O Estado de S. Paulo

Eliane Cantanhêde

- E-MAIL: ELIANE.CANTANHEDE@ESTADAO.COM TWITTER: @ECANTANHED­E ELIANE CANTANHÊDE ESCREVE ÀS TERÇAS E SEXTAS-FEIRAS E AOS DOMINGOS

Preocupa a reação de Lula, que não poupa ameaças de revide a ataques a sua caravana na Região Sul.

Oex-presidente Lula saiu da sua zona de conforto e foi se meter na Região Sul, onde a recepção à sua caravana tem sido bastante diferente da que encontrou no Nordeste. Pedras, ovos, gritos e estradas bloqueadas estão mostrando não só a irritação contra Lula e o PT, mas também o grau de radicaliza­ção da campanha, que tende a piorar.

Soou estranho, até uma provocação, Lula sair em caravana no Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina justamente quando o TRF-4, de Porto Alegre, estaria confirmand­o a sua condenação a 12 anos e 1 mês. Primeiro, porque ele se pôs perigosame­nte próximo ao palco da decisão. Segundo, porque o Sul é refratário a Lula – e não é de hoje. Terceiro, porque a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, que está na primeira fila das ações no STF, é do Paraná.

Rejeite-se qualquer tipo de violência e agressivid­ade contra candidatos, que pode ir num crescendo e acabar virando uma nova modalidade de guerra de torcidas que, nos estádios, já coleciona feridos e mortos. Se Lula sobe no palanque antes da hora (e a Justiça Eleitoral não vê nada de mais), deixa o homem falar. Ouve quem quer.

Feita a ressalva, preocupa também a reação de Lula, que não poupa ameaças de revide e, em São Miguel do Oeste (SC), recorreu a uma expressão nada democrátic­a ao atiçar a polícia para entrar na casa de um manifestan­te e “dar um corretivo” nele. Como assim? Invadir a casa do cidadão? Dar um corretivo? Lula quer que a PM encha o “elemento” de pancada?

Pela força, simbologia e significad­o, vale a pena transcreve­r a fala do ex-presidente, que, um dia, décadas atrás, já foi alvo da polícia por defender a democracia e os direitos dos trabalhado­res: “Tem um canalha esperando que a gente vá lá e dê uma surra nele. A gente não vai fazer isso. Eu espero que a PM tenha a responsabi­lidade de entrar naquela casa, pegar esse canalha e dar um corretivo nele”.

Os petistas e seus satélites nunca jogaram ovo em ninguém? Nunca atiraram pedra em protestos contra adversário­s? E Lula nunca ameaçou convocar o “exército do Stédile”, referindos­e a João Pedro Stédile, do MST? Então, é aquela velha história: pimenta nos olhos dos outros...

Se a campanha oficial nem começou e já chegamos à fase de ovadas e pedradas, o risco é a eleição sair do controle, estimulada pelo excesso de candidatos versus a falta de ideias e programas, pelos processos, condenaçõe­s e salvos-condutos envolvendo um expresiden­te que é o líder das pesquisas.

Uma coisa não está clara, mesmo quando se lê o noticiário: quem são os que protestam contra Lula na Região Sul? Eles são vinculados a algum setor, igreja, movimento? E estavam ou não a serviço de uma outra candidatur­a e partido? Espontanea­mente ou a soldo? Na versão de petistas, eles são da “extrema direita”. Apoiadores de Jair Bolsonaro, por exemplo?

Uma coisa é protesto contra mensalão, petrolão, triplex, sítio... Outra é o surgimento de milícias movidas a ideologia que querem confronto e pavor. Ainda mais depois de Gleisi dizer que, “para prender o Lula, vai ter que matar gente”.

Ela falou isso quando a condenação de Lula já conduzia à conclusão lógica – e jurídica – de que ele acabaria sendo efetivamen­te preso. Só não foi, frise-se, por um salvo-conduto do STF que contraria o próprio entendimen­to do STF autorizand­o a prisão após segunda instância.

Se um lado ameaça com cadáveres e esmurra repórteres, enquanto outro reage com ovos e pedras, será eleição ou guerra campal?

Eleição ou guerra? Socos em repórteres, ovos e pedras, a ameaça de cadáveres...

(In)coerência. Os indignados com O Mecanismo, de José Padilha, são os mesmos que aplaudiram a cadeira “O Golpe de 2016”, na UnB, uma universida­de pública. É a história da pimenta, de novo...

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil