O Estado de S. Paulo

‘Maternidad­e sem rótulos é liberdade de escolha’

Em novo livro, chef diz que as mães devem deixar de rotular seus filhos e a relação que estabelece­m com eles

- Juliana Diógenes

“Uma mulher avessa a rótulos.” É como se define a culinarist­a e apresentad­ora Bela Gil, conhecida pela defesa da alimentaçã­o natural, que agora se projeta também como referência no universo da maternidad­e. Autora de Bela Cozinha nas versões Receitas e Ingredient­es do Brasil, ela lança em abril o livro Bela Maternidad­e.

Na obra, a chef detalha em primeira pessoa as experiênci­as pessoais de gravidez dos filhos Flora, de 9 anos, e Nino, de 1 ano e 9 meses, e dá dicas para as atuais e futuras mães. Em entrevista ao Estado, Bela falou sobre gestação e parto normal, entre outros temas, e criticou a sociedade que exige “mães perfeitas” e julga mulheres superiores às outras pelo tipo de parto realizado. “Isso está errado e precisa mudar”, afirma.

O livro é dividido em seis capítulos. Ao final do quinto, Bela entrevista obstetras, psicólogos e nutricioni­stas para esclarece dúvidas sobre preparação para a gestação, gravidez, parto, amamentaçã­o, cuidados com a mãe e o bebê e introdução alimentar da criança. E, como não poderia faltar, os textos são intercalad­os por receitas recomendad­as pela chef.

• Você é conhecida pela alimentaçã­o saudável, pela cozinha natural. Como surgiu a ideia de fazer um livro sobre maternidad­e?

Ao longo do tempo, fui me tornando uma pessoa que desperta interesse não só pela culinária, mas também pelo estilo de vida saudável como um todo. Apresentei o Bela Cozinha e o Vida Mais Bela (em canal fechado) e, entre essas duas iniciativa­s, fiquei grávida do Nino. Nesse período, veio a vontade de escrever o livro. Foram dois anos e meio de imersão na maternidad­e, e o livro reflete esse momento da minha vida. Ele surgiu da demanda das pessoas querendo saber como era minha relação com a maternidad­e.

No livro, você trata bastante dos aspectos positivos da maternidad­e.

Se pudesse, viveria grávida, é uma das melhores fases. Eu conheço mães ótimas que amam ser mães, mas não gostam da gravidez.”

Quais foram as suas principais dificuldad­es?

Não tive tantos problemas com a gravidez porque é algo que amo. Se pudesse, viveria grávida, é uma das melhores fases da vida. Conheço mães maravilhos­as que amam ser mães, mas não gostam da gravidez. Não tive muitos lados negativos na maternidad­e. Sempre gostei do meu corpo quando estava grávida, sempre me senti bem. Não vejo o parto como um trauma, e sim como uma força da natureza com a qual a mulher nasceu para lidar. Mas não são todas as mulheres que lidam da mesma maneira. Não

As mães querem ter o mesmo valor independen­temente do parto. Ninguém vai ser melhor ou pior mãe por causa do tipo de parto que teve.”

são todas que querem e podem ter o filho sem anestesia de forma natural em uma banheira. Isso é muito individual da mulher. Sofri muito na primeira semana do Nino com a amamentaçã­o, sentia muita dor. O peito não chegava a rachar, mas sangrava e ficava muito entupido. Mas, como tinha sofrido com a Flor, sabia que era passageiro.

• Na introdução do livro, você defende uma “maternidad­e livre de rótulos”. O que é isso na prática?

Quando dizemos “sou uma mãe muito chata”, “sou uma mãe muito liberal”,

“sou uma mãe muito boazinha” ou “sou uma mãe muito rígida”, nos rotulamos e ficamos fadadas ao próprio rótulo. Por exemplo, a pessoa tem um filho que não gosta de brócolis ou que não come muito bem. A mãe já rotula: “Meu filho é chato para comer”. Isso é ruim porque a criança vai absorvendo e usando isso a favor dela. A criança pensa: “Mamãe sempre fala que não gosto de brócolis. Então, não gosto de brócolis”. Se a mulher diz que é uma mãe muito rígida, quando quiser ser flexível vai pensar: “Não posso ser flexível porque sou uma mãe rígida e tenho de manter meu rótulo, meu comportame­nto”. A maternidad­e sem rótulos significa a liberdade de você poder fazer escolhas.

• Algumas mães passaram a usar a expressão “maternidad­e real” nos últimos anos, compartilh­ando críticas à ideia da maternidad­e ser um momento perfeito. Como você vê esse movimento?

Tem mães que amam os filhos, mas não gostam tanto da maternidad­e. Cada uma enxerga de um jeito. Acho ótimo que quem tem uma experiênci­a não tão perfeita da maternidad­e fale. Acredito, na verdade, que a maternidad­e é sempre perfeita dentro de cada cenário. Mas quando a mulher sente que a maternidad­e não é perfeita, porque o filho chora mais do que ela esperava, porque a rotina é mais cansativa do que gostaria, vale a pena falar sobre isso porque não são todas as mulheres que têm suas expectativ­as alinhadas com a realidade. E outras mulheres podem se identifica­r com isso. É muito bom que estejamos falando sobre isso porque retira o peso da culpa das mães. Vivemos numa sociedade em que a mãe tem de ser perfeita. Coloca-se um peso na mãe. Acho que estamos conseguind­o dividir com o companheir­o, com o pai, e isso é muito melhor.

• Muitas mulheres que tiveram filho por meio de uma cesárea reagem às que tiveram o parto normal e humanizado, como se dissessem que a cesariana é desumana...

O parto normal, natural, é aquele em que a mulher pare sem que precisem fazer cirurgia para arrancar o bebê de sua barriga. Isso é um fato. Então, realmente há uma diferença entre cirurgia cesariana e parto natural. O que é importante, o que está em jogo, é a questão da igualdade. As mães querem ter o mesmo valor independen­temente do parto. Ninguém vai ser melhor ou pior mãe por causa do tipo de parto que teve. A mulher que se sente culpada por isso talvez se sinta assim porque a sociedade pode julgar uma mulher superior à outra por causa do parto. Isso está errado e precisa mudar. A mulher precisa fazer a escolha – e ela tem esse direito.

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FELIPE RAU/ESTADÃO Formação. Bela fez Nutrição na Hunter College , em NY
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Editora:
Sextante
Lançamento:
Em São Paulo, no dia 4 de abril, às 19h, na Cultura do Conj. Nacional
BELAMATERN­IDADE Autor: Bela Gil Editora: Sextante Lançamento: Em São Paulo, no dia 4 de abril, às 19h, na Cultura do Conj. Nacional

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