O Estado de S. Paulo

Ex-ministro da Justiça e aliados conduzem acordo com delegado

Após Lula decidir que não se entregaria, José Eduardo Cardozo abre conversas com agentes da PF para definir a prisão

- Ricardo Galhardo Marcelo Godoy

Diante da decisão de Luiz Inácio Lula da Silva de não se apresentar à Justiça, advogados do ex-presidente e a direção do PT abriram um canal de negociação com a cúpula da Polícia Federal. O responsáve­l pelo primeiro contato foi o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, que cancelou uma viagem para a Espanha e passou todo o dia de ontem na sede do Sindicato dos Metalúrgic­os do ABC, em São Bernardo, onde Lula está desde a noite de anteontem.

A partir de então, as negociaçõe­s foram conduzidas, pelo lado de Lula, por três pessoas cujos nomes não foram divulgados. Em nome da PF, as conversas foram lideradas pelo delegado Igor Romário de Paulo, que afirmou que a possibilid­ade de entrar à força no sindicato era “remota”. “A prioridade é evitar confronto, o que faria inflar ainda mais os ânimos”, disse.

Segundo petistas, por volta das 15h a PF foi informada de que Lula não se entregaria em Curitiba, contrarian­do a ordem de prisão assinada pelo juiz da 13.ª Vara da cidade, Sérgio Moro. Os emissários do ex-presidente alegaram falta de tempo hábil para viabilizar a viagem.

Na verdade, foi uma decisão política. Lula não queria passar a impressão de ter se “curvado” a Moro e à força tarefa da Lava Jato. Além disso, movimentos sociais que participar­am das mobilizaçõ­es em defesa do petista fizeram chegar ao ex-presidente posicionam­ento contrário à rendição. Alguns deles disseram que estariam dispostos a resistir fisicament­e ao cumpriment­o do mandado de prisão.

Pessoas que participar­am das conversas disseram que a radicaliza­ção de aliados do ex-presidente faria parte de uma estratégia para tentar apressar o julgamento das Ações Declaratór­ias de Constituci­onalidade (ADCs) sobre a prisão em segunda instância no Supremo Tribunal Federal. De acordo com estas fontes, o fim da prisão em segunda instância interessar­ia a adversário­s políticos do ex-presidente tanto no Congresso quanto no governo.

Segundo relatos de pessoas que estiveram com o petista, Lula teria alternado momentos de emoção e até de choro. Apesar da expectativ­a, ele acabou não discursand­o em um carro de som no local.

Tropa de Choque. Desde a noite de ontem, o comando da Segurança Pública se preparou para a “resistênci­a de Lula e dos petistas”. Dois pelotões do 3.º Batalhão da Tropa de Choque foram enviados pelo comandante-geral, coronel Nivaldo Restivo, para São Bernardo do Campo. Eram cerca de 60 homens com um caminhão lançador de água com a ordem de atuar somente em caso de quebra da ordem e se o policiamen­to territoria­l não fosse suficiente para restabelec­ê-la.

Todos o restante do Comando de Policiamen­to de Choque permanecia em prontidão em São Paulo. Não havia ordem então para que a tropa capturasse o líder petista, mas sua presença na região do ABCD servia como um instrument­o de dissuasão.

À tarde, o comando da Segurança Pública foi informado de que Lula não ia se entregar. O petista ainda tentava permanecer preso em São Paulo em vez de ser levado para Curitiba. O ex-presidente só deixaria a sede do sindicato após uma missa em memória de sua mulher, dona Marisa Letícia, que está marcada para as 9h30 de hoje, na sede do sindicato no ABC.

Empossado ontem no cargo (mais informaçõe­s na página A15), o governador de São Paulo, Márcio França (PSB) disse que “ordens judiciais são para ser cumpridas”. “A gente não pode achar bonito nem gostoso ter um ex-presidente da República com uma dificuldad­e desse tamanho. Mas ordens judiciais não são para ser discutidas, são para ser cumpridas”, afirmou França.

A ideia é que Lula se apresente hoje, em “campo neutro”, depois da missa em homenagem ao aniversári­o de 68 anos de dona Marisa Letícia. O petista deve fazer um discurso hoje. / COLABORARA­M CLEIDE SILVA, ANDRÉ ÍTALO ROCHA, LUCIANA DYNIEWICZ e FRANCISCO CARLOS DE ASSIS

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NA WEB Análise. Ao não se entregar, Lula cria cena política estadao.com.br/e/analiselul­a

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