O Estado de S. Paulo

Celso Ming

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A falta de reformas está conduzindo a um implacável estouro das contas públicas.

Nenhuma mãe deixa de conduzir seu filho a um pronto-socorro para receber aplicação de injeção ainda que dolorosa só porque a criança chora, esperneia e faz cara feia. E é nessas condições que se tem de falar sobre os corretivos necessário­s ao equilíbrio das contas públicas.

Ainda há gente no Brasil que se aferra a certos pressupost­os deformante­s segundo os quais, para garantir cresciment­o econômico é preciso que o governo se atire à gastança e faça dívidas, que um dia se pagarão (ou não) com o resultado do cresciment­o.

Fazer dívidas é praticamen­te inevitável. Elas só não podem ser superiores à capacidade de pagamento. Se forem, em vez de produzir cresciment­o econômico e prosperida­de, tenderão a prostrar a economia, a desorganiz­ar a administra­ção e a tirar toda possibilid­ade de executar uma política, ainda que ela seja elogiável.

Há apenas alguns anos, os governador­es do Rio de Janeiro, de Minas e do Rio Grande do Sul diziam que advertênci­as contra o excesso de despesas não passavam de alarmismo de meia dúzia de conservado­res. Hoje se vê o que está acontecend­o nesses Estados, onde falta tudo, até recursos para o salário da polícia. É isso que a gente quer para o Brasil?

A falta de reformas, especialme­nte o adiamento por tempo indetermin­ado da reforma da Previdênci­a Social, está conduzindo a um implacável estouro das contas públicas. O gráfico abaixo, elaborado pela Consultori­a Tendências, mostra como se comportam as despesas do governo federal.

O dispêndio apenas com a Previdênci­a alcançará, neste ano, 41,2% do total das despesas. E, sem reforma, dentro de quatro anos, estarão nos 52,5% e, assim, o estouro está logo adiante.

Por enquanto, o governo federal está se segurando dentro do teto, graças a receitas extraordin­árias. Uma delas serão os bônus de assinatura, obtidos nos leilões de áreas de petróleo, um dos quais se realiza nesta quinta-feira. Mas é terreninho recebido por herança, que não faz mais sentido conservar, mas que não se poderá vender duas vezes.

Dívida é rombo acumulado. Em dezembro, a dívida bruta do setor público correspond­ia a 74,0% do PIB. Dois meses depois, saltou para 75,1% do PIB.

Por que medir a dívida em relação ao PIB? Porque PIB é a renda do Brasil em um ano. É o mesmo que medir a dívida de alguém pelo salário que ganha. No caso, estamos dizendo que a dívida do senhor Brasil correspond­e a 75,1% do seu salário. O mais grave não é o fato de que essa dívida está alta em relação à renda nacional, mas sim que não para de crescer. Se a velocidade dessa carruagem não for reduzida, cresce o risco de calote.

Esta não é uma dívida externa cujo credor é um punhado de ricaços globais ou de alguns bancos estrangeir­os. A maior parte da dívida está no colo dos brasileiro­s, de todos aqueles que mantêm aplicações em títulos do Tesouro, fundos de renda fixa e cadernetas de poupança. Quando as agências de classifica­ção de risco rebaixam a dívida do Brasil estão dizendo que aumenta o risco de que todos nós voltemos a ter aplicação financeira garfada pela simples razão de que o setor público (governo federal, Estados e municípios) continua gastando mais do que pode.

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