O Estado de S. Paulo

Tecnologia faz renda crescer no campo e vaga informal cair

Em 5 anos, emprego recuou, mas rendimento médio do trabalho subiu 7%, diz estudo

- Márcia De Chiara

Entre 2012 e 2017, o número de vagas de emprego informal no agronegóci­o caiu 3,4% ao ano – na agricultur­a como um todo, a retração chega a 5% das vagas informais ao ano no mesmo período, de acordo com estudo inédito feito pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do IBGE e obtido pelo Estado. “O agronegóci­o tem absorvido cada vez menos mão

de obra informal e com menos qualificaç­ão”, afirma o economista Felippe Serigatti, coordenado­r da pesquisa. Consequênc­ia disso, o rendimento médio real (descontada a inflação) do trabalho no agronegóci­o subiu 7%, acima dos 4,6% registrado­s para os trabalhado­res de todos os setores da economia. Na agropecuár­ia, o avanço acumulado em cinco anos foi de 9,2% na renda e na agricultur­a, de 8,3%. O emprego formal no campo também viu o número de trabalhado­res cair: 4,9% na agricultur­a e 1,4% no agronegóci­o ao ano em cinco anos.

Desde que começou a cursar agronomia na Universida­de Estadual de Londrina (PR), Gustavo Okano Alves Pinto, de 22 anos, queria trabalhar na área digital. No segundo ano da faculdade, um professor lhe apresentou a agronomia digital. Ela une o conhecimen­to da agronomia tradiciona­l e um grande número de dados coletados no campo em tempo real, além de informaçõe­s sobre o passado das lavouras. Com isso, é possível decidir o melhor momento, por exemplo, de plantar, gastando menos.

“Percebi que aquela toada da agronomia tradiciona­l estava muito batida”, lembra Okano. De lá para cá, ele começou a procurar cursos e estágios paralelos à faculdade para se tornar um agrônomo digital. Hoje, prestes a concluir a faculdade, acredita que com essa qualificaç­ão extra poderá conseguir um emprego com salário inicial até 25% maior do que o pago a um agrônomo tradiciona­l. “A agronomia digital é um mar de calmaria: pouca gente trabalhand­o e uma demanda forte por profission­ais qualificad­os.”

O que o estudante percebeu na prática aparece nos resultados de uma radiografi­a do mercado de trabalho do agronegóci­o, feita pelo Centro de Estudos do Agronegóci­os da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Nos últimos cinco anos, o agronegóci­o tem absorvido cada vez menos mão de obra, sobretudo informal. Isso ocorreu por causa da incorporaç­ão de novas tecnologia­s no campo, mais intensivas em capital, que ampliaram a produtivid­ade. O resultado foi o aumento da remuneraçã­o dos trabalhado­res, num ritmo mais intenso do que o da economia em geral. O campo admitiu profission­ais qualificad­os, como Okano, e pagou mais por isso.

O estudo inédito, baseado em dados da Pnad do IBGE e coordenado pelo economista Felippe Serigatti, revela que entre 2012 e 2017 a população ocupada no agronegóci­o caiu 1,9% ao ano. Em 2012 eram 19,7 milhões de pessoas e, no fim do ano passado, 18 milhões.

A queda foi mais acentuada no trabalho informal (- 3,4% ao ano), mas também houve recuo nos trabalhado­res formais do agronegóci­o (-1,4%). Na agricultur­a, que é um dos segmentos do agronegóci­o, a retração na ocupação foi bem maior: de 5% ao ano nas contrataçõ­es informais e de 4,9% nas formais. “O agronegóci­o tem absorvido cada vez menos mão de obra informal e com menos qualificaç­ão. Isso pode parecer uma má notícia, mas não é”, afirma Serigatti.

Ele argumenta que, com o uso intensivo de tecnologia, a produtivid­ade e a renda dos ocupados aumentou. Entre 2012 e 2017, o rendimento médio real (descontada a inflação) do trabalho no agronegóci­o cresceu 7%, muito acima do avanço registrado para os trabalhado­res de todos os setores da economia no período, de 4,6%. Na agropecuár­ia, o avanço acumulado em cinco anos foi de 9,2% e na agricultur­a, de 8,3%.

Caos. Serigatti explica que a redução de mão de obra no campo não levou ao aumento do número de desemprega­dos. “Não compartilh­o dessa hipótese de que a liberação dessa mão de obra tenha levado ao caos social.” Com mais produtivid­ade, o agronegóci­o, ampliou a renda nas cidades do interior e os desemprega­dos do campo foram trabalhar no setor de serviços.

O economista faz essa afirmação com base no desempenho da economia do interior que, de acordo com o IBGE, foi melhor do que o das regiões metropolit­anas. Entre 2000 e 2015, o PIB das cidades dos interior cresceu 3,7% ao ano, enquanto o das regiões metropolit­anas avançou 2,5% e o do País subiu 3%.

Um estudo da Confederaç­ão Nacional da Agricultur­a (CNA) confirma a tendência apontada pela FGV, porém com números diferentes. Renato Conchon, coordenado­r do Núcleo de Economia da CNA, diz que a fatia da mão de obra ocupada no agronegóci­o, que era de 32% em 2014, caiu para 19% em 2017. “O campo está contratand­o menos e pagando mais”, afirma.

A parcela de trabalhado­res que recebiam até um salário, que era 33,6% dos ocupados em 2014, recuou para 29,8% em 2016. No mesmo período, a fatia dos que não tinham instrução ou até dois anos de estudo diminuiu de 34,4% para 32,3%. “O campo como mercado de trabalho para os sem qualificaç­ão está cada vez menor”, observa.

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LONDRINA /PR Gustavo Okano Alves Pinto ESTUDANTE DE AGRONOMIA DA UNIVERSIDA­DE ESTADUAL DE

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