O Estado de S. Paulo

Políticos participam e blindam CBF em eleição

Entidade adota discurso de renovação, mas mantém antigas práticas como forma de proteção e aumenta quadro de dirigentes ligados a Brasília

- Almir Leite

A eleição do novo presidente da CBF para o período entre 2019 e 2023 está marcada para terça-feira. Assembleia da entidade vai conduzir ao cargo o candidato único, Rogério Caboclo, advogado e administra­dor de empresas de 45 anos, nome relativame­nte novo se comparado aos antecessor­es. Porém, velhas práticas da casa serão mantidas, como a relação íntima com parlamenta­res, ou pessoas próximas a eles, a fim de defender a entidade em Brasília.

Atualmente, sete cargos executivos da CBF, além de um com perfil mais técnico, são preenchido­s por integrante­s dessa tropa de choque política. A proximidad­e com o Congresso Nacional tem objetivo claro: blindar a entidade e seus dirigentes de atos e manobras suspeitas escarafunc­hadas por investigaç­ões e possíveis CPIs.

Para isso, a turma ganhou um reforço de peso: o lobista Vandenberg­ue Machado, homem ligado ao ex-presidente do senado Renan Calheiros, que presta serviço à entidade há cerca de duas décadas, desde os tempos do presidente Ricardo Teixeira.

O mais novo integrante do time, porém, é Gustavo Perrella,

filho do senador mineiro Zezé Perrella e ligado à CBF, que em janeiro assumiu o cargo de diretor de Desenvolvi­mento de Projetos. Ele estava no “mercado’’ desde o mês anterior, quando foi exonerado do cargo de Secretário Nacional de Futebol e Defesa dos Direitos do Torcedor, do Ministério do Esporte.

Apesar dos cargos e de salários que não são inferiores a R$ 35 mil mensais e podem chegar a R$ 100 mil (a CBF não revela quanto paga a seus membros), são raras as aparições desta turma na moderna sede da entidade construída no bairro da Barra

da Tijuca. Somente o secretário-geral Walter Feldman, exdeputado federal em três mandatos, bate ponto diariament­e na CBF. Os outros estão mais para visitantes esporádico­s.

Duas pessoas que frequentam assiduamen­te o prédio no

Rio disseram ao Estado que os vice-presidente­s Marcos Vicente, Fernando Sarney e Gustavo Feijó só aparecem quando eles têm reunião de diretoria – normalment­e uma vez por mês.

Porém, o filho do senador José Sarney, Fernando, tem trabalhado bastante na sede. Depois que o hoje presidente afastado Marco Polo del Nero se proibiu de sair do País com medo de ser preso por causa do escândalo de recebiment­o de propinas em contratos de marketing e de direitos de transmissã­o de TV, é ele quem tem representa­do a CBF na Conmebol e na Fifa.

A CBF não respondeu aos questionam­entos do Estado sobre a presença de tantos políticos no seu quadro de dirigentes do futebol. Mas há quem reprove esse tipo de relação. “Há o conflito de interesses. Fica aquela situação: ele (o político) é um representa­nte do contribuin­te ou do agente privado? Aí vai se criando uma cultura que é o incompatív­el com a organizaçã­o do futebol’’, entende o promotor Rodrigo Terra, do Ministério Público do Rio, que tenta impedir na Justiça a eleição de terça (mais informaçõe­s ao lado).

O deputado Otávio Leite (PSDB-RJ), crítico dos métodos da CBF, alerta: “As pessoas são livres. Mas participar de uma instituiçã­o cujo processo eleitoral é absolutame­nte hermético e de cartas marcadas não parece algo saudável”, diz

Romário, que em 2015/16 presidiu a CPI do Futebol no Senado – investigou cartolas ligados à CBF e terminou sem indiciamen­tos –, considera que o problema não é ter parlamenta­r na entidade, mas a maneira como atuam. “Sou contra aqueles que usam a posição para barrar no Congresso legislação que exija transparên­cia da CBF.”

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FABIO MOTTA/ESTADÃO ‘Ilha’. Sede da CBF, em bairro nobre do Rio, é pouco frequentad­a pelos dirigentes ligados à vida política do País; função deles é articular nos bastidores
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LUCAS FIGUEIREDO/CBF–6/4/2018 Sucessor. Rogério Caboclo vai ser aclamado presidente

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