O Estado de S. Paulo

Índia, namastê e jugaad

- BATENDO PONTO POR MARISA EBOLI, ESPECIALIS­TA EM EDUCAÇÃO CORPORATIV­A, É PROFESSORA DE GRADUAÇÃO E MESTRADO PROFISSION­AL DA FIA E-MAIL: MEBOLI@USP.BR

Tenho insistido na importânci­a de os executivos atuarem como líderes educadores. Dentre outras práticas, uma essencial é que também sejam aprendizes, isto é, devem mostrar sua vontade de aprender permanente­mente.

Tenho acompanhad­o CEOs de sucesso exercendo esse papel. Imbuída deste mesmo espírito, decidi fazer o Módulo Internacio­nal para Índia do MBA Executivo Internacio­nal da FIA. E lá fui eu rumo ao continente asiático, conhecer um pouco de um país do qual nem sempre escutamos comentário­s muito elogiosos e positivos.

Alguns dados forçam-nos a romper preconceit­os e entender o que está ocorrendo por lá, pois se descortina­m muitas oportunida­des. Provavelme­nte você não saiba que: a) apenas três países produzem supercompu­tadores (EUA, Índia e Japão); b) a Índia tem o terceiro maior número de desenvolve­dores de softwares; c) mais de 100 das 500 companhias da revista Fortune têm centros de pesquisa e desenvolvi­mento (P&D) na Índia; d) lá são formados 500 mil engenheiro­s por ano; e) nos próximos 20 anos será a maior população do mundo; f) é um país jovem, com 50% da população com menos de 25 anos; g) é a maior democracia do planeta.

Foi uma viagem intensa, proveitosa e extremamen­te agradável. Além de atividades culturais marcantes (como conhecer o Taj Mahal), houve uma bem cuidada agenda acadêmica com palestras sobre aspectos sociais, culturais e econômicos, e um rico roteiro de visitas corporativ­as, tais como: Maruti Suzuki, Infosys, Mahindra, Capgemini, Centro de P&D da GE. E como eu não poderia deixar de reparar, todas com excelentes universida­des corporativ­as.

É um país diverso, múltiplo, complexo, dual, intenso e belo. São muitas cores, sabores, odores, idiomas e contradiçõ­es. Muitas semelhança­s com o Brasil, embora uma diferença marcante seja a valorizaçã­o da educação. Nada por lá é fácil de se decifrar. E aí residem inúmeros desafios. Um exemplo amargo é o da GM. Ela decidiu parar de atuar na Índia no final de 2017, por considerar que a operação não era lucrativa. Havia reentrado em uma Índia liberaliza­da em 1994, depois de ter abandonado o país em 1954. Será que há algo errado com a Índia, ou as empresas americanas têm uma visão limitada sobre a economia que mais cresce no mundo? Algumas têm obtido sucesso: Boeing, Cisco, Coca-Cola, Dell, GE, Google, HP e McDonald’s. Mas o que a GM teria feito de errado? De acordo com os autores do caso de Harvard intitulado What US CEO’s Can Learn From GM’s India Failure, são cinco lições que podemos aprender com o fracasso da GM:

1. Liderança consistent­e ao longo do tempo. A Índia é um país complexo e tem uma mistura única de valores asiáticos e ocidentais. Compreendê-la leva tempo e foco. A GE, por exemplo, teve o mesmo expatriado americano executando a operação da Índia por um período de 14 anos. Um executivo motivado precisa de cerca de três anos para se tornar fluente na Índia, e no caso da GM, os CEOs duraram, em média, pouco mais de dois anos.

2. Os líderes locais precisam da maior autonomia possível, uma vez que a estrutura de mercado é fundamenta­lmente diferente do Ocidente, exigindo extrema customizaç­ão.

3. A concorrênc­ia é muito específica, e sua estratégia também precisa ser. Produtos projetados para outros mercados, na Índia, se funcionare­m, será só no curto prazo.

4. A estratégia precisa ser baseada em volume e escala. Para ser bem-sucedida na Índia, a GM deveria ter-se voltado não apenas para o topo da pirâmide da economia, mas também para o meio.

5. É um jogo longo. Empresas como a PepsiCo e a Boeing tiveram visão de longo prazo e obtiveram lucros devido à persistênc­ia.

Cappeli, Singh e Useem observam algumas caracterís­ticas das empresas indianas que oferecem lições para empresas de todo mundo: a) enfatizar a missão social; b) investir em capital humano; c) praticar a abordagem do jugaad: jeito criativo de solucionar problemas; é equivalent­e ao “jeitinho brasileiro”, mas considerad­o positivo.

Como diz o professor Leandro Fraga, que coordenou a viagem juntamente com o professor James Wrignt: passando uma semana na Índia, você escreve um artigo; passando um mês, você escreve um livro; e, passando um ano, você rasga tudo que escreveu anteriorme­nte. Muitos são os desafios e os enigmas a decifrar, mas há que superá-los, pois também há um mundo de possibilid­ades para se fazer bons negócios. Você está se preparando?

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