De volta ao faz de conta?
Onível de tensão no Supremo deve disparar ao grau máximo hoje, durante uma reunião da ministra Cármen Lúcia com um grupo de colegas, sem pauta, sem horário pré-marcado e sem confirmação de presentes, deixando no ar a pesada e desagradável sensação de que será uma tentativa de emparedar a presidente da Corte, firmemente decidida a não facilitar a revisão da prisão após condenação em segunda instância.
Quem pediu a reunião (ou teria sido destacado pelos demais para pedi-la?) foi Celso de Mello, que não tem apenas o status de decano como é efetivamente um dos ministros mais técnicos e apartidários do Supremo – além de ser o mais próximo amigo de Cármen Lúcia. O pedido, seu autor e o momento já dizem muito sobre o tema que deverá estar na mesa nesse encontro, com muitas especulações.
Daqui e dali, surgem notícias sobre o isolamento da presidente e isso começou numa data específica: a da condenação do ex-presidente Lula pelo TRF-4, abrindo a contagem de tempo para sua prisão. Quanto mais o cerco se fecha em torno de Lula, mais as pressões e as divergências internas aumentam no Supremo, em meio a intenso tiroteio entre o mundo petista, de um lado, e a opinião pública, do outro.
No teatro de operações, Cármen Lúcia se tornou personagem-chave, por deter uma arma poderosa: a pauta do plenário. É ela quem pode pôr em pauta a revisão da prisão em segunda instância, mas avisou que não poria, não pôs mesmo e já adianta que não porá. O ministro que quiser que ponha “em mesa”. Mas nenhum deles foi para a linha de frente.
O relator da Lava Jato, Edson Fachin, não concedeu nem negou o habeas corpus (HC) preventivo de Lula e não assumiu colocar “em mesa” para o plenário julgar. O que ele fez? Deu declarações incisivas contra a revisão da prisão em segunda instância, decidida em três julgamentos recentes do Supremo, enquanto jogava a decisão no colo de Cármen Lúcia, para ela decidir pôr ou não em pauta.
Ontem, Gilmar Mendes deu mais uma lambada nos colegas, inclusive em Cármen Lúcia, declarando que HC é urgente por definição, tem de ser levado a plenário e o resultado, a favor ou contra, é uma outra história. Mas é aí que a porca torce o rabo.
Até a torcida do Corinthians sabe qual será a conclusão, se colocados em pauta o HC de Lula, o de um preso qualquer pela segunda instância, uma Ação Direta de Constitucionalidade (ADC) ou, ainda, uma liminar em ADC: Gilmar muda o voto, inverte o resultado e não apenas Lula fica solto, mas centenas de outros atuais e futuros presos, da Lava Jato ou não, também.
Em seu despacho ontem sobre a prisão do ex-executivo Gérson Almada, da Engevix, o juiz Sérgio Moro se referiu a “rumores” sobre o fim da prisão em segunda instância e fez uma defesa contundente dessa jurisprudência, destacando que uma revisão seria “desastrosa”. Segundo ele, o Brasil voltaria à época dos “processos sem fim e, na prática, da impunidade”, pois a previsão de que o condenado possa ser preso após decisão de um tribunal “acaba com o faz de conta das ações penais que nunca terminam, nas quais o trânsito em julgado é somente uma miragem e nas quais a prescrição e a impunidade são a realidade”.
Ainda segundo Moro, o fim da prisão em segunda instância não favoreceria apenas um condenado, mas todos os poderosos já presos e os que ainda receberão sentença por corrupção e lavagem de dinheiro em todo o território nacional – pela Lava Jato e não só por ela. Mais ou menos assim: os que estão presos saem, os que seriam não serão mais. Um paraíso para os condenados em segunda instância, mas um inferno para a sociedade brasileira, que defende o combate à corrupção e que a Justiça, enfim, seja igual para todos.
Sob pressão, externa e interna, Cármen Lúcia tem reunião decisiva hoje