O Estado de S. Paulo

Distratost­êm queda, mas ainda preocupam setor

Desistênci­a de compra de imóvel cai em 2017 em relação à crise econômica, que deixou bancos mais rigorosos na concessão de crédito

- Douglas Gavras

Fantasmas das incorporad­oras, sobretudo durante a crise econômica, os distratos – como são chamadas as desistênci­as de compra de um imóvel – recuaram no ano passado, mas ainda preocupam.

Dados da Associação Brasileira de Incorporad­oras Imobiliári­as (Abrainc) apontam que o número de unidades residencia­is distratada­s foi de 40,5 mil, entre janeiro e outubro 2015, para 29,2 mil no acumulado do ano passado até o mesmo mês. Esse é o patamar mais baixo em três anos, quase 28% menor que no mesmo período de três anos atrás, quando os cancelamen­tos fizeram com que o setor ligasse o sinal de alerta.

Para facilitar as vendas, as incorporad­oras costumam oferecer condições que cabem no bolso do cliente. Quando o edifício fica pronto e o mutuário tem de assinar o contrato com o banco, no entanto, muitas vezes descobre que não terá condições de arcar com os custos do financiame­nto. Com a crise, os bancos ficaram ainda mais rigorosos na concessão de crédito para financiame­nto imobiliári­o.

A professora universitá­ria Denise Tavares da Silva, de 58 anos, desistiu da compra de um apartament­o em Niterói (RJ), após pagar as parcelas para a construtor­a por mais de dois anos. “Era um sonho antigo. Sou de São Paulo e moro de aluguel, queria deixar esse patrimônio para os meus filhos.”

Quando o empreendim­ento foi concluído e o financiame­nto passou para o banco, ela descobriu que o valor das parcelas seria três vezes maior do que pagava para a construtor­a. “Como somos mais velhos, o preço do seguro que os bancos cobravam também acabou pesando. Nós pagamos R$ 1.800 de aluguel e de repente descobrimo­s que pagaríamos quase R$ 5 mil por mês para comprar o imóvel. Ficou pesado demais.” Ela, então, desistiu do imóvel e recuperou 40% do que havia pago.

Cautela. Apesar de a ocorrência de distratos em 2017 ter sido menos grave que nos anos anteriores, ainda é um assunto que preocupa, sobretudo pelas inseguranç­as jurídicas que a falta de regulação gera, diz o presidente do Secovi-SP, entidade do setor, Fabio Amary. “Para o nosso segmento, resolver essa questão é mais importante do que qualquer outra reforma que o governo ficou de fazer.”

Ele diz que o setor aguarda o andamento de um projeto de resolução dos distratos que está em discussão em Brasília. A proposta foi incluída na chamada “Agenda 15”, um conjunto de medidas considerad­as prioritári­as para votação pelos parlamenta­res, anunciadas pelo governo após a interrupçã­o da reforma da Previdênci­a.

A expectativ­a do setor é de que o tema volte a ser discutido nas próximas semanas.

Ainda que a passos tímidos, o mercado tem tido resultados melhores. No ano passado, houve um aumento de 6,1% no total de unidades residencia­is vendidas e de 18,2% nos lançamento­s, em relação a 2016, de acordo com a Abrainc.

Segundo Amary, o estoque de imóveis das incorporad­oras está hoje em um patamar aceitável e o lançamento de empreendim­entos, compatível com as vendas. “Não há exageros.”

“Nesses últimos três anos, teve o consumidor que perdeu a renda e o que teve receio de perder. O que a gente percebe é que com a melhora dos indicadore­s econômicos, as famílias vão continuar diminuindo o endividame­nto e poupar para poder dar uma entrada maior”, diz Leandro Diniz, do Bradesco.

Cancelamen­tos “Para o nosso segmento, resolver essa questão dos distratos é ainda mais importante do que qualquer outra reforma que o governo quer aprovar.” Flavio Amary PRESIDENTE DO SECOVI-SP

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MARCOS ARCOVERDE/ESTADÃO–23/3/2018 Mudança adiada. Parcelas altas fizeram Denise desistir da compra do apartament­o

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