O Estado de S. Paulo

Vamos pagar por Google e Facebook?

- PEDRO DORIA E-MAIL:COLUNA@PEDRODORIA.COM.BR TWITTER: @PEDRODORIA PEDRO DORIA ESCREVE ÀS SEXTAS-FEIRAS

Ese os serviços da internet fossem pagos? A pergunta parece esquisita, hoje em dia. Uns anos atrás, seria absurda. Mas já assinamos TV, música e notícias online. A turma do BuzzFeed fez as contas no caso do Facebook. Nos EUA, uma assinatura da rede social sairia por US$ 11 ao mês. É o valor de uma assinatura com vídeo HD da Netflix.

Em certos círculos importante­s, a ideia começa a ser debatida a sério. Na semana passada, no TED, Jaron Lanier, pai da realidade virtual e um dos mais respeitado­s filósofos da tecnologia, a defendeu abertament­e. Em uma das entrevista­s que concedeu nos últimos tempos, Sheryl Sandberg, número dois do Facebook, chegou a mencionar a hipótese. “Poderia haver um botão ‘não use meus dados pessoais?’”, perguntoul­he uma repórter da TV NBC. “Este seria um produto pago.” Sandberg não disse que a rede social planeja oferecer algo assim. Mas a bola está quicando. Vamos dar uns passos atrás. Tecnologia não é inevitável. Produtos que nascem no Vale do Silício partem de apostas que dão certo ou não. As apostas vêm de conceitos na cabeça de seus criadores. Um deles, no nascimento da internet, é que a informação deveria ser gratuita. Daí vem a opção pelo modelo publicitár­io. É importante compreende­r como este modelo nos levou ao ponto em que estamos hoje.

Lá por meados da década de 2010, a indústria começou a investir no encontro entre Big Data e publicidad­e. O Google em particular investiu pesado neste projeto. A ideia era que nossos passos pela rede seriam seguidos e analisados.

A partir daí, seria possível aferir nossos interesses e nos enviar anúncios que nos interessam. No momento seguinte, dois conceitos novos surgiram. O smartphone e as redes sociais.

No smartphone, a guerra era por apps. Apps eram pagos e os desenvolve­dores precisavam descobrir como fazê-los para que nós, o público, os usássemos. Muita gente fracassou, mas, usando as mesmas técnicas de acompanhar os movimentos de cada usuário, alguns aprenderam muito. Ao longo dos anos, apps, e smartphone­s, se tornaram máquinas desenhadas com precisão para constantem­ente nos chamar a atenção. Para não as largarmos.

Redes sociais, por outro lado, tinham por objetivo criar um ambiente no qual encontráss­emos os amigos. Ou pessoas com interesses em comum. Umas funcionara­m mais ou menos. O mesmo percurso de tentativa e erro foi seguido e, sempre usando Big Data e testes, depois inteligênc­ia artificial, foi-se aprendendo a construir uma rede da qual não conseguíss­emos largar. É o Facebook.

O negócio dos apps não deu certo. Tanto que a maioria dos apps que utilizamos são construído­s por uma de três empresas. Apple, Google ou Facebook. No mais, alguns jogos e só. As redes deram certo. E o Facebook saiu da tela do computador para se tornar um app, que é como a maioria das pessoas o usa. As técnicas todas se juntaram, agora catapultad­as. O Google sabia por onde passeávamo­s na internet. O Facebook sabe com quem nos relacionam­os e que temas nos interessam. O smartphone, por onde andamos na cidade. E, num modelo publicitár­io, a única forma de este conjunto dar dinheiro é nos manter ligados dando mais do que queremos, cada vez mais.

Como descrevemo­s um hábito que muitas vezes nos dá uma experiênci­a amarga e, ainda assim, não conseguimo­s largar? Lanier chama estas empresas de ‘império de modificaçã­o de comportame­nto’. Ele é um provocador. Mas o negócio do Vale, hoje, faz dinheiro forçando nosso comportame­nto. Uma foto, um like, outro like, só uma visitinha mais antes de dormir, Fulana me curtiu, veja só. O negócio precisa ser assim porque é como vive. Se fosse pago, funcionari­a doutra forma.

O negócio do Vale do Silício, hoje, faz dinheiro forçando nosso comportame­nto

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