O Estado de S. Paulo

Mineradora norueguesa admite ter contaminad­o Rio Pará com bauxita

Ambiente. Após ter negado contaminaç­ão, grupo Norsk Hydro – o maior produtor de alumínio do mundo – pediu desculpas às comunidade­s, às autoridade­s e à sociedade’; empresa já foi multada em R$ 20 milhões e deu férias coletivas a mil empregados

- Carlos Mendes ESPECIAL PARA O ESTADO / BELÉM / FÁBIO DE CASTRO E AGÊNCIAS INTERNACIO­NAIS

Após negar diversas vezes, o grupo norueguês Norsk Hydro reconheceu ontem que sua fábrica de alumínio Hydro Alunorte, no Brasil, derramou água sem tratamento no Rio Pará, o maior da região. A contaminaç­ão por bauxita atingiu comunidade­s, ribeirinho­s e quilombola­s que vivem no entorno das 20 bacias de rejeitos da empresa.

“Derramamos água de chuva e de superfície não tratada no Rio Pará. É totalmente inaceitáve­l e rompe com o que a Hydro representa. Em nome da empresa, peço desculpas diretament­e às comunidade­s, às autoridade­s e à sociedade”, disse o diretorger­al da empresa, Svein Richard Brandtzaeg. A Hydro Alunorte é a maior produtora de alumínio do mundo, com 5,8 milhões de toneladas anuais de alumina. Extraída da bauxita, a alumina é a principal matéria-prima para a produção do alumínio.

Autoridade­s brasileira­s afirmam que a empresa contaminou a água do município de Barcarena no norte do Pará, a 25 quilômetro­s de Belém, onde se situa a fábrica, por três dutos e canais clandestin­os, com resíduos de bauxita que teriam transborda­do do depósito da empresa depois de fortes chuvas nos dias 16 e 17 de fevereiro.

Os poços artesianos que fornecem água para a população beber, tomar banho e cozinhar foram condenados por análise do Instituto Evandro Chagas, que identifico­u substância­s como chumbo, bário, soda cáustica e alumínio – esta última com valor 32 vezes acima do permitido pela Organizaçã­o Mundial de Saúde (OMS).

“Nem plantar suas roças as famílias podem, porque a floresta e o solo também estão contaminad­os”, afirmou o advogado Ismael Moraes, que defende 105 comunidade­s de Barcarena. Desde o ano passado, ele move ações contra a empresa na Justiça Estadual e na Federal. Sobre o pedido de desculpas do diretor-geral, Moraes foi taxativo: “É pura hipocrisia”.

A empresa afirma que o derramamen­to não está relacionad­o às fortes chuvas de meados de fevereiro. “Toda a água de chuva e de superfície da refinaria da Alunorte deveria ter sido levada para o sistema de tratamento de água”, informou o grupo.

Os Ministério­s Públicos do Pará e Federal uniram forças para investigar os crimes ambientais da Hydro e propor ações criminais e civis de reparação de danos ao meio ambiente e às pessoas. O governo brasileiro aplicou ao grupo norueguês, em fevereiro, duas multas de R$ 10 milhões cada uma. A primeira, por “atividades potencialm­ente contaminan­tes sem licença válida” e a segunda por “operar um duto de drenagem sem licença”.

Além disso, o juiz Iran Sampaio, de Barcarena, obrigou a empresa a reduzir em 50% a produção de sua fábrica. A Hydro recorreu com medida cautelar, mas o desembarga­dor Leonam Cruz, do Tribunal de Justiça do Pará (TJ-PA), negou o pedido da empresa e depois um agravo. O grupo norueguês recorreu e ontem, por unanimidad­e, os 12 desembarga­dores da Câmara de Direito Penal do TJ-PA mantiveram a decisão de Cruz, que nos próximos dias deve julgar o mérito do caso.

Após a determinaç­ão de que metade da produção fosse cortada, a Hydro anunciou férias coletivas para mil trabalhado­res. O grupo tem 1,7 mil funcionári­os nos polos industriai­s de Barcarena e Paragomina­s. Em 2017, a companhia pagou R$ 365 milhões em impostos.

A Norsk Hydro encarregou a empresa SGW Services de realizar uma auditoria independen­te para esclarecer o caso e anunciou um investimen­to de cerca de R$ 270 milhões.

Minas Gerais. Em 2015, o Brasil viveu sua maior tragédia ambiental, quando uma barragem se rompeu na região de Mariana, em Minas, despejando cerca de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos. Um “tsunami” de lama matou 19 pessoas, arrasou várias localidade­s e percorreu mais de 600 quilômetro­s pelo Rio Doce até chegar ao Oceano Atlântico, devastando a fauna e a vegetação em seu caminho.

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THIAGO GOMES/AGIF-27/2/2018 Em 27 de fevereiro. Lama vermelha tingiu água

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