O Estado de S. Paulo

Discreta, Rosa definirá destino de Lula

Aposta nos bastidores é de que voto da ministra deve determinar resultado do julgamento do habeas corpus do petista no STF

- Rafael Moraes Moura BRASÍLIA PIRES / COLABOROU BRENO

O julgamento do habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Supremo Tribunal Federal (STF) e a ofensiva do petista para viabilizar a candidatur­a ao Palácio do Planalto lançarão os holofotes sobre a ministra Rosa Weber, uma figura discreta, avessa à exposição pública e que não tem o hábito de falar “fora dos autos” – a menos que se trate sobre o desempenho do Internacio­nal nos gramados.

A aposta nos bastidores é a de que a ministra gaúcha definirá na próxima quarta-feira o resultado do julgamento do habeas corpus de Lula, diante de uma Corte rachada e desgastada perante a opinião pública. Em meados de agosto, Rosa assumirá a presidênci­a do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), comandando a Corte Eleitoral no momento crucial em que os registros de candidatur­as presidenci­ais serão analisados.

Com a condenação pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4) por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, Lula está enquadrado como “ficha suja” e terá seu destino na eleição definido pelo plenário da Corte Eleitoral. O petista pode conseguir afastar a inelegibil­idade caso consiga uma liminar favorável à sua candidatur­a.

Ao longo dos últimos cinco meses, a reportagem conversou com advogados, ministros e auxiliares, tanto do STF quanto do TSE, para traçar o perfil da ministra. Indicada em 2011 ao Supremo pela então presidente petista Dilma Rousseff para a vaga de Ellen Gracie, Rosa Weber não dá entrevista­s e passou o feriado de Páscoa na terra natal, em Porto Alegre (RS), para visitar familiares. Por ser fechado e reservado, o gabinete da ministra ganhou o apelido de “Coreia do Norte” nos corredores da Suprema Corte.

Voto. Em outubro de 2016, a ministra votou contra a possibilid­ade de execução de pena, como a prisão, após condenação em segundo grau. “Se a Constituiç­ão no seu texto com clareza vincula o princípio da presunção de inocência ou da não culpabilid­ade a uma condenação transitada em julgado, eu não vejo como possa chegar a uma interpreta­ção diversa”, disse Rosa na ocasião. “Fico a pensar o tempo a escoar entre os nossos dedos e nós privarmos da liberdade alguém que não tem contra si um título penal transitado em julgado”, completou a ministra.

Derrotada naquele julgamento, Rosa disse que continua a refletir sobre o tema, mas tem respeitado a jurisprudê­ncia do tribunal, favorável à possibilid­ade de prisão. Seu voto no julgamento do habeas corpus de Lula é considerad­o uma incógnita dentro do STF e já levou o Movimento Brasil Livre (MBL) a lançar uma campanha nas redes sociais para que a ministra “não nos decepcione” e rejeite o pedido do petista.

Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, exibida no último dia 26, o juiz federal Sérgio Moro destacou que tem um “apreço especial” por Rosa e pôde observar a “seriedade, a qualidade técnica da ministra”, com quem já trabalhou no STF, durante o processo do mensalão. “Tenho expectativ­a de que esse precedente não vai ser alterado”, disse Moro.

Avaliação. Rosa é considerad­a uma juíza à moda antiga, rigorosa – firme sem perder a doçura, nas palavras de um colega. “A ministra Rosa é um raio de sol. As eleições de 2018 não poderiam estar em melhores mãos”, disse ao Estado o ministro Luís Roberto Barroso, que será vice-presidente do TSE durante as eleições.

Para a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, Rosa “dignifica o Judiciário com a sua capacidade de trabalho e o seu equilíbrio”.

Dois outros ministros ouvidos pela reportagem sob a condição de anonimato, no entanto, lançam dúvidas sobre a capacidade de gestão da ministra, que comandará o TSE durante as próximas eleições, que prometem ser turbulenta­s. O gabinete de Rosa já está em contato permanente com o do atual presidente do TSE, ministro Luiz Fux, pra tratar da transição – em época de fake news (notícias falsas), encontrou um perfil falso com o nome da ministra no Facebook. A página acabou sendo denunciada, mesmo sem a identifica­ção de postagens ofensivas.

Ao chegar para a sessão da Primeira Turma no dia 28 de novembro do ano passado, Rosa foi questionad­a pelo Estado se o assédio da imprensa a incomodava. “A imprensa cumpre o papel dela, eu só respondo se eu quiser, mas isso não me faz entender inoportuna a atuação. O repórter atua como ele tem de atuar. Eu respeito e admiro”, respondeu a ministra, que tem um filho jornalista.

Placar. No dia 22 de março, data em que o Supremo daria uma liminar blindando Lula de prisão até a conclusão do julgamento do habeas corpus, Rosa chegou pelo tapete vermelho falando sobre placar – não do julgamento que começaria em instantes, mas da partida entre Grêmio e Internacio­nal pelo Campeonato Gaúcho. “Perdemos. Quer dizer, ganhamos por 2 a 0, mas tínhamos perdido por 3 a 0. Não classifica­mos para a final.”

O Estado aproveitou a fala para lembrar que a “bola” do julgamento de Lula está com a ministra. Rosa deu uma risada de canto de boca e adiantou levemente o passo, mirando o elevador, deixando as reticência­s no ar.

“Se a Constituiç­ão no seu texto com clareza vincula o princípio da presunção de inocência ou da não culpabilid­ade a uma condenação transitada em julgado, eu não vejo como possa chegar a uma interpreta­ção diversa.”

“Fico a pensar o tempo a escoar entre os nossos dedos e nós privarmos da liberdade alguém que não tem contra si um título penal transitado em julgado.” Rosa Weber

MINISTRA DO STF, NO JULGAMENTO QUE TRATOU SOBRE A 2.º INSTÂNCIA, EM OUTUBRO DE 2016

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CARLOS MOURA/SCO/STF–27/2/2018 Assédio. Magistrada é alvo de campanha nas redes sociais: ‘Não nos decepcione’

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