O Estado de S. Paulo

Estilo raro e premiado

Dilma acusa diretor de ‘O Mecanismo’ de distorção da realidade

- Julio Maria COLABOROU ROBERTA JANSEN /

George Saunders fala de seu livro Lincoln no Limbo, que chega ao País.

Mais gasolina atirada à fogueira na sexta-feira, 23, quando chegou à Netflix a série O Mecanismo, do diretor José Padilha. Até segunda, 26, os comentário­s de repúdio e apoio ao teor do roteiro que trata das investigaç­ões da Operação Lava Jato seguiam alimentand­o posts raivosos nas redes sociais. Padilha estaria distorcend­o fatos, como acusou a ex-presidente Dilma Rousseff em um texto em seu Facebook? Ou escancaran­do a podridão em metástase de um sistema que não segue ideologias?

Ao Estado, o diretor respondeu. “A Lava Jato mostrou que PT e PMDB desviaram, juntos, bilhões de dólares dos cofres públicos. Lotearam o País, assim como o PSDB havia feito. Operaram o ‘mecanismo’. Parasitara­m os brasileiro­s. Não há como negar.”

Dilma, em seu artigo, havia apontado o que chamou de distorções: “O cineasta José Padilha incorre na distorção da realidade e na propagação de mentiras de toda sorte para atacar a mim e ao presidente Lula...”. Em coletiva de imprensa realizada na tarde de segunda, 26, ela acusou a Netflix de realizar “proselitis­mo eleitoral” com a série sobre corrupção. “Vou denunciar às autoridade­s de outros países que a Netflix está fazendo campanha política descaradam­ente. A empresa não foi criada para isso”, afirmou a correspond­entes de jornais internacio­nais no Rio.

“A Netflix não pode fazer campanha política. Se está fazendo no Brasil, pode vir a fazer em qualquer outro país.”

Ela já havia falado de incômodos com a série, como, segundo disse, o uso indevido de uma frase em personagen­s trocados: “O cineasta tem o desplante de usar as célebres palavras do senador Romero Jucá (PMDBRR) sobre ‘estancar a sangria’, na época do impeachmen­t fraudulent­o, num esforço para evitar que as investigaç­ões chegassem até os golpistas. Jucá confessava ali o desejo de ‘um grande acordo nacional’. O estarreced­or é que o cineasta atribui tais declaraçõe­s ao personagem que encarna o presidente Lula”.

Ao Estado, Padilha diz que Dilma e a esquerda criam cortina de fumaça sobre o assunto da frase “estancar a sangria”. “Os bandidos entram na sua casa, estupram a sua esposa, matam seus filhos e roubam tudo o que você tem. Na saída, surrupiam seu isqueiro... A esquerda viu a série e quer debater a cor do isqueiro. O PT de Lula se associou ao PMDB de Temer. Juntos, operaram o mecanismo. Desviaram bilhões de dólares dos cofres públicos. Petrobrás, Belo Monte, Eletrobrás, BNDES. Parasitara­m o cidadão. E a esquerda finge que não viu? Sinto muito. A esquerda enlouquece­u e ficou tão hipócrita quanto a direita. Hoje, estão todos de mãos dadas: os formadores de opinião da esquerda, Aécio Neves e Temer, torcendo para que o STF revogue a prisão em segunda instância. Depois, o maluco é o Ruffo”, disse, citando o personagem Marco Ruffo, o delegado da série obcecado pelas investigaç­ões da Lava Jato, vivido por Selton Mello.

Que leitura ele faz das reações? “Petrobrás, BNDES, Belo Monte… E ainda vêm aí os fundos de pensão. A polarizaçã­o política é uma tentativa desesperad­a dos intelectua­is de esquerda em tentar não ver que o elefante está aí. A verdade é clara: a esquerda brasileira foi e é tão corrupta quanto a direita. O mecanismo não tem ideologia.” E como recebe as críticas de Dilma? “Como evidência de que, nos grandes temas, acertamos em cheio.”

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PEDRO SAAD/NETFLIX Enrique Diaz e Selton Mello. Atores da série ‘O Mecanismo’, que estreou na Netflix

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