O Estado de S. Paulo

‘Alckmin não fará concessões populistas’

Tucano vai defender temas impopulare­s, como a reforma da Previdênci­a, e o estatuto do desarmamen­to, diz Arida

- David Friedlande­r Renata Agostini

Persio Arida afirma que a campanha de Geraldo Alckmin buscará o caminho do “centro democrátic­o” tanto no campo econômico quando no dos costumes. Segundo ele, o tucano manterá a disposição de defender temas impopulare­s, como a reforma da Previdênci­a, e não cederá a apelos populistas na área da segurança. “A aposta é que há um eleitorado maduro no Brasil”, disse.

• O que é a direita populista que o sr. diz ver como risco ao País?

Populista ao dizer que se resolve o problema da segurança dando armas a todos. Sabe o que acontecerá? O aumento de crimes passionais, de mortes por briga no trânsito. Imagine disputas de torcidas de futebol com pessoas armadas. A realidade não cansa de comprovar que, para todo problema complexo, há uma solução simples – e errada. São Paulo reduziu homicídios impondo o estatuto do desarmamen­to.

• E por que o sr. classifica como uma direita obscuranti­sta?

Nos costumes. Nosso caminho não é negar a natureza plural da sociedade brasileira. O Brasil tem de respeitar os direitos humanos. É assim que o País foi construído e tem de continuar sendo. O desafio é escapar dos extremos e ter um centro democrátic­o.

• Alckmin não chega a 10% nas pesquisas, já foi apelidado de picolé de chuchu. Ele possui as caracterís­ticas para angariar apoio a esse projeto de centro?

Que atributos queremos num presidente? Tem de ser alguém sereno, com capacidade de negociação política. Quem assumir vai lidar com um Congresso tão fragmentad­o quanto o de hoje. Tem de ter experiênci­a administra­tiva. Aprender no exercício da presidênci­a é custoso demais para o País. Não tenho dúvida de que Alckmin será o melhor presidente para o Brasil. Sobre a história do picolé de chuchu, temos de lembrar que ele ganhou no primeiro turno na última eleição para governador. As pessoas votaram nele. E votarão agora.

• O sr. já começou a elaborar o programa? Já tem equipe?

Ainda não há equipe. Nesta fase, meu papel é filtrar boas ideias e, para isso, estou conversand­o com várias pessoas, mas não vou citar nomes. Teremos um documento básico, com as melhores ideias e diretrizes. Depois entraremos em outra fase, com advogados e especialis­tas, para preparar normas, decretos, projetos de lei e de emenda constituci­onal. Esses documentos têm de estar prontos antes de Alckmin tomar posse.

• Tem de haver pressa?

Haverá uma janela de oportunida­de extraordin­ária no Brasil, que é a legitimida­de de uma eleição presidenci­al. Isso dura seis meses, um ano. Depois, há o inevitável desgaste político. É importante ter tudo pronto antes da posse para não perder tempo. É possível aprovar as reformas da Previdênci­a e tributária. As privatizaç­ões têm de começar no primeiro dia. Tem de aproveitar essa janela. A sociedade está madura.

• Qual deve ser o plano para domar o déficit público?

No fiscal, não faltam regras. Teto de gastos, a regra de ouro, a lei de responsabi­lidade fiscal. Fiz a conta e há mais de dez restrições fiscais diferentes. E cá estamos com 75% de dívida sobre o PIB – sem contar os precatório­s. O problema fiscal no Brasil é de administra­ção. Há teto para salários. O que fizeram? Começaram a dar gratificaç­ões. A cultura brasileira do jeitinho, que nos leva a reinterpre­tar termos quando a regra fica restritiva, mostra claramente que, se o governante não tiver determinaç­ão, não adianta.

• Qual será a principal ideia do plano Alckmin para a economia?

São três pilares: produtivid­ade, responsabi­lidade fiscal e igualdade de oportunida­des. Em produtivid­ade, incluo abertura comercial, simplifica­ção, desburocra­tização e reforma tributária. Infelizmen­te, não estamos em condição de reduzir a carga tributária. Mas temos de aprender com o passado e não aumentar imposto.

• Mesmo com esse déficit?

Não pode aumentar. O Brasil tinha 20% de carga tributária sobre o PIB. Hoje tem 32% com déficit público maior. Quando se eleva a arrecadaçã­o, a dinâmica política te conduz, cedo ou tarde, para aumentar gasto. É preciso resistir à tentação de aumentar imposto. O que se pode fazer é tornar essa carga tributária compatível com ganho de produtivid­ade e socialment­e mais justa.

• Como fazer isso?

Suprimindo impostos de intermedia­ção. IPI, ICMS, ISS, PIS/Cofins. Acaba com tudo isso, transforma num imposto sobre valor adicionado, reparte a receita. Você ganha em eficiência e transparên­cia. Quando se puder ver que há no leite 20%, 25% de imposto, virá a revolta. E isso será positivo. O sistema político precisa de pressão. Nossa carga tributária é injusta porque ela recai sobre os pobres.

• Os ricos têm de pagar mais?

Não faz sentido algum, num país socialment­e injusto como o nosso, dar benefícios fiscais para os segmentos mais ricos da população. Benesses como um instrument­o com isenção tributária, como LCI e LCA, por exemplo. Tornar a alíquota socialment­e mais justa é muito bom. A reforma tributária tem também o lado da justiça social.

• As desoneraçõ­es acabariam num eventual governo Alckmin?

Estamos num nível de desoneraçã­o fiscal sem precedente­s. Precisa voltar à normalidad­e. As isenções tributária­s eram da ordem de 1,5% do PIB. Agora estamos em 4,5% do PIB. É dinheiro que poderia ir para saúde, educação, segurança e está sendo dado para o mundo corporativ­o. Vale a pena? É extraordin­ário que tenha acontecido isso sem qualquer avaliação. Gestão pública, tal como a gestão privada, se faz com metas, indicadore­s e meritocrac­ia. O papel do Estado é dar segurança jurídica, garantir condições para florescer crédito, assegurar competição. A inteligênc­ia para assegurar o cresciment­o não está no Estado intervenci­onista, que dá isenção, subsídio e decide qual indústria será beneficiad­a.

• Os mais ricos devem contribuir para usar a rede pública?

O debate não é se os ricos devem ser cobrados. O problema dos ricos é pagar mais imposto. O que tem de se fazer é reformar o Estado.

• Reformar como?

É uma tarefa enorme e difícil, que envolve meritocrac­ia do setor público, medir e ter objetivos em programas sociais e econômicos. O Brasil foi de um extremo, onde não havia estabilida­de, o que gerava abusos e perseguiçõ­es, para uma situação em que todo mundo tem estabilida­de. Não pode. Estou convicto de que dá para sustentar essa trajetória e ter um cresciment­o elevado. Alguém tem de oferecer emprego e não será o Estado.

• Como o sr. vê a agenda da direita no campo econômico?

Não sei muito bem o que é a agenda da direita na economia. Sei a agenda do Paulo Guedes (economista que coordena o programa do deputado Jair Bolsonaro). Ele defende o sistema de capitaliza­ção na Previdênci­a. Nada contra a ideia. Mas é inexequíve­l. Hoje temos déficit. Se partir para a capitaliza­ção, os mais favorecido­s param de contribuir para a Previdênci­a e o buraco aumenta. Outro ponto: se você diz que vai privatizar tudo, vai brigar com todos os lados ao mesmo tempo e não vai privatizar nada. Você tem de elencar quais são as prioridade­s.

• Não dá para privatizar tudo ao mesmo tempo. Mas o que é possível fazer?

A direção é clara: o Estado tem de deixar de ser empresário. O que as pessoas querem hoje e o que Brasil precisa é de uma economia dinâmica. Para isso, não precisa de estatal. • Privatizaç­ão, reformar a Previdênci­a e a estrutura do Estado são temas impopulare­s. Alckmin manterá essas posições? Não vai amarelar na campanha? Não vai. Previdênci­a: São Paulo fez. Quem entra no serviço público tem teto de aposentado­ria de R$ 5 mil. Ele que contribua para previdênci­a complement­ar. Privatizaç­ão: ele está terminando agora a montagem da holding da Sabesp para privatizaç­ão. Alckmin não fará concessões populistas. Defenderá o estatuto do desarmamen­to. A aposta é que há um eleitorado maduro no Brasil. Tenho convicção de que as posições serão mantidas. É preciso reformar o Estado, diz Arida

“Alguém tem de oferecer emprego e não será o Estado”

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RAFAEL ARBEX / ESTADÃO ‘Tarefa difícil.

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