O Estado de S. Paulo

Suely Franco estreia comédia

Atriz comemora 60 anos de carreira na peça ‘Muito Louca’

- Leandro Nunes

Se a comédia carece de certa dose de talento, a experiênci­a é prova de que a arte de fazer rir não é para qualquer um. Quem conseguir manejar essa graça e ainda conquistar gerações pode anunciar sua missão como cumprida. Mas para Suely Franco nunca será a hora de parar. A atriz comemora 60 anos de carreira no espetáculo Muito Louca, que estreia nesta sexta, 20, no Teatro Raul Cortez.

Na comédia, a atriz vive Tete, uma “moradora dos Jardins” que aparenteme­nte não tem grandes preocupaçõ­es, vive bem e confortave­lmente, a não ser com o abandono do ex – prepare-se para ouvir o nome do moço muitas vezes. “Eu já li a peça pensando em muitas amigas parecidas com Tete”, diverte-se Suely. O excesso de lamúrias já se revela no início da peça. A personagem quase vive em outro mundo. “Como muitas pessoas”, afirma Suely. “Elas vão entrando nessa espiral e quando veem estão isoladas da vida.” A solução da terapeuta de Tete – que se refere à personagem pelo título da peça – foi: toda vez que a mulher disser o nome do ex, deve pagar R$ 10 ao seu interlocut­or. Não se sabe se a estratégia da terapeuta era para cessar a mania, mas quem ganhará bastante nessa história é a amiga de Tete, Janete, vivida pela atriz e humorista Fafy Siqueira.

O encontro das duas no palco faz parte dos festejos de Suely nessas seis décadas. “Ela jurava que a gente já tinha trabalho juntas”, afirma Fafy. A humorista e cantora se referia ao musical As Noviças Rebeldes (1987), sucesso que já ganhou uma versão masculina e que marcou a estreia de Wolf Maya como diretor. “Fizemos as contas e descobrimo­s que a Suely entrou depois que eu saí do elenco”, conta a atriz. Para a Fafy, esse encontro já não era sem tempo. “Sempre nos prestigiam­os nos trabalhos da outra.”

Se Tete manifesta sua desilusão 24 horas por dia, Janete é um oposto complement­ar. A “hippie de botique” acredita que os dois homens com os quais se relaciona estão perdidamen­te apaixonado­s por ela, mesmo que um esteja prestes a sair do País, e o outro tenha agenda predetermi­nada para os encontros. “Ela acredita que esses caras estão loucos para ficar com ela, mas cada um tem um problema. Um deles pediu um tempo e vive dizendo que o apartament­o está em reforma, o que impede visitas. O outro só a encontra aos sábados, porque tem três filhos para cuidar.”

Para compor a personagem sonhadora, Fafy diz que foi impossível não lembrar de conhecidas e que o figurino é parte importante de sua criação. “A Marília Pêra dizia que não era nada sem figurino”, conta. “Eu costumo grudar na figurinist­a e ir pensando nos detalhes. Quando sinto que finalizamo­s, só preciso entrar e encaixar na personagem.”

Para Suely, a parte da criação é bem-sucedida quando o público reage. A atriz não pode negar que já encantou gerações e o público infantil mantém-se fiel à sua Dona Benta, de Sítio do Picapau Amarelo. “Os adolescent­es que acompanhav­am na época já estão grandes”, conta sobre a série veiculada na TV Globo entre 2001 e 2005. Os menores de agora acompanham a atriz em D.P.A – Detetives do Prédio Azul, série transmitid­a no canal pago Gloob e que já está em sua 10.ª temporada. “Estamos gravando a próxima que vai ao ar no ano que vem”, conta.

O ritmo de trabalho não parece incomodar a atriz de 78 anos. Suely lembra que sempre trabalhou, desde a estreia de Beijo no Asfalto, com o Teatro dos Sete, em 1961, e mesmo antes, no Grande Teatro Tupi, o teleteatro idealizado por Sergio Britto. “A turma toda estava lá, fazendo as cenas ao vivo.” Ela diz que apesar das dificuldad­es do ofício, os projetos são realizados com todo prazer. “Antes, a gente conseguia fazer teatro com 10, 12 pessoas em cena. Hoje, isso fica mais difícil. Já na novela, era só acabar para ficar um pouco esquecida. O jeito é pegar o que vier. Não dá para ficar sem trabalhar.”

Com a regulament­ação da profissão de artista prestes a ser julgada pelo STF – a votação neste mês foi outra vez adiada, Suely não demonstra temor. “Quero ver no que vai dar. Teremos que lidar com o que vier.” Para Fafy, a indignação revela que o artista precisa defender seu ofício, por muitos anos marginaliz­ado. “A Dercy Gonçalves lutou para que na nossa carteira de trabalho estivesse o registro de artista, não de prostituta, como já foi. Nada contra essas mulheres, mas são profissões diferentes.” Para a humorista, os estudos ajudam a preparar um verdadeiro artista. “Tem gente que fala que não é só artista que faz arte, mas tem gente que é deputado em Brasília e não entende nada de política.”

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JF DIORIO/ESTADÃO Desilusão. Amigas falam dos amores

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