‘Corremos o risco de virar um país normal’
Economista que vai trabalhar na campanha de Geraldo Alckmin diz que presidente eleito terá de domar situação fiscal
Economista e consultor de grandes empresas, José Roberto Mendonça de Barros acredita que o País está próximo de entrar num período de crescimento sustentável, no qual inflação e juros baixos não serão circunstanciais. “Corremos o risco de virar um país normal”, disse em entrevista ao Estado. Ingressar na nova fase depende, porém, de um presidente eleito que se empenhe em domar a situação fiscal, afirmou.
Para Mendonça de Barros, que foi secretário de Política Econômica no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, o próximo governo tem a chance de terminar o trabalho iniciado pela equipe que formulou o Real. “Precisamos de um caminho fiscal que complete a estabilização”. Ele disse que trabalhará com Persio Arida na elaboração do programa de Geraldo Alckmin (PSDB) à Presidência.
O sr. atuará na campanha?
Sim. Trabalharei com Persio Arida, que coordena o programa de Geraldo Alckmin. Estamos deixando a pior recessão da história e temos, portanto, a tarefa hercúlea de conseguir sair do buraco onde estávamos enfiados. Sinto-me não apenas compelido, mas diante de tarefa que não posso me furtar. O governador é um homem de bem, tem currículo e uma história, coisa que nem todos podem dizer que já possuem.
Teme o desfecho das eleições?
Eleições são sempre incertas. Acredito que estamos muito perto de entrar numa fase de crescimento sustentável. Seria uma pena se essa oportunidade não fosse aproveitada. É algo talvez complementar para quem participou do Plano Real lá atrás como eu, que estive no governo de 1995 a 1998. É a chance de completar o trabalho e de transformar o Brasil num país normal.
O que é um país normal?
Um país com o histórico de inflação e de juros elevados do Brasil tem uma anormalidade envolvida. Há muitas décadas estamos numa sucessão de avanços e retrocessos que mata o crescimento consistente. Um país normal, arrumado, cresce sempre. Não adianta acelerar por quatro anos e depois se esborrachar no muro. O efeito líquido é uma decepção. Isso tem de ser superado.
O que seria completar o trabalho feito no Plano Real?
Primeiro, caminhar para a situação onde investir e melhorar faça parte do dia a dia. O setor agropecuário cresce há 40 anos, a despeito da infraestrutura e eventuais problemas climáticos. E isso se transformou em redução do custo da alimentação e da inflação. Outra coisa é enfrentar a crise fiscal, reduzindo o que o Estado se propõe a fazer. O experimento heterodoxo baseou-se em expansão enorme do Estado na hipótese de que bastaria empurrar dessa forma para o crescimento vir. Não veio. Ficou claro para todo mundo com o mínimo de honestidade intelectual que, com as regras atuais da Previdência e do setor público, não há chance de voltarmos a crescer. O desequilíbrio fiscal cresce de forma que derruba tudo. Precisamos de um caminho fiscal que permita completar a estabilização.
• O governo FHC não interrompeu a expansão dos gastos públicos, que crescem desde então.
Lá atrás no Plano Real, a carga tributária era relativamente baixa. Era possível elevar gasto financiado por alta de imposto. Essa ficha foi gasta. Como prestar os serviços sem a parte fácil de aumentar tributação? A resposta está dada: transferir para o setor privado – notadamente o investimento. Outro pedaço vem da eventual redução de programas e sistemas deficitários: Previdência, regras do
salário do setor público etc. Temos ainda de aproveitar o efeito da inflação, que está realmente baixa. Em três anos, considerando as projeções, teremos 3,5% de inflação, em média. E sem controle de preço, mágica cambial. Desde que temos índice de preços, não temos inflação assim.
Qual o efeito para economia?
Empresas passam a se preocupar cada vez menos com mecanismos de indexação e cada vez mais com eficiência. Comerciantes me dizem agora que não precisam vender camisas preocupados com preço de reposição. O preço de venda é a política de posicionamento no mercado. Isso é um país normal. Vivíamos num País onde até camisa tinha spread. É uma vantagem para os empresários. Outra coisa a aproveitar é que, pela primeira vez no período pósguerra, temos folga cambial de verdade.
“Não adianta acelerar e se esborrachar. O efeito líquido é decepção”