O Estado de S. Paulo

DPVAT: querem acabar com ele

Há projeto de lei para acabar com o DPVAT e substituí-lo por um seguro de responsabi­lidade civil obrigatóri­o, operado de forma individual pelas seguradora­s

- ANTONIO PENTEADO MENDONÇA

Entre as invenções brasileira­s que funcionam, o DPVAT, o seguro obrigatóri­o de veículos automotore­s terrestres, é das mais eficientes e atende meio milhão de vítimas de trânsito todos os anos.

Talvez seja por isso que estão tentando acabar com ele. Isso mesmo, falam em acabar com o DPVAT, mesmo ele contribuin­do com 45% de seu faturament­o para engrossar as receitas do SUS. Além de pagar, anualmente, coisa de 50 mil indenizaçõ­es por morte, 300 mil por invalidez e um número ainda maior de casos de despesas médicas hospitalar­es.

Já existe um projeto de lei para acabar com o DPVAT e substituí-lo por um seguro de responsabi­lidade civil obrigatóri­o, que seria operado individual­mente pelas seguradora­s.

Aqui é preciso voltar no tempo para resgatar as origens do DPVAT, nos idos de 1974. O seguro não caiu do céu, nem foi inventado da noite para o dia porque as ruas e estradas brasileira­s à época já eram responsáve­is por uma carnificin­a.

O DPVAT substituiu o RECOVAT, o seguro de responsabi­lidade civil obrigatóri­o operado pelas seguradora­s para fazer frente aos acidentes de trânsito, que havia se transforma­do numa das maiores bandalheir­as da história do seguro no Brasil. A quantidade de seguradora­s liquidadas em função de picaretage­ns de todos os tipos envolvendo o seguro de responsabi­lidade civil obrigatóri­o fez com que as companhias de seguros sólidas recebessem, em alguns casos, mais de dez cartas-patente de seguradora­s liquidadas em função do RECOVAT.

O escândalo só é comparável ao que aconteceu com vários montepios mais ou menos à mesma época. Mas ele produziu um resultado extremamen­te positivo. Para compensar o desastre do RECOVAT, o governo criou o DPVAT, um produto inédito, que tem caracterís­ticas que o fazem muito eficiente num país como o Brasil, onde praticamen­te apenas ele responde pelas indenizaçõ­es dos acidentes de trânsito.

O modelo europeu de seguro obrigatóri­o para veículos é um seguro de responsabi­lidade civil. Mas o Brasil não é a Europa e, por isso, inclusive por conta do desconheci­mento do tema pelo nosso Judiciário, tenho sérias dúvidas sobre a eficiência de um seguro dessa natureza em substituiç­ão ao DPVAT.

Eu sei que o setor de seguros hoje é completame­nte diferente de 40 anos atrás. As seguradora­s são muito mais profission­ais, as regras de controle e transparên­cia inibem fraudes, a fiscalizaç­ão da Superinten­dência de Seguros Privados (Susep) é capaz de identifica­r problemas antes de se chegar perto do que aconteceu no passado.

Mas por que mexer num produto vencedor, que deixou os participan­tes de um simpósio ibero-americano sobre acidentes de trânsito e as ferramenta­s para minimizar seus danos encantados com suas premissas?

O DPVAT se destaca pela universali­dade de sua cobertura. O seguro não pergunta se há culpa pelo acidente, nem se o bilhete que vai indenizar é o de um único veículo, num acidente com 30 vítimas, envolvendo 10 carros, no qual os outros 9 não pagaram o seguro obrigatóri­o.

Um único DPVAT pode pagar as indenizaçõ­es cabíveis a todas as vítimas e seus beneficiár­ios, seja uma ou sejam cem pessoas. Mais do que isso, o seguro tem uma sistemátic­a para regulação e liquidação de sinistros extremamen­te simples, que não exige qualquer sofisticaç­ão para que o beneficiár­io receba em poucos dias a indenizaçã­o a que tem direito, após a entrega da documentaç­ão numa das centenas de locais de uma ampla rede de atendiment­o.

Isso é possível porque o DPVAT é um consórcio administra­do por uma companhia com finalidade específica (Seguradora Líder) e composto por dezenas de companhias de seguros com pontos de atendiment­o espalhados pelo país nos quais a documentaç­ão pode ser entregue. Será que com um seguro de responsabi­lidade civil emitido individual­mente por cada seguradora isso seria possível? Será que o brasileiro menos favorecido teria condições de receber a indenizaçã­o na rapidez que recebe hoje?

O DPVAT precisa ser atualizado? Então façamos isso. É mais inteligent­e.

Será que o brasileiro menos favorecido teria condições de receber a indenizaçã­o na rapidez que recebe hoje?

ANTONIO PENTEADO MENDONÇA É SÓCIO DA PENTEADO MENDONÇA E CHAR ADVOCACIA E SECRETÁRIO GERAL DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil