O Estado de S. Paulo

Guerra sem sentido

- E-MAIL: JOAODOMING­OS56@GMAIL.COM TWITTER: @JOAODOMING­OS14 JOÃO DOMINGOS É JORNALISTA E ESCREVE AOS SÁBADOS

Apressão que o PT e o Palácio do Planalto fazem para que o Supremo Tribunal Federal (STF) reexamine e revogue a jurisprudê­ncia que permite a prisão depois da condenação em segunda instância pode levar a uma guerra entre os poderes que não será benéfica para ninguém. Porque armas todo mundo tem. O risco maior é de que, em vez de se ferirem na batalha, venham os contendore­s ferir o estado democrátic­o de direito e os pilares de sustentaçã­o da democracia.

Num momento em que todos parecem desnortead­os pelo agravament­o da crise política, o que o País mais precisa é de diálogo para um projeto de salvação nacional. Um diálogo que ninguém até agora parece querer iniciar.

Veja-se o exemplo dado pelo deputado Wadih Damous (RJ), do PT. Ex-presidente da OAB do Rio, mestre em Direito Constituci­onal, Damous tem qualificaç­ões e conhecimen­tos para sugerir conversaçõ­es que tentem tirar o País da crise. Mas o que ele fez, ontem, foi aumentar a tensão. Num vídeo divulgado nas redes sociais, ele atacou o ministro Luís Roberto Barroso: “Segurament­e é o pior ministro do Supremo Tribunal Federal dos últimos tempos. É um mal para a democracia, é um mal para o Direito, é um mal para o Supremo, é um mal para o povo brasileiro”. Após afirmar que Barroso diz “idiotices” como a de que o STF já está separando o joio do trigo, mas muitos insistem no joio, ele acusou o ministro de ter ajudado a colocar Lula atrás das grades. E fez uma sugestão radical, que nem a ditadura militar fez: “Tem que fechar o Supremo Tribunal Federal”. Em seguida, acrescento­u que é preciso criar uma Corte Constituci­onal de guarda exclusiva da Constituiç­ão, com seus membros detentores de mandato. Prosseguiu, em tom de ameaça: “Nós temos que evitar que gente como Roberto Barroso tenha o poder de ditar os rumos do processo eleitoral, de ditar os rumos da escolha popular, de ditar os rumos da democracia brasileira. Não foi para isso que essa turma foi colocada lá. Eu tenho alertado lá na Câmara, ou nós enquadramo­s essa turma, ou essa turma vai enterrar de vez a democracia brasileira”.

Imediatame­nte depois da divulgação do vídeo de Damous, a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, deu o troco e mostrou as armas de que a Suprema Corte dispõe. Ela anunciou para o dia 2 de maio o reinício do julgamento da ação que restringe o foro privilegia­do de deputados e senadores a fatos ocorridos em função do mandato. Oito ministros já votaram a favor da ação, que foi suspensa por um pedido de vistas do ministro Dias Toffoli, que acatou sugestão do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para dar tempo de o próprio Legislativ­o tomar uma decisão que diz respeito a seu funcioname­nto. Toffoli atendeu à sugestão de diálogo feita por Maia e parou o julgamento no meio. Mas o Congresso não avançou na proposta. Cármen Lúcia aguardou o momento de maior pressão sobre a Corte para revidar e marcar o restante da votação para daqui a pouco mais de 15 dias.

Há cerca de três anos, quando se consolidou a Operação Lava Jato e apareceram os primeiros sinais de que alguns dos presos, presos importante­s, como Alberto Youssef e Paulo Roberto Costa, poderiam fazer acordo de delação premiada, já se falava muito na costura de um grande acordo entre todos os partidos políticos, independen­temente de serem ou não adversário­s. A ideia era evitar que deputados, senadores, governador­es, ministros e dirigentes partidário­s fossem alvo de inquéritos destinados a apurar corrupção nas estatais.

Dizia-se, na época, que o Congresso cairia, que o governo cairia, que todos cairiam se nada fosse feito. Sabia-se que a Lava Jato chegaria longe. Não tão longe quanto chegou. Como já mandou um ex-presidente para a cadeia, todos se sentem ameaçados. Daí, a guerra entre os Poderes. Uma guerra que só terá perdedores.

O que o País mais precisa é de diálogo para um projeto de salvação nacional

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