Tesouro, confiança e juros
O Tesouro Nacional, um dos campeões de endividamento entre emergentes, se beneficia da redução de juros.
OTesouro Nacional, um dos campeões de endividamento na categoria dos emergentes, já se beneficia da redução de juros. Com dinheiro mais barato, tem sido possível baixar o custo médio da dívida federal e melhorar sua trajetória. A dívida continua em crescimento, naturalmente, e assim continuará enquanto o governo for incapaz de gerar superávit suficiente par apaga raconta anual de juros e, em seguida, amortizar o principal. Para isso será necessário um esforço considerável de ajustes e reformas. Quanto mais adiado e retardado esse esforço, tanto pior para as finanças públicas, para os programas de governo, para o crescimento econômico e para o bem-estar da maior parte dos brasileiros. Por enquanto, as boas notícias podem ser muito limitadas, mas sua mensagem mais importanteé bastante clara: a seriedade compensa e ninguém deveria levara sério as promessas de delícias sem custo do populismo.
A dívida pública federal atingiu R$ 3,53 trilhões, com crescimento nominal de 1,53% em um mês. O aumento decorreu da emissão líquida de R$ 28,51 bilhões e da apropriação de juros no valor de R$ 25,55 bilhões. Os novos títulos foram emitidos como custode 10,01% ao ano, o menor desde abril de 2010, quando a taxa média ficou em 9,79%.
Aparcela correspondenteà dívida mobiliária interna foi emitida com juros de 9,1% ao ano, os menores desde o início da série em dezembro de 2005. O custo médio de emissão da dívida mobiliária interna caiu pelo sétimo mês consecutivo. Há razões para esperar quedas adicionais do custo financeiro suportado pelo Tesouro.
Com a inflação abaixo das previsões, o Banco Central (BC) voltou a reduzir a taxa básica de juros, a Selic, na última reunião. Nessa ocasião, a taxa passou de 6,75% para 6,50% ao ano, um piso histórico. Ao anunciar esse corte, o Comitê de Política Monetária do BC, o Copom, indicou a possibilidade de uma nova diminuição em maio. Nesse caso, os juros básicos deverão chegar a 6,25%.
Os cortes da taxa básica foram iniciados em outubro de 2016, quando a Selic estava em 14,25%. Os juros atuais correspondem a menos de metade daqueles em vigor naquele momento. Os novos dirigentes do BC, nomeados depois do afastamento da presidente Dilma Rousseff, continuaram elevando a taxa durante algum tempo para derrubar com segurança a inflação. No começo daquele ano os preços ao consumidor acumulavam alta superior a 10% em 12 meses.
Essa alta refletia uma ampla desorganização da economia, com as contas públicas em frangalhos e sem perspectiva de recuperação, oferta de bens industriais comprometida pela recessão, contas externas em mau estado e insegurança disse- minada em todos os setores. O aperto monetário, iniciado na gestão anterior, continuou indispensável por algum tempo, mas o recuo da inflação é explicável também pelo início da política de arrumação fiscal. A nova atitude do governo favoreceu o ressurgimento da confiança no futuro da economia.
A ampla mudança no cenário de inflação e de juros, a partir daquele momento, reflete-se tanto nos custos quanto na composição da dívida. De janeiro para fevereiro a parcela com remuneração prefixada aumentou de 33,80% para 34,33%. A participação dos títulos corrigidos com base em índices de preços diminuiu de 30,17% para 29,66%. O resto corresponde essencialmente aos papéis com juros flutuantes. Os efeitos da inflação contida e ainda com perspectiva de baixa e dos juros diminuídos têm sido visíveis, há algum tempo, nas escolhas dos compradores de títulos federais.
A disposição dos financiadores do governo pode mudar, no entanto, se aumentarem as dúvidas quanto à continuidade dos ajustes e reformas. A advertência, formulada por técnicos do Tesouro, é quase redundante. Assim como as boas expectativas do mercado têm facilitado a gestão da dívida pública, a redução da confiança produzirá em pouco tempo o efeito oposto. Desnecessária para o mercado, a mensagem vale para os políticos e, muito especialmente, para os candidatos às eleições deste ano.