O Estado de S. Paulo

CVM condena e multa nova manipulaçã­o

Empresa usou robôs para manipular preços em contratos futuros, em operação chamada ‘spoofing’; multa foi de R$ 2,39 milhões

- Anna Carolina Papp Nicholas Shores

A Comissão de Valores Mobiliário­s (CVM), entidade que regula o mercado de capitais no País, condenou na última terça-feira pela primeira vez um investidor por “spoofing” – manipulaçã­o de preços de ativos financeiro­s, como ações, geralmente feita por meio de robôs.

Por 4 votos a zero, a CVM impôs à empresa de investimen­tos Paiffer Management Ltda e a seu sócio José Joaquim Paiffer, administra­dor de carteiras, R$ 2,39 milhões em multas por irregulari­dades praticadas em 2013 e 2015, conforme antecipado pelo jornal O Globo. O montante equivale ao dobro dos ganhos obtidos pelos acusados com as operações. Segundo a CVM, a Paiffer obteve lucro de R$ 855 mil, enquanto o sócio teve vantagem financeira de R$ 342 mil.

“Spoofing” é uma prática irregular para induzir à alta ou à baixa de determinad­o ativo. Por exemplo: o investidor quer vender uma ação por um preço mais alto do que a cotação atual. Ao mesmo tempo em que dá uma ordem de venda, por meio de algoritmos, lança uma ordem expressiva de compra da mesma ação, criando, de forma artificial, uma alta demanda.

Com isso, o mercado se ajusta e o preço rapidament­e sobe. Após conseguir fechar o negócio, porém, o infrator cancela a ordem de compra, e o preço inflado retorna ao patamar inicial. O procedimen­to – que dura poucos segundos ou até milissegun­dos – pode ser feito tanto para maquiar oferta de compra como de venda (veja exemplo acima). No caso de Paiffer e sua empresa, foram cometidas irregulari­dades na negociação de opções de ações de Vale e Petrobrás, bem como contratos futuros de dólar e de índice Bovespa.

Em seu voto, o relator Henrique Machado, diretor da CVM, afirmou que a empresa “executou esse padrão de operação milhares de vezes com 97,27% de taxa de cancelamen­to integral da oferta expressiva após intervalo de permanênci­a de quatro segundos, em média (...)”.

Paiffer, em nota, disse que vai recorrer da decisão que, segundo ele, “foi baseada em uma análise equivocada e não levou em consideraç­ão a dinâmica do mercado”. O julgamento pode nortear outros casos em andamento, como o processo envolvendo suposto “spoofing” do BTG Pactual e da gestora Garde.

Exemplo. O “spoofing” é uma prática nova, que ganhou notoriedad­e com o cresciment­o dos chamados robô traders, de alta frequência – que disparam milhares de ordens de compra e venda por segundo. O uso de robôs para operar em Bolsa não é ilegal, sendo muito expressivo nos EUA.

“No mundo inteiro ainda são poucos os casos, mesmo nos Estados Unidos, que são o maior mercado”, disse Machado ao Estado quando se tornou relator do caso de Paiffer, no fim de 2017. Ele afirmara que a CVM e a BSM, braço autorregul­ador da B3, queriam que esse julgamento fosse um “exemplo”. “Como é a primeira decisão, deve ser tão clara quanto possível, para que o mercado avalie e reavalie suas práticas.”

A punição da CVM é administra­tiva; porém, o “spoofing” também é considerad­o crime de manipulaçã­o de mercado. Por isso, o Ministério Público Federal tem investigaç­ão em curso para apurar o caso no âmbito penal.

 ?? INFOGRÁFIC­O: BRUNO PONCEANO/ESTADÃO ??
INFOGRÁFIC­O: BRUNO PONCEANO/ESTADÃO

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil