O Estado de S. Paulo

Brasil estuda abrir processo na OMC contra barreiras chinesas ao açúcar

Agronegóci­o. Salvaguard­as impostas pela China reduziram exportaçõe­s brasileira­s de 2,5 milhões de toneladas para cerca de 300 mil toneladas ao ano: preferênci­a ainda é por solução negociada, mas tensões globais no comércio podem prejudicar conversas

- Lu Aiko Otta / BRASÍLIA

O governo brasileiro estuda entrar na Organizaçã­o Mundial do Comércio (OMC) contra as salvaguard­as que a China aplicou no ano passado sobre o açúcar brasileiro, uma medida que reduziu drasticame­nte suas importaçõe­s do produto. Porém, embora considere ter bases fortes para o recurso, ainda não bateu o martelo se vai mesmo iniciar um processo no organismo internacio­nal. Com o aumento da tensão entre EUA e China no campo comercial nos últimos dias, haverá uma dose adicional de cautela, admite um integrante do governo.

Até 2016, o Brasil era o maior fornecedor de açúcar para a China, que por sua vez era o principal destino das exportaçõe­s de açúcar bruto produzido aqui. As vendas totalizava­m perto de 2,5 milhões de toneladas ao ano, pouco menos de 10% das exportaçõe­s totais do País – o açúcar brasileiro era competitiv­o mesmo pagando, na maior parte, alíquota de 50% para ingressar naquele mercado.

Em 2017, porém, os chineses elevaram essa tarifa para 95%, o que fez as exportaçõe­s brasileira­s caírem para cerca de 300 mil toneladas. O aumento da tarifa foi feito com base numa salvaguard­a, mecanismo previsto na legislação internacio­nal. Ele pode ser aplicado quando se combinam três fatores: um surto de importaçõe­s, a indústria local ser prejudicad­a e haver uma relação direta de causa e consequênc­ia entre as duas coisas.

Mas as bases da aplicação da medida são frágeis, segundo afirmou o diretor executivo da União da Indústria de Cana de Açúcar (Unica), Eduardo Leão de Sousa. Com base no histórico de volumes embarcados entre 2016 e 2018, a Unica sustenta que não houve o surto de importaçõe­s alegado pela China. Os volumes estão mais ou menos no mesmo patamar desde 2011, mostram os números.

Apesar da possibilid­ade de uma ação na OMC, a preferênci­a, tanto do governo quanto do setor privado, ainda é por uma solução negociada. Isso porque as discussões no organismo de comércio são demoradas e caras. Mas há quem duvide da efetividad­e de uma negociação nesse momento justamente por causa da disputa entre China e EUA. A escalada de medidas de restrição comercial cria um ambiente onde prevalece a lei do mais forte, e não o diálogo.

Em busca de um entendimen­to, o ministro da Agricultur­a, Blairo Maggi, informou ao Estado que negociará o comércio de açúcar durante sua visita à China, em maio. Pelo lado privado, Sousa, da Unica, esteve na China no mês passado. Ofereceu às empresas locais cooperação técnica em troca da reabertura do mercado nas condições que havia antes da salvaguard­a.

Segundo Sousa, a abertura de um processo na OMC pode servir para forçar uma negociação, a exemplo do que ocorreu com a Tailândia: em janeiro, o país eliminou medidas de controle sobre o açúcar para evitar uma disputa com o Brasil. A decisão sobre iniciar ou não um processo na OMC encontra-se nesse momento em análise nos escalões técnicos do governo.

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