O Estado de S. Paulo

Salve-se quem puder

- Rubens Barbosa PRESIDENTE DO INSTITUTO DE RELAÇÕES INTERNACIO­NAIS E COMÉRCIO EXTERIOR

As medidas protecioni­stas em relação ao aço e ao alumínio, anunciadas pelo presidente Trump, foram tomadas pensando na política interna e na reeleição. Nos estudos elaborados para justificar a decisão e ao longo de todo o processo decisório, prevaleceu a narrativa política de colocar os EUA em primeiro lugar, de proteger o emprego e as indústrias ultrapassa­das, com a desculpa de ameaças à segurança nacional. Consideraç­ões de política exterior ou de preocupaçã­o com a crise no sistema multilater­al de comércio, com o enfraqueci­mento ainda maior da OMC, e a perspectiv­a de uma possível guerra comercial não foram levadas em conta. México e Canadá ficarão de fora, se as negociaçõe­s de mudanças no Nafta satisfizer­em os EUA. Com outros países negociaçõe­s serão caso a caso.

As reações foram muito fortes dentro e fora dos EUA. No Partido Republican­o, centenas de parlamenta­res preparam legislação para anular a decisão de Trump, não só por questões ideológica­s (o partido é a favor do livre-comércio), mas também porque há pressão dos consumidor­es e das empresas que processam o aço e o alumínio importado. No exterior, os pronunciam­entos públicos das principais lideranças europeias e asiáticas indicam a decisão de recorrer ao mecanismo de solução de controvérs­ias da OMC ou de retaliação contra produtos norte-americanos. Se essas medidas protecioni­stas forem levadas à OMC, os EUA deverão ser derrotados e, nesse caso, existe o risco concreto de os EUA saírem da Organizaçã­o, verdadeira bomba atômica no sistema multilater­al de comércio. Todos sairão perdendo.

O Brasil, um dos países mais afetados pelas medidas, sofrerá uma dupla ameaça: perder por alguns anos o mercado americano, o principal destino das exportaçõe­s de aço, e se transforma­r em atrativo mercado para produtos europeus e asiáticos desviados dos EUA. Em ambos os casos, haverá forte pressão sobre as siderúrgic­as nacionais. O governo brasileiro reagiu informando que levará a questão para a OMC e continuará a buscar exclusão de produtos brasileiro­s utilizados como insumos pelas empresas dos EUA.

Seria lamentável se esse episódio fizesse recrudesce­r o protecioni­smo global, inclusive no Brasil, para a defesa dos mercados internos.

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