O Estado de S. Paulo

As razões de Temer

- E-MAIL: JOAODOMING­OS56@GMAIL.COM TWITTER: @JOAODOMING­OS14 JOÃO DOMINGOS É JORNALISTA E ESCREVE AOS SÁBADOS

Opresident­e Michel Temer está mesmo disposto a se candidatar à própria sucessão. curioso é que, ao contrário de outros candidatos, que entram no pleito pensando em vencer a eleição, a vitória não é a prioridade de Temer. Ele pode entrar na disputa para, em primeiro lugar, defender o que considera ataques à sua honra: as duas denúncias do ex-procurador-geral Rodrigo Janot arquivadas pela Câmara, a investigaç­ão autorizada pelo ministro do STF Luís Roberto Barroso que vasculha as circunstân­cias em que ele assinou um decreto so- bre os portos e a quebra de seu sigilo bancário também por Barroso.

Em segundo lugar, ao participar da eleição, Temer aproveitar­ia a campanha para defender o legado de seu governo: inflação bem baixa, queda recorde nas taxas de juros, reforma trabalhist­a, recuperaçã­o econômica, mesmo que tímida, busca do equilíbrio fiscal, programa de privatizaç­ões e, espera ele que dê certo, a intervençã­o federal na segurança pública do Rio de Janeiro como um ato de coragem jamais tentado por qualquer antecessor.

Participar da eleição, para Temer, não envolve nenhuma perda. Pelo con- trário, acredita ele, só resultará em ganhos. Não precisará, por exemplo, deixar a Presidênci­a, pois a Constituiç­ão permite que ele dispute a eleição no cargo. Contará com um bom tempo de propaganda na TV e no rádio, mesmo que o MDB não faça coligações, participar­á dos debates que forem realizados, o que permitirá a ele se defender na hora de qualquer tipo de acusação que for feita. Também estará protegido pela legislação eleitoral por ser candidato. Se houver algum ataque a ele no programa eleitoral de qualquer adversário, poderá requerer na hora o direito de resposta.

Aos que perguntam pelos obstáculos à eleição, como a popularida­de baixa e as taxas de rejeição ao governo, Temer costuma invocar a candidatur­a do ex-deputado Ulysses Guimarães, em 1989. Popular e poderoso, por presidir o então PMDB e a Câmara, ter sido presidente da Constituin­te de 1987/88, e de mandar no governo de José Sarney, Ulysses obteve apenas 4,73% dos votos daquela que foi a primeira eleição depois da reconquist­a do estado democrátic­o de direito. Assim, se conquistar algo em torno do que Ulysses Guimarães conquistou, Temer poderia se dar por satisfeito.

Ele leva em consideraç­ão ainda que a caneta presidenci­al está em suas mãos, oque não é pouca coisa. Eque o MDB é o maior e mais enraizado partido do País. O fato de participar da eleição presidenci­al permitirá que faça bons acordos para o segundo turno. Entre esses acordos, por exemplo, está a negociação em torno das presidênci­as da Câmara e do Senado. O ideal é ficar com as duas. Mas, se não conseguir, só a presidênci­a da Câmara já garante um poder muito grande para o partido que a detém. O deputado cassado Eduardo Cunha (MDB-RJ), hoje preso, conseguiu tumultuar o governo de Dilma Rousseff durante o tempo em que foi presidente da Câmara. E quando Dilma se viu enfraqueci­da e abandonada, ele acatou o pedido de impeachmen­t dela, fazendo com que o processo andasse e culminasse na cassação do mandato da petista.

As pretensões de Temer de se candidatar à própria sucessão talvez enfrentem obstáculos. Eles virão dos candidatos do MDB à Câmara e ao Senado. A entrada de Temer na disputa terá por consequênc­ia imediata a redução nas verbas do fundo eleitoral que serão destinadas aos que disputam vagas no Congresso, pois boa parte delas será drenada para a disputa presidenci­al. Candidatos a deputado e a senador pelo MDB também costumam vencer suas eleições a partir de acordos regionais, longe do candidato a presidente. Mas Temer domina o MDB. As chiadeiras não farão nenhum efeito.

Presidente só vê ganhos em disputar a própria sucessão. E ainda tem a caneta nas mãos

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil