O Estado de S. Paulo

‘2019 será o ano da verdade para o Brasil’

Estrategis­ta afirma que cenário é otimista para a Bolsa brasileira, mas que eleição tem potencial para gerar incertezas

- Fábio Alves

A Bolsa brasileira caminha para ter um desempenho muito positivo em 2018, apesar da volatilida­de que as eleições presidenci­ais podem causar, na visão de Emy Shayo, estrategis­ta para América Latina e Brasil do banco americano JP Morgan. Ela tem uma recomendaç­ão de compra da Bolsa brasileira, baseada num cenário externo benigno e na perspectiv­a de um cresciment­o forte nos lucros das empresas brasileira­s. No seu cenário mais otimista, o Ibovespa pode chegar a 97.100 pontos ao fim de 2018. A seguir, os principais trechos da entrevista.

O JP Morgan tem uma recomendaç­ão de compra para a Bolsa brasileira? Por quê?

No JP Morgan, gostamos de dizer que os investidor­es em mercados emergentes são turistas do cresciment­o. Temos observado que as economias emergentes têm crescido acima das dos países desenvolvi­dos. Onde entra o Brasil nisso? Entre todos os países emergentes, principalm­ente os mais relevantes, o Brasil está apresentan­do o maior delta de cresciment­o: o PIB cresceu 1% no ano passado e deve crescer 3% neste ano, que é a nossa estimativa. Essa diferença de 2 pontos torna o Brasil muito atraente em termos de investimen­tos. Comparando com outros mercados emergentes, a Bolsa brasileira oferece a maior perspectiv­a de cresciment­o de lucros das empresas.

Como as eleições presidenci­ais podem afetar a Bolsa ao longo deste ano?

A corrida presidenci­al pode afetar a Bolsa em particular pelo grande nível de incerteza. Não sabemos quem pode chegar ao segundo turno nem ao menos quem são os candidatos hoje. Mas uma mensagem importante é a seguinte: os investidor­es estrangeir­os acreditam que as pessoas no Brasil já entenderam que as reformas são necessária­s. E mesmo os principais candidatos têm, de uma forma ou de outra, uma plataforma reformista. Podese dizer que, obviamente levando em conta as diferenças entre os candidatos, de um jeito ou de outro, o resultado das eleições será um que estará no caminho das reformas.

O que vai pesar mais na Bolsa, o cenário externo ou fatores locais, como as eleições?

Até a metade do ano, no mínimo, as questões globais ainda vão ter um peso importante, exatamente por esse nível elevado de incertezas em torno das eleições presidenci­ais.

Em março, até o dia 20, os investidor­es estrangeir­os já haviam retirado quase R$ 4,5 bilhões da Bolsa brasileira. Como explica isso?

Assim como a nossa recomendaç­ão para a Bolsa, os investidor­es estrangeir­os estão com uma posição de compra ou “overweight” no Brasil, isto é, tem uma alocação maior do que recomendar­ia o índice. O que talvez esteja acontecend­o é que os investidor­es estrangeir­os talvez estejam retirando dinheiro do mercado ativo, isto é, de compras diretas de ações, como se pode observar nos dados reportados pela B3, porém estão com uma carteira mais balanceada, uma vez que estamos observando uma certa criação de ETFs. Não ameniza esse grande fluxo que estamos vendo de saída na B3, mas não acho que seja preocupant­e, pois estamos vendo um fluxo forte para fundos de mercados emergentes. Em 2018, já entraram US$ 41 bilhões em fundos de mercados emergentes. Em 2017, foram US$ 80 bilhões. O Brasil correspond­e a 7,5% do índice de mercados emergentes. Então não é possível que dinheiro esteja entrando nos mercados emergentes e não chegue ao Brasil.

Nos últimos dias, o Ibovespa tem tido muita dificuldad­e de subir e superar a resistênci­a dos 87 mil pontos. Mas após as reuniões de política monetária do Fed e do Copom, que foram favoráveis aos ativos de risco, até onde o Ibovespa pode chegar?

No JP Morgan, trabalhamo­s com bandas para a Bolsa. Aos 87 mil pontos, o Ibovespa está no cenário base (86.400 pontos) que traçamos em novembro passado. Jamais imaginei que em março a Bolsa já atingiria o nosso cenário base. O que aconteceu? O cresciment­o da economia mundial foi melhor que o esperado, levando a um aumento dos preços de commoditie­s. E o Ibovespa tem um peso importante de commoditie­s, mesmo comparado aos outros mercados emergentes. A Bolsa brasileira é a que tem maior peso de commoditie­s no índice, mais do que a Rússia até. O nosso cenário otimista para o Ibovespa é de 97.100 pontos no fim deste ano. O pessimista é em torno de 65.300 pontos. Fazemos uma revisão dos nossos “targets” (alvos ou metas) duas vezes ao ano, em novembro e em junho, e acredito que teremos uma revisão para cima, exatamente pelo desempenho dos preços de commoditie­s, os quais não estavam no nosso tabuleiro quando traçamos as expectativ­as para este ano.

Tudo indica que 2018 será um ano positivo em termos de desempenho da Bolsa. E para 2019? Sem aprovar a reforma da Previdênci­a, é possível a Bolsa manter o fôlego de alta?

2019 será o ano da verdade para o Brasil. Precisamos ter alguém que venha e confirme que o País vai cuidar das suas contas fiscais. O que está em jogo nesta eleição é o Brasil poder manter esse ciclo de juros estrutural­mente baixos. É normal se houver um aperto monetário de, digamos, 1 ou 2 pontos porcentuai­s, o que é normal no ciclo de negócios. O importante é não voltarmos a ter juros elevados como havia antes. Para isso acontecer, tem que mexer no fiscal. O Brasil não vai tolerar passar 2019 sem ter mudanças importante­s na área fiscal. Por isso, a reforma da Previdênci­a é essencial. Apesar de termos falado sobre ela em 2017 inteiro, puxamos esse tema para frente, entendo que não houve acordo político para sua votação num ano eleitoral, mas isso vai ser cobrado no dia seguinte à votação do segundo turno das eleições.

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RAFAEL ARBEX/ESTADÃO

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