O Estado de S. Paulo

CIENTISTA DA USP QUER ‘EVOLUIR’ A DEPUTADO

Após 30 anos analisando ossos e escavando fósseis, Walter Neves vai se lançar candidato

- Herton Escobar

Um dos maiores especialis­tas em evolução humana do Brasil, o antropólog­o Walter Neves resolveu fazer um experiment­o evolutivo dos mais ousados com sua própria vida. Quatro meses depois de se aposentar como professor titular da Universida­de de São Paulo (USP), Neves quer se transforma­r num híbrido raríssimo de político com cientista; coisa pouco vista na história da política nacional. No mês que vem, após 30 anos de carreira acadêmica, analisando ossos e escavando fósseis, vai se lançar candidato a deputado federal pelo Partido Pátria Livre (PPL), uma legenda criada em 2011.

“A vida foi muito generosa co- migo, e quero devolver um pouco disso à sociedade”, disse Neves ao Estado.

Sua candidatur­a foi aprovada ontem por um colegiado de acadêmicos preocupado­s com a situação política do País, denominado Cientistas Engajados. Os integrante­s do grupo deverão ser apresentad­os num evento no dia 7 de abril, na sede do PPL em Brasília.

Aos 60 anos, Neves é conhecido internacio­nalmente por seus estudos nas áreas de evolução humana e ocupação das Américas. Formado em biologia e arqueologi­a, foi professor titular do Departamen­to de Genética e Biologia Evolutiva da USP, onde fundou o Laboratóri­o de Estudos Evolutivos Humanos. É famoso pela descoberta de Luzia, o esqueleto mais antigo das Américas – e também pela língua solta, opiniões afiadas e espírito aguerrido.

“Se pessoas honestas e briguentas não tomarem o poder, tudo vai continuar do jeito que está”, afirma Neves. “Os cientistas não podem ficar passivos diante do que está acontecend­o com o Brasil.”

Um cientista candidato é algo inusitado no País. Neves confessa que a ideia não partiu dele, mas do PPL, e que nunca havia pensado sobre isso antes, mas está decidido a encarar o desafio e espera que outros sigam seu exemplo, com o sonho de criar uma “bancada do conhecimen­to” no Congresso.

“Do jeito que o sistema nacio- nal de ciência e tecnologia está desmantela­do, precisamos da participaç­ão direta de cientistas no Parlamento”, diz. “Eu não entendo nada de política, mas, como bom cientista, acho que vou aprender rápido.”

Ele esclarece que não quer representa­r apenas a comunidade científica, mas todos os brasileiro­s. “Jamais aceitaria um cargo desses para defender uma única agenda”, diz. “Minha bandeira número um será a justiça social.”

Origens. Mineiro de Três Pontas, filho de pai pedreiro e mãe vendedora de Yakult, Neves vem de origens humildes. Outro interesse seu é na área de direitos humanos, com a qual vem tentado se envolver há algum tempo. “Talvez a política seja uma maneira de fazer isso”, diz.

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DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO - 27/6/2017 Desafio. O antropólog­o Walter Neves se filiou ao PPL

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