O Estado de S. Paulo

‘Quem vai catar os cacos dos corações?’

- ROBERTA MARTINELLI E-MAIL: ROBERTA.MARTINELLI@ESTADAO.COM

Desde o dia 14 de março de 2018, um novo lugar foi aberto no meu peito. No peito de todas as pessoas do nosso país. Marielle Franco foi assassinad­a e nós estamos todos chorando desde então. Chorando por ela, chorando por nosso país, chorando por tanta injustiça, covardia...

Chorando, eu escutei a canção que Xênia França gravou sobre outra mulher e a mesma dor; chorando, eu escutei a canção de Luedji Luna e não paro de me perguntar a questão do título dessa coluna. Chorando, eu li e reli o poema de Tatiana Nascimento que coloquei um trecho aqui. Chorando, eu escrevi essa coluna, chorando eu vou ao ato hoje no Vão do Masp e, chorando, eu vou lutar pelo Brasil. BREU

A primeira canção que eu citei na abertura é Breu, música que está no primeiro disco da Xênia França, cantora e compositor­a baiana que lançou, no ano passado, seu primeiro trabalho solo. Breu é uma composição de Lucas Cirillo, feita após a notícia do assassinat­o de Cláudia Silva pela polícia militar do Rio de Janeiro. Marielle. Quando soube do assassinat­o de Cláudia, Xênia disse a ele como era difícil ser uma mulher negra no País. Marielle. Ele logo escreveu a música, essa frase ressoa no nosso país “Outra mulher, outro fim, mesma dor”. Marielle.

CABÔ

Outra canção é Cabô, de Luedji Luna, cantora e compositor­a que lançou no ano passado o disco Um Corpo no Mundo. Nascida no bairro do Cabula, em Salvador, e vivendo em São Paulo, ela canta “Quem vai contar os corpos? Quem vai catar os cacos dos corações? Quem vai apagar as recordaçõe­s? Quem vai secar cada gota de suor e sangue, cada gota de suor e sangue...”.

MARIELLE PRESENTE! E aqui um trecho do poema y now, frágil de Tatiana Nascimento:

(mas eu sei ser trovão, e se eu sei ser trovão que nada desfez eu vou ser trovão que nada des faz)

nem a solidão nem o capataz estupro corretivo contra sapatão a loucura da solidão capataz queimarem

a herança de minhas ancestrais

arrastarem Cláudia pelo camburão

caveirão

111 tiros contra 5 corpos

111 corpos mortos na prisão

eu sei ser trovão? que nada desfaz?

nem a solidão golpistas contra a eleição agronegóci­o marido padre patrão

eu já fui trovão e se eu já fui trovão eu sei ser trovão!eu sei ser trovão que nada, nada desfaz

 ?? ELLIS RUA/AP ?? Marielle. Presente
ELLIS RUA/AP Marielle. Presente
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil