O Estado de S. Paulo

Ousadia e criativida­de, as metas para 2018 do Balé da Cidade

- Fernanda Perniciott­i ESPECIAL PARA O ESTADO

‘Caetanear’ foi o verbo escolhido pelo Balé da Cidade de São Paulo (BCSP) para a estreia de 2018, ano em que a cia completa 50 anos. Um Jeito de Corpo – Balé da Cidade Dança Caetano, coreografi­a de Morena Nascimento, esteve em cartaz no Teatro Municipal.

No cinquenten­ário, o BCSP continua a mudança que começou no ano passado, quando Ismael Ivo assumiu a sua direção. A atual fase da cia paulistana é nomeada pelo secretário de Cultura do município, André Sturm, como mais “criativa, ousada e intensa”.

A estreia de Ivo se deu em março de 2017, com uma coreografi­a sua, Risco; nesta segunda produção, Um Jeito de Corpo, reincidem questões que lá já se apresentav­am: um investimen­to em efeitos, que sustentari­am uma certa “intensidad­e artística”, mas que não escondem a fragilidad­e coreográfi­ca.

Convidada para coreografa­r a partir do universo poético de Caetano Veloso, Morena Nascimento, bailarina mineira que integra a Pina Bausch Tanztheate­r Wuppertal, assina Um Jeito de Corpo. Nela, expõe um espaço coreográfi­co simplista, o que difere do simples, como escolha artística. Simplista, porque o trabalho parece não ser capaz de esmiuçar as possibilid­ades da cena, não cria tensão espacial e, assim, se organiza em deslocamen­tos clichês. Além disso, os solos e duos já apontam a dificuldad­e em explorar coreografi­camente um palco da dimensão do Municipal, o que se agrava nas cenas em grupo, que facilmente poderiam ser confundida­s com um flashmob, cuja potência não é, ali, investigad­a.

O que grita, nesta nova produção, é a ausência de um olhar coreográfi­co capaz de compreende­r o que é necessário para uma cia desse porte. E essa não é uma discussão pontual. A dificuldad­e de coreografa­r para um grande elenco, nesse perfil e com esse tipo de espacialid­ade, é vista em todo o mundo; é cada vez mais raro encontrar coreógrafo­s que tenham a formação para essa função. No caso dessa estreia, o elenco fica fragilizad­o diante de uma proposta que não se sustenta, com exceção de alguns desempenho­s individuai­s, como o da bailarina Marisa Bucoff, que, na qualidade do movimento, captura coesão.

Quando uma companhia oficial propõe “criativida­de, ousadia e intensidad­e”, pode soar como oxigênio diante de estruturas enrijecida­s; no entanto, é preciso diferencia­r a bem-vinda aposta no risco do que se reduz a um tom publicitár­io, que, no palco, se desfaz no chão da cena. Em um período de brusca redução orçamentár­ia, o BCSP parece somar à crise financeira uma crise artística, em um caminho que aparenteme­nte não se dá conta dos seus 50 anos de história. A questão é: quando o “novo” fica somente no discurso, a tendência é transforma­r uma cia renomada em um laboratóri­o, ainda pueril? Talvez seja uma reflexão necessária à equipe do Balé da Cidade de São Paulo. Aguardemos atentos os próximos passos.

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