Militantes radicais tentam impedir saída de ex-presidente do sindicato
Aos gritos de ‘cercar, sentar e não deixar prender’, eles fecham os portões do prédio; petista teve de sair a pé
Houve muita tensão e resistência no momento em que o expresidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado na Operação Lava Jato, se entregou a agentes da Polícia Federal. Aos gritos de “cercar, sentar e não deixar prender”, um grupo de manifestantes se postou diante dos portões do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, com a intenção de impedir a saída do petista. Uma parte da grade chegou a ser quebrada pelo grupo. Sem conseguir deixar o local de carro, Lula teve de passar a pé no meio da multidão, cercado por seguranças e auxiliares, e atravessar uma viela até alcançar o comboio montado pela PF.
A primeira tentativa de deixar o sindicato, onde Lula estava desde a quinta-feira, aconteceu por volta das 17h. Ele e seu advogado Cristiano Zanin Martins entraram num carro cor prata, mas o veículo nem saiu do lugar, diante da resistência dos manifestantes. Lula teve de deixar o veículo e entrar outra vez no prédio.
Integrantes do grupo político responsável pela mobilização na frente do Sindicato dos Metalúrgicos admitiram que a estratégia de radicalizar a resistência na rua para forçar uma negociação por parte da PF saiu de controle. Segundo estas fontes, um grupo decidiu por conta própria que não aceitaria a rendição de Lula, ignorando os apelos do grupo mais próximo do ex-presidente.
Sindicalistas e líderes petistas tentaram negociar com os “rebeldes”. A presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann, usou um carro de som – o mesmo onde, mais cedo, Lula fez um discurso – para se dirigir aos manifestantes.
“A consequência (do bloqueio) pode ser para nós, que a polícia venha aqui dar paulada na gente. O fato é que a consequência para Lula, do ponto de vista jurídico, é alta. A Polícia Federal deu meia hora para a gente resolver essa situação”, disse ela, por volta das 18h.
A possibilidade de Moro expedir uma ordem de prisão preventiva para Lula era uma preocupação concreta dos petistas. Segundo João Paulo Rodrigues, da coordenação nacional do Movimento dos Sem Terra (MST), os discursos feitos no carro de som para tentar desbloquear as saídas do sindicato tinham como destinatário o juiz federal Sérgio Moro.
“A gente falou mais para o Moro. Não era falar de enrolação”, disse Rodrigues. A chance para Lula deixar o local apareceu, justamente, quando parte dos manifestantes saiu da frente do portão para acompanhar os discursos.
O impasse foi monitorado pelo comando da Segurança Pública de São Paulo. O secretário da pasta, Mágino Alves Barbosa Filho, conversou com o comando da PM, que preferiu acompanhar a distância a confusão – a tropa de choque estava de prontidão em São Paulo, mas a PM entendia que a captura de Lula era um problema da PF.
A ordem do comandante-geral, Nivaldo Restivo, era para que a tropa só fosse usada em caso de grave ruptura da ordem. Não era, até então, o quadro relatado pelos agentes. Eles informavam a cúpula que o impasse era culpa de grupos radicais. Lula, de acordo com os informes dos agentes, queria sair, mas tinha a saída bloqueada.
Também houve confronto na chegada do ex-presidente à Superintendência da PF em Curitiba, por volta das 22h30, onde ele ocupará uma sala adaptada. A Polícia Militar teve de dispersar manifestantes pró-Lula que queriam ficar próximos da entrada do prédio. No final, oito pessoas ficaram feridas, sendo que três delas foram levadas para hospitais da região.
Ato religioso. Mais cedo, ainda em São Bernardo, Lula usou uma cerimônia religiosa em homenagem à ex-primeira-dama Marisa Letícia (que completaria 68 anos ontem) para fazer o que seria seu último discurso antes da prisão. Ele manteve a linha de enfrentamento ao Judiciário e à imprensa adotada desde que se tornou alvo da Lava Jato. Ao admitir que cumpriria a ordem de prisão, reafirmou que, apesar disso, continua na disputa eleitoral e que vai sair da situação “mais forte, mais verdadeiro, e inocente (mais informações na pág. A6)”. /