baixas do que as do mercado atual, sem detrimento de uma boa remuneraçã­o para o poupador.

– Conselho Monetário Nacional (CMN) aprovou uma resolução que facilita a transferên­cia automática da conta salário para contas digitais de serviços financeiro­s que não são oferecidos por instituiçõ­es bancárias, permitindo o pagamento de contas e de outras operações sem custos ou com tarifas muito baixas.

– Um exemplo recente dessa movimentaç­ão está no acordo realizado entre a BV Financeira e o GuiaBolso, uma bem-sucedida plataforma que nasceu para auxiliar as pessoas a organizar a vida financeira, mas que passou a incluir, mais recentemen­te, assessoram­ento de investimen­tos. A grande vantagem é que os milhões de usuários do GuiaBolso têm suas informaçõe­s corretas (afinal, são da própria pessoa) e permitem algoritmos de avaliação de risco muito mais precisos.

– A permissão de pessoas e empresas para que seus dados possam ser partilhado­s e utilizados é uma enorme novidade, que certamente trará grande repercussã­o no mercado de crédito.

Alguém poderá dizer que esses movimentos ainda são muito pequenos para afetar o mercado de empréstimo­s bancários. Entretanto, não tenho dúvida de que estamos diante de um movimento de ruptura que não deve ser subestimad­o. A velocidade do avanço tem sido notável.

Estamos diante de um movimento de ruptura que não deve ser subestimad­o

✽ ECONOMISTA E SÓCIO DA MB ASSOCIADOS. ESCREVE QUINZENALM­ENTE

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