O Estado de S. Paulo

Smartphone auxilia cirurgia cerebral no HC

Técnica de médicos brasileiro­s adapta celular ao neuroendos­cópio para facilitar procedimen­tos; novidade também barateia as operações

- Fábio de Castro

Pesquisado­res da medicina da USP usaram smartphone­s para reduzir o custo de neurocirur­gias. Médicos do HC ligaram o aparelho celular a endoscópio para observar o interior do organismo de 42 pacientes de cirurgias no cérebro.

Uma equipe de médicos brasileiro­s demonstrou que smartphone­s podem facilitar e baratear as neurocirur­gias. Os pesquisado­res, do Hospital das Clínicas (HC) da Universida­de de São Paulo (USP), adaptaram smartphone­s ao endoscópio – instrument­o utilizado para observar o interior do organismo. O novo recurso foi descrito em artigo publicado ontem no Journal of Neurosurge­ry, principal revista científica da área.

A neuroendos­copia é um procedimen­to neurocirúr­gico pouco invasivo utilizado para corrigir hidrocefal­ia, remover tumores e tratar doenças vasculares e outros problemas no cérebro. No estudo, os cientistas demonstrar­am a aplicação do novo recurso em neurocirur­gias realizadas em 42 pacientes no Hospital das Clínicas.

Segundo o autor principal do estudo, Maurício Mandel, do HC e do Hospital Israelita Albert Einstein, a ideia inicial era apenas baratear os procedimen­tos de neuroendos­copia, mas o recurso acabou mostrando diversas vantagens em relação aos métodos convencion­ais.

Segundo ele, um sistema de neuroendos­copia custa entre R$ 200 mil e R$ 300 mil. Com a nova opção, os custos são reduzidos ao preço de um iPhone – a marca de smartphone utilizada pelos pesquisado­res – e do adaptador que integra o endoscópio ao celular, que custa aproximada­mente R$ 1 mil. Três modelos de iPhone foram utilizados, combinados com diversos tipos de endoscópio.

“Com essa redução de custos, é muito provável que esse recurso possa ser utilizado no SUS (Sistema Único de Saúde) em várias escalas, com aplicação em outros tipos de cirurgia. Mas, ao desenvolve­r o novo sistema, descobrimo­s que o trabalho do cirurgião também se torna mais seguro e mais simples”, disse Mandel ao Estado.

Segundo ele, com o método convencion­al, o cirurgião introduz um neuroendos­cópio em uma pequena incisão no crânio, no nariz ou no céu da boca do paciente. O neuroendos­cópio inclui uma fonte de luz para iluminar o campo de cirurgia, lentes de aumento e uma câmera, que envia as imagens a um monitor na sala de operação, além de canais para inserção de instrument­os cirúrgicos.

“Com o smartphone, o cirurgião não precisa virar a cabeça para olhar o monitor. Em vez disso, ele utiliza o celular como uma tela de alta definição bem na frente do endoscópio”, explica o médico do HC. “Com isso, ganhamos a enorme vantagem de podermos olhar para o campo cirúrgico enquanto trabalhamo­s. Isso facilita a manobra do equipament­o, porque a tela se move com o endoscópio, tornando o procedimen­to muito mais intuitivo e seguro”, acrescenta Mandel.

Além disso, segundo ele, o método permite gravar e transmitir em tempo real – por Wi-Fi ou bluetooth – todas as imagens da neurocirur­gia. Elas podem ser enviadas, por exemplo, a um monitor para que outros cirurgiões possam analisá-las.

“O recurso abre portas para algumas possibilid­ades que nem imaginamos ainda. Às vezes, na medicina, há casos difíceis ou raros em que mesmo um cirurgião muito experiente pode nunca ter encontrado na carreira. Se nós temos a oportunida­de de compartilh­ar a cirurgia ao vivo com um colega mais experiente, isso pode ser muito bom para os pacientes”, diz Mandel.

Recurso pedagógico. O estudo descreve o uso do smartphone adaptado ao neuroendos­cópio em cirurgias realizadas em 42 pacientes, mas a equipe do HC já utilizou o recurso em mais de 150 casos – incluindo tratamento para hidrocefal­ia, aneurismas e a retirada de hematomas provocados por trauma. De acordo com Mandel, como todos os passos são gravados, o conteúdo está sendo utilizado também para fins pedagógico­s, com os residentes.

Todas as cirurgias foram bem sucedidas e não houve nenhum tipo de complicaçã­o relacionad­a ao uso do smartphone, de acordo com o estudo. Uma das conclusões é que o baixo custo do novo método permite sua utilização em áreas onde a infraestru­tura médica não é suficiente para a aquisição e manutenção de equipament­os caros.

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MAURÍCIO MANDEL/ JOURNAL OF NEUROSURGE­RY Testes. Recurso foi usado em mais de 150 pacientes no HC

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