Denúncias de desvio na Alesp travam no MP
De 12 inquéritos sobre servidores ‘fantasmas’, 6 foram arquivados; perícia demora até 2 anos
O Ministério Público Estadual investigou nos últimos seis anos pelo menos 12 casos envolvendo funcionários fantasmas e desvios de salários na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). Desse total, seis foram arquivados sob a alegação de falta de provas, e nenhuma ação civil foi oferecida até agora, segundo levantamento do Estado.
A maioria dos inquéritos ainda em aberto caminha a passos lentos. É o caso de investigação que apura desvio de salários em benefício supostamente dos deputados Edmir Chedid (DEM) e Aldo Demarchi (DEM). O promotor Otávio Ferreira Garcia pediu ao Caex, órgão de perícia do próprio MP, que elaborasse um parecer sobre o patrimônio de dois servidores em março de 2016. Mesmo com urgência reconhecida, o órgão ainda não entregou o documento. Em relatório, o promotor relata que a perícia só poderia chegar “por um milagre” e que existe “prejuízo manifesto” à investigação.
Apontados como operadores pelas investigações, os dois servidores tiveram seus sigilos bancários quebrados. Relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) apontou que, em apenas um dia, um deles movimentou R$ 500 mil em espécie no caixa bancário instalado na Assembleia. Já o outro servidor fez duas operações, totalizando R$ 225 mil também em espécie.
À falta de conclusão de perícias feitas pelo próprio Ministério Público, se somam outras razões para não se chegar aos responsáveis por eventuais desvios. Nos inquéritos arquivados, o MP também não pediu a cooperação policial, que poderia ajudar na investigação de campo. A legislação em vigor permite ainda que o servidor comissionado fique em “gabinetes estendidos”, que podem ficar em qualquer município de São Paulo.
Por fim, é a própria Assembleia – isto é, os eventuais acusados – que acabam embasando com testemunhos, livros de ponto e pareceres internos da Casa o arquivamento dos inquéritos.
Para promotores ouvidos pela reportagem, o regimento interno do Legislativo pode ser legal, “mas é absolutamente imoral”.
Depoimento. Chedid e a deputada Clélia Gomes (Avante) também são alvo de inquérito por empregar funcionários fantasmas em seus gabinetes. Após publicação de reportagem do Estado na segunda-feira passada, sobre a existência de inquérito, a deputada chegou a exonerar dois de seus funcionários.
Esses dois casos são até agora exceções à regra geral, em função da quantidade de depoimentos
reunidos pelo Ministério Público. A investigação envolvendo Chedid já conta com três testemunhas, que foram ouvidas no início de fevereiro pelo promotor Silvio Antonio Marques. O deputado é acusado pelas testemunhas de manter pelo menos quatro pessoas que não trabalham para seu mandato nomeadas na Assembleia.
Uma das testemunhas que se apresentaram ao MP é primo em primeiro grau de Chedid. Alexandre Reginato Acedo prestou depoimento sobre uma ex-servidora nomeada
para o gabinete do deputado entre 2008 e 2016. “Até 2009, (nem) sequer sabia que Solange era funcionária da Assembleia, inclusive chegou a dar carona para ela ir à Padaria Bem Bolado, em Bragança Paulista”, diz o termo de depoimento.
Outra testemunha acrescentou que a “funcionária fantasma” trabalhava “na casa dela produzindo massas e doces, em nome de uma empresa chamada Bauna Massas”. Neste tipo de caso, as investigações buscam apurar se os “fantasmas” prestam serviços pessoais aos parlamentares e se parte de seus vencimentos é desviada.
Também estão sob investigação outros três deputados: Luiz Fernando Teixeira Ferreira (PT), Campos Machado (PTB), e Davi Zaia (PPS).