O Estado de S. Paulo

Vacina contra a dengue atrasa e fica para 2019

Saúde. Primeira previsão para imunizante feita pelo governo do Estado era 2017 e incluía construção de fábrica para a produção das doses. Iniciado há dez anos, o trabalho paulista esbarrou nos poucos registros, que impedem comprovaçã­o de eficácia do produ

- Paula Felix Fabiana Cambricoli

Prometida pelo então governador Geraldo Alckmin (PSDB) para 2017, a vacina contra a dengue ainda está em teste e deve ficar para 2019. A queda no número de casos atrasou os estudos, de acordo com o Instituto Butantã.

Prometida pelo então governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB) para 2017, a vacina que está sendo desenvolvi­da pelo Instituto Butantã continua em fase de testes sem que sua eficácia tenha sido confirmada na última e mais importante etapa da pesquisa. A queda do número de casos da doença no País impediu a aplicação do imunizante nos grupos voluntário­s, atrasando o estudo.

A promessa do governo do Estado previa ainda a construção de uma fábrica para a produção das doses, que deveria estar pronta no fim do ano passado, mas que também não foi concluída na data estimada. Agora, a nova previsão é para 2019.

A vacina do Butantã foi anunciada em 2015 como a opção mais promissora para proteção contra a dengue, em um momento em que a doença batia recordes de casos e mortes no Estado de São Paulo e no País. Naquele ano, mais de 1,6 milhão de pessoas entraram para o balanço de casos suspeitos de infecção.

Alckmin, que já era uma aposta como presidenci­ável, pediu prioridade à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) na aprovação do início dos testes da fase 3 e viajou para várias cidades brasileira­s para acompanhar o trabalho dos pesquisado­res. O então governador esteve em pelo menos 5 dos 16 centros de pesquisa da vacina: Recife (PE), Cuiabá (MT), Porto Alegre (RS), Campo Grande (MS) e São José do Rio Preto (SP).

Já a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) esteve em São Paulo, em fevereiro de 2016, para anunciar verbas federais para financiar a última fase de pesquisas. Na ocasião, destacou que o Brasil dava um passo importante no desenvolvi­mento daquele que poderia ser o primeiro imunizante contra a dengue do mundo de alta eficácia.

Os testes da vacina do Butantã, no entanto, não evoluíram como anunciado. Iniciada há dez anos, a pesquisa recebeu, em 2015, a autorizaçã­o para a fase 3, após ser avaliada “em regime de prioridade” pela Anvisa, antes mesmo que os testes da fase 2 tivessem sido finalizado­s. A autorizaçã­o foi dada em dezembro daquele ano e os testes começaram, efetivamen­te, em 2016.

Exposição menor. Segundo o Butantã, a queda de casos de dengue no País observada nos anos seguintes atrasou a pesquisa porque os participan­tes do estudo ficaram menos expostos à doença. “A ocorrência de dengue no País está extremamen­te baixa, completame­nte diferente do que foi anos atrás. Isso faz com que não consigamos comprovar eficácia. Temos coletados, até o momento, os dados de segurança e todas as análises, mas a dengue ocorre em picos e tem períodos com

Alexander Precioso

maior incidência de casos”, explica Alexander Precioso, diretor do Laboratóri­o Especial de Ensaios Clínicos e Farmacovig­ilância do Instituto Butantã.

A informação de que a vacina começaria a ser distribuíd­a em 2018 chegou a ser divulgada pela gestão estadual. O pesquisado­r nega que tenha havido precipitaç­ão nas datas anunciadas pelos governante­s. “Se pegar os dados de 2014 a 2016, a incidência era muito alta, particular­mente em 2015.”

O diretor afirma que, se o número de casos voltar a crescer no próximo verão, é possível que a eficácia da vacina consiga ser testada. Em nota, o instituto disse que está trabalhand­o para que adultos comecem a receber as doses em 2019.

A predominân­cia de circulação de um dos quatro sorotipos da dengue também teria interferid­o no processo. Isso porque, segundo Ricardo Palacios, gerente de Pesquisa e Desenvolvi­mento Clínico do Instituto, quando um sorotipo está circulando há mais tempo, o número de casos cai porque muitas pessoas já foram infectadas e ficaram imunes à doença. Quando muda o sorotipo, há um pico de casos porque há mais pessoas suscetívei­s àquele tipo. Como o sorotipo 1 continuou predominan­te, não houve o pico.

Atualmente, a vacina está sendo testada em voluntário­s de três grupos etários: 2 a 6 anos, 7 a 17 anos e 18 a 59 anos – esta última faixa foi a primeira a recrutar voluntário­s e já alcançou o número suficiente de participan­tes. Não será necessário alcançar os resultados de eficácia nos três grupos para fazer o pedido de registro. “Podemos solicitar o registro em qualquer momento para o grupo com informação de segurança e eficácia”, destaca Palacios.

“Sempre coloquei que isso (prazo) é uma informação difícil de dizer, porque depende da epidemiolo­gia do vírus.” Sem previsão

DIRETOR DO INSTITUTO BUTANTÃ

Prazos. Para especialis­tas em pesquisa, o tempo entre a fase 3 e obtenção do registro costuma ser de pelo menos três anos. “Consideran­do a fase 3 especifica­mente da vacina da dengue, devem ser apresentad­os dados de eficácia e segurança de pelo menos dois anos”, diz Alessandra Paixão Dias, gerente-geral substituta de Medicament­os e Produtos Biológicos da Anvisa.

Diretor do Núcleo de Estudos e Publicaçõe­s da Sociedade Brasileira de Dengue e Arbovirose­s, Marco Aurélio Sáfadi diz que o desenvolvi­mento e a produção de uma vacina são sempre um desafio, além do fato de o vírus da dengue ser complexo. “Como a doença é imprevisív­el, podemos ter uma nova explosão de casos no ano que vem.”

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NILTON FUKUDA/ESTADÃO-21/10/2015 Butantã. Instituto ainda busca voluntário­s entre 2 e 59 anos para realização de testes; predominân­cia de um sorotipo também influencio­u os resultados

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