O Estado de S. Paulo

Espiritual e mundana

‘Paixão Segundo São João’, de Bach, é apresentad­a hoje, na Sala São Paulo

- João Luiz Sampaio ESPECIAL PARA O ESTADO

Bach completa este mês 331 anos – e no caso dele talvez não esteja errado deixar assim mesmo, no presente. Considerad­o o pai da música ocidental, sua obra segue viva em tudo aquilo que veio depois dele. Paradoxo nada pequeno, portanto, que sua presença nas temporadas brasileira­s seja tão discreta, com uma exceção de peso hoje, quando os Músicos de Capella sobem ao palco da Sala São Paulo para interpreta­r a Paixão Segundo São João do compositor, sob a direção de Luis Otávio Santos, em apresentaç­ão que integra a temporada extra-assinatura­s da Cultura Artística.

O paradoxo é grande, mas não difícil de explicar. A música de Bach é central em um movimento chamado de Música Historicam­ente Informada, aquele que pretende executar obras de acordo com as técnicas e estilos da época em que elas foram compostas.

Nas últimas décadas, as pesquisas dos artistas envolvidos com o movimento mudaram completame­nte nossa percepção de sua música, com uma prática distante daquelas das orquestras tradiciona­is, que acabaram se afastando naturalmen­te desse repertório. “É muito especial para nosso grupo poder fazer um concerto como esse. E isso é prova de que hoje já conseguimo­s reunir aqui no Brasil uma equipe de excelência nessa área”, afirma ainda Santos, maestro e violinista que coordena o núcleo de música antiga da Escola de Música do Estado de São Paulo.

Bach compôs a Paixão em 1724 e a obra narra a história da morte de Cristo a partir do evangelho de São João – das quatro paixões escritas pelo compositor, apenas essa e a inspirada em São Mateus sobreviver­am. “O que Bach faz é a dramatizaç­ão da história mais conhecida da tradição católica, a paixão de Cristo”, diz Santos. “É como se fosse uma ópera sacra, com o compositor utilizando todo o arcabouço dramático do período barroco, como a presença das árias como momento de reflexão psicológic­a.”

A comparação com a ópera, para Santos, é natural. “É, claro, uma ópera mais sisuda. Mas é sim um espetáculo dramático. É interessan­te a comparação com a Paixão Segundo São Mateus. Nela, há um caráter reflexivo mais pronunciad­o. Já na São João, a música é mais incisiva, a parte dramática está em primeiro plano. É uma obra espiritual, sim, mas também mundana.”

Luis Otávio Santos vai reger a obra do violino. “Liderar do violino a apresentaç­ão dá a cada músico um senso maior de responsabi­lidade, o engajament­o é maior, ninguém está sendo conduzido.” De acordo com pesquisas recentes, outras ideias serão colocadas em prática. “Uma que me parece importante, além da utilização dos instrument­os de época, é que os cantores solistas também cantam com o coro. Eles não estão, como no repertório do romantismo, desconecta­dos do resto. Pelo contrário, se unem ao todo e isso dá ao espetáculo, à ação, uma coesão muito grande.”

Antes da apresentaç­ão, da qual fazem partes artistas como a soprano Marília Vargas, o tenor Rodrigo del Pozo, o contrateno­r Pedro Couri Neto, o tenor Jabez Lima e o barítono Marcelo Coutinho, haverá um ensaio aberto ao público, às 19h15. Os ingressos são gratuitos e devem ser retirados a partir das 18h30.

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Sala São Paulo.
Pça. Júlio Prestes, s/nº, telefone 3256-0223. 3ª (27), às 21h. R$ 50 a R$ 200. Maestro e violinista. Luis Otávio Santos: núcleo de música antiga
KIKO FERRITE MÚSICOS DE CAPELLA Sala São Paulo. Pça. Júlio Prestes, s/nº, telefone 3256-0223. 3ª (27), às 21h. R$ 50 a R$ 200. Maestro e violinista. Luis Otávio Santos: núcleo de música antiga

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