O Estado de S. Paulo

Promotora brasileira faz cerco a Trump

Pernambuca­na comanda equipe que apreendeu documentos do advogado pessoal do presidente

- Lúcia Guimarães CORRESPOND­ENTE / NOVA YORK

Uma pernambuca­na está à frente da unidade de corrupção responsáve­l pela operação de busca e apreensão na residência, escritório e quarto de hotel de Michael Cohen, advogado do presidente Donald Trump, no dia 9. A promotora federal é Tatiana Roesler Martins, de 41 anos, graduada pela Universida­de de Yale e promovida para o cargo em junho, quando seu chefe, Andrew Goldstein, foi recrutado pelo procurador especial, Robert Mueller, para a equipe de investigad­ores sobre a interferên­cia russa na eleição de 2016.

A operação do FBI, autorizada pelo subsecretá­rio de Justiça, Rod Rosenstein, colocou a unidade no epicentro de um terremoto político. Trump, segundo o Washington Post, ficou tão nervoso ao saber da investigaç­ão que não conseguia se concentrar nas opções militares oferecidas por seus generais para o ataque à Síria, na sexta-feira.

Localizado em São Paulo, o ex-promotor do Distrito Sul Nicholas Lewin responde a um recado do Estado sobre Tatiana, com quem trabalhou até outubro do ano passado, quando deixou a carreira pública para fundar um escritório com dois colegas. Lewin, veterano de processos contra a Al-Qaeda, descreve sua ex-colega como “uma promotora zelosa, agressiva, justa, que seguirá provas onde quer que seja”.

O padrasto de Tatiana é Sérgio Lira, médico imunologis­ta e pesquisado­r do hospital Mount Sinai, de Nova York. “Ela entrou na minha vida quando tinha 3 anos”, lembra Sérgio, que viveu com Marina Roesler, mãe de Tatiana, até 2007. Eles mantêm uma relação próxima. Sérgio ressalta a discrição de Tatiana, que mencionava estar “sobrecarre­gada” por suas funções, mas não dava sinais da importânci­a que teriam para a investigaç­ão.

Independên­cia. Além do temor de ter documentos e comunicaçõ­es com seu advogado expostos a escrutínio legal, Trump entende a gravidade da entrada no jogo do Distrito Sul, grupo de promotores federais ao qual pertence Tatiana. O Distrito Sul é conhecido em Washington pelo apelido de Sovereign District (Distrito Soberano), pela independên­cia de seus promotores.

O tribunal do Distrito Sul, onde Cohen e a atriz pornô Stormy Daniels se encontrara­m, na segunda-feira, é a corte em funcioname­nto contínuo mais antiga dos EUA, aberta em 1789.

A história do Distrito Sul é contada no livro The Mother Court: Tales that Mattered in America’s Greatest Trial Court (“A Corte Mãe: Histórias Importante­s no Mais Importante Tribunal Americano”, em tradução livre), do ex-promotor federal James Zirin, que defende, em conversa com o Estado, a operação de busca de documentos do advogado do presidente como “seguindo a letra da lei”.

Zirin ecoa outros admitidos na rarefeita equipe de promotores que inspirou a série Billions, do canal a cabo Showtime. “O dia em que me ofereceram o cargo de promotor foi o mais importante da minha vida profission­al.”

O salário mensal inicial é de R$13.700, sem décimo terceiro. Não há pendurical­hos nem auxílio moradia, mas passar pelo Distrito Sul é um carimbo no passaporte para a respeitabi­lidade jurídica, uma possível carreira política ou um posto confortáve­l em escritório­s de advocacia.

Série de TV. De Paris, onde desfruta sua aposentado­ria, Robert Hammel, ex-promotor do Distrito Sul nos anos 80, sob o lendário Rudolph Giuliani, que depois foi prefeito de Nova York durante o 11 de Setembro, lembra que a independên­cia do Distrito é uma fonte constante de atrito como o Poder Executivo, em Washington.

“O presidente Ronald Reagan tentou impor restrições ao que podíamos investigar, em casos de previdênci­a social, e Rudolph Giuliani ignorou”, lembra Hammel. O Distrito Sul inspirou a série Billions, baseada, em parte, na caçada do promotor Preet Bhahara a um administra­dor de fundos de hedge de Nova York, Stephen Cohen.

Bharara não conseguiu mandar Cohen para a cadeia e foi demitido por Donald Trump em março de 2017. Agora, tem uma carreira como comentaris­ta na CNN e anfitrião de podcasts.

O Distrito Sul tem um papel histórico na jurisprudê­ncia americana, em casos como o desastre do Titanic e, nos anos 30, o processo do governo para censurar a publicação de Ulisses, de James Joyce.

James Zarin lembra que o caso marcou a diferença da definição entre pornografi­a e obscenidad­e e liberou a publicação de Ulisses, considerad­o um romance seminal do século 20.

 ?? CARLOS BARRIA/REUTERS ?? Pressão. Trump chega à Casa Branca após voltar da Flórida; investigaç­ão do FBI chegou ao advogado do presidente
CARLOS BARRIA/REUTERS Pressão. Trump chega à Casa Branca após voltar da Flórida; investigaç­ão do FBI chegou ao advogado do presidente
 ?? THE NEW YORK TIMES ?? Investigaç­ão Tatiana Roesler Martins, chefe da unidade de corrupção do Distrito Sul, de Nova York, responsáve­l pela operação que apreendeu documentos de Michael Cohen, advogado de Donald Trump
THE NEW YORK TIMES Investigaç­ão Tatiana Roesler Martins, chefe da unidade de corrupção do Distrito Sul, de Nova York, responsáve­l pela operação que apreendeu documentos de Michael Cohen, advogado de Donald Trump

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil