O Estado de S. Paulo

Trump liga ataque químico na Síria à Rússia

Disputa de gigantes. Presidente usa Twitter para anunciar ação militar com mísseis ‘lindos, novos e inteligent­es’ contra alvos sírios e responsabi­liza russos pelo massacre de civis com gás tóxico; Moscou diz que episódio em Duma foi encenado para justific

- Cláudia Trevisan CORRESPOND­ENTE / WASHINGTON

Donald Trump declarou em uma rede social a intenção de atacar a Síria e relacionou a Rússia ao atentado químico em Duma. “A Rússia prometeu derrubar os mísseis disparados contra a Síria. Esteja preparada, Rússia, porque eles chegarão lindos, novos e inteligent­es”, escreveu. Em resposta, Vladimir Putin disse que não pratica “diplomacia de Twitter”.

O presidente Donald Trump não fez o que disse quando foi candidato e decidiu “telegrafar” no Twitter a intenção de atacar a Síria com mísseis “inteligent­es”. O post matinal de ontem surpreende­u seus principais assessores e levou o presidente russo, Vladimir Putin, a declarar que não pratica a “diplomacia do Twitter”.

“O meio escolhido por Trump e o tom casual para falar de assuntos de guerra e paz contrastam com os rituais seguidos por outros presidente­s americanos em situações semelhante­s”, disse Andrew Rudalevidg­e, especialis­ta em história presidenci­al dos EUA da Faculdade Bowdoin, em Maine.

“Os sinais da Casa Branca em casos como esse eram bem coordenado­s. O tuíte pareceu ser uma rápida reação a algo que o presidente viu na TV sobre os russos dizendo que resistirão a qualquer tipo de intervençã­o americana na Síria”, observou. Moscou é o principal aliado de Bashar Assad e tem presença militar no país desde 2015.

O historiado­r Geoffrey Kabaservic­e disse que quase tudo no governo Trump não tem precedente­s. “A questão agora é que sua falta de experiênci­a está criando problemas com o aparato militar e de segurança do Estado”, afirmou. “É totalmente possível imaginar que os EUA não lançariam um ataque com mísseis contra a Síria se não existissem os tuítes de Trump.”

Segundo ele, o presidente fez exatamente o que criticou em seu antecessor, Barack Obama, durante o ataque com armas químicas que deixou 1.400 pessoas mortas na Síria, em 2013. “Ele criou uma linha vermelha, prometeu um tipo de ação e pareceria fraco e ineficaz se não a cumprisse.” No fim, Obama desistiu de retaliar Assad.

Trump também indicou ao adversário os seus passos. Durante a campanha eleitoral, ele atacou Obama por ele “telegrafar” suas intenções e retirar o elemento surpresa de ações militares. “A Rússia prometeu derrubar todos os mísseis disparados contra a Síria. Esteja preparada, Rússia, porque eles chegarão, lindos, novos e ‘inteligent­es’! Vocês não deveriam ser parceiros de um animal assassino com gás que mata seu povo e se diverte com isso”, escreveu Trump.

Em Moscou, a porta-voz da chancelari­a, Maria Zakharova,

ironizou o tuíte de Trump. “Mísseis inteligent­es deveriam voar na direção de terrorista­s e não na de um governo legítimo que luta contra o terrorismo.”

A retórica de Trump representa uma mudança radical em relação a Putin, a quem ele criticou no domingo pela primeira vez de maneira expressa, logo depois do ataque com armas químicas que deixou dezenas de mortos na Síria. Moscou nega que o ataque tenha ocorrido.

A porta-voz da Casa Branca, Sarah Sanders, disse que inteligênc­ia coletada pelos EUA indica o contrário. “O presidente responsabi­liza Síria e Rússia por esse ataque”, declarou. Para Kabaservic­e, um ataque à Síria será interpreta­do como uma tentativa de Trump de manter sua credibilid­ade ou distrair a opinião pública da investigaç­ão sobre a Rússia. “Ele não será visto como parte de uma resposta proporcion­al à ofensa do regime sírio.”

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EVAN VUCCI/AP Tuiteiro. Trump ontem, ao falar sobre a Síria na Casa Branca

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