No show de Depeche Mode, um funeral sobre o fim do mundo
Banda inglesa voltou a São Paulo na terça, 27, após 24 anos, com críticas sociais e beats góticos
Com versos sobre a atualidade, Depeche Mode estabelece a conexão entre presente e passado. A primeira canção escolhida para a volta do grupo inglês a São Paulo, 24 anos depois da última passagem, trata do hoje. “We are not there yet / We have not evolved / We have no respect / We have lost control / We’re going backwards” (em tradução livre: “Não chegamos lá ainda /Não evoluímos /Não temos respeito/Perdemos o controle / Estamos seguindo para o passado”).
São versos de quem viveu o ontem, percebe o presente tão (ou mais) sombrio do que aqueles anos 1980, quando surgiram. Dave Gahan, aos 55 anos, está preocupado. Quando o momento atual repete o que ele já viveu, algo está muito errado. Assim, com a música Going Backwards, ele se expressa, com o disco Spirit, o mais recente do Depeche Mode, lançado no ano passado. E, dessa forma, o grupo inicia seu alerta. Soa sombrio, soa ‘funeralesco’, embriagado pelos sintetizadores e beats. O fim do mundo, para eles, não é ensolarado. E está próximo.
Numa progressão, como uma chaleira ao fogo, o trio, que no palco vira um quinteto, reestabelece a euforia oitentista, sem medo de soar datado. Martin Gore canta como o mundo precisa de amor, com Insight, mas o centro das atenções no palco é mesmo de Gahan. Com diferentes coletes, o vocalista enriquece a per- formance com sua entrega no palco bastante particular.
E, com isso, a banda revê sua história, que poderia ser trágica. Pouco depois da passagem pelo Brasil, em 1994, Gahan se afundou no vício de heroína e cocaína, teve uma overdose, e esteve morto por dois minutos, antes de ser ressuscitado e seguir para um tratamento de desintoxicação.
Por isso, a conexão entre presente e passado se faz de forma fácil no palco. Com dias sombrios deixados para trás, o Depeche Mode transita no tempo e espaço, ainda que permaneça no nosso presente, no Allianz Parque. E, nesse 2018, suas canções mais atuais, como Where’s the Revolution?, soam como um grito por mudanças, enquanto a safra antiga convida à dança. Os hits chegam, já na segunda metade da apresentação. Enjoy the Silence e Never Let Me Down Again encerram a apresentação. Uma versão acústica de Strangelove, no bis, pede pela reflexão, enquanto Walking In My Shoes, A Question of Time e Personal Jesus ligam os sapatos de dança dos 25 mil presentes no estádio. O funeral, ao fim, vira pista de dança. Se o fim do mundo vier, afinal, que ele chegue enquanto dançamos.