POR UMA NOVA ESTRATÉGIA DIPLOMÁTICA
Especialistas defendem mudanças na política externa, mais protagonismo internacional do Brasil e integração global
Para os participantes do terceiro Fórum Estadão – A Reconstrução do Brasil, realizado ontem, é preciso que uma nova estratégia diplomática, que dê maior protagonismo ao Brasil, seja incluída no debate eleitoral.
A importância da política externa no debate eleitoral e a necessidade de uma nova estratégia diplomática para o País foram os temas centrais da conversa entre o diplomata Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior, o ex-chanceler Celso Lafer e a economista e integrante do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp, Lídia Goldenstein.
O encontro, realizado ontem no teatro da Unibes Cultural, em São Paulo, foi parte do terceiro Fórum Estadão – A Reconstrução do Brasil, organizado pelo Estado. O tema principal do painel foi a integração global do Brasil e o federalismo no País.
Barbosa foi o primeiro a tratar da campanha presidencial no contexto da política externa. Ele afirmou que as eleições de 2018 vão definir o futuro e a imagem do País não só nos próximos anos, mas nas próximas décadas. Segundo ele, para o Brasil voltar a ter protagonismo no cenário internacional, a escolha de um mandatário com uma postura reformista e de abertura comercial será decisiva.
“Tenho uma visão otimista desde que o resultado (das eleições) indique um caminho de visão de médio prazo, de abertura, de reformas estruturais, de inserção externa. Se não houver isso, não vamos estar na posição que queremos daqui a 20 anos”, disse Barbosa a uma plateia de 150 pessoas.
“É preciso chamar a atenção para o isolamento do Brasil. Nessa eleição, estarão em jogo dois modelos: um para mudar a voz do Brasil no mundo, inserir o País nos mercados internacionais, ou um modelo de mercado fechado”, afirmou. “O resultado disso é, de um lado, crescimento sustentável e, de outro, a Grécia”, falou, citando o país europeu que atravessa uma forte crise econômica.
Ao menos um consenso foi construído entre os debatedores do fórum: a necessidade de o País pensar uma nova estratégia diplomática. “É importante termos um sentido de direção”, disse Lafer. Para o ex-ministro, o governo de Michel Temer e o Itamaraty estão se empenhando em “damage control (controle de danos) da era lulista”.
As críticas à atuação do governo Lula se acentuaram na fala de Barbosa. Ele avaliou que serão necessários esforços para “tirar o País do atraso” dos últimos três anos e que o Itamaraty precisa ser “modernizado e revigorado”. Avaliou que o Brasil deve “defender os interesses nacionais acima de tudo”. Para ele, no passado, a política externa era pautada pela solidariedade e não pela defesa dos interesses brasileiros.
Segundo Barbosa, o Brasil está isolado das negociações comerciais e perdeu protagonismo nos últimos anos. “O País não sabe quais são seus rumos e o seu lugar na América do Sul.”
Apesar de compartilhar das críticas ao período Lula, Lídia lembrou que o atual governo segue atuando de forma isolacionista. “Nós voltamos ao FlaFlu, voltamos a limitar nossa discussão a temas muito específicos, que são fundamentais, longe de mim dizer que a questão do déficit público não é fundamental, mas, se não tiver uma estratégia de crescimento, a gente resolve o déficit público hoje e amanhã nós vamos ter outra crise”, ponderou.
China. Lafer afirmou que países como a China conseguem ter uma visão estratégica para chegar aos objetivos. Para ele, o Brasil deve fazer o mesmo, se adaptando à conjuntura atual. “O mundo muda e a composição demográfica muda. Há um deslocamento da economia para a Ásia, uma urbanização crescente e um empoderamento crescente das pessoas devido ao maior acesso à informação e aos meios técnicos que o avanço do conhecimento oferece.”
De acordo com Lafer, a política externa tem vários objetivos. “A partir da avaliação do que é mais imperativo, é preciso ver o que os cenários internacionais oferecem para o Brasil na atual conjuntura”, afirmou..
Para Lídia, apesar dos problemas atuais, o Brasil tem todas as condições de ter um papel importante no cenário internacional no futuro. Ela citou como exemplo de setor eficiente do País o agronegócio. “Temos condições internas, mas depende de se criar uma articulação dentro da sociedade que permita que essas costuras sejam feitas. Temos que ter uma estratégia de crescimento que repense o Brasil em um mundo que não é mais o que estamos pensando”, afirmou a economista.
Sobre o futuro da política externa, o ex-embaixador Rubens Barbosa disse que as relações com a Ásia, em especial a China, serão dois tópicos muito importantes nos próximos anos.
“É preciso chamar a atenção para o isolamento do Brasil. Nessa eleição, estarão em jogo dois modelos: um modelo para mudar a voz do Brasil no mundo ou um modelo de mercado fechado.” Rubens Barbosa DIPLOMATA
‘Anão diplomático’. A expressão “anão diplomático” (para se referir à atuação do País na política externa) também foi rechaçada pelos participantes. “O Brasil sempre procurou não apenas defender seus interesses específicos, mas também ter um papel na visão pela qual o mundo se organiza. É uma observação provocada por uma irritação de momento que, do ponto de vista de avaliação, é errada”,
“Temos que ter uma estratégia de crescimento que repense o Brasil em um mundo que não é mais o que estamos pensando.” Lídia Goldenstein ECONOMISTA E MEMBRO DO CONSELHO DE COMÉRCIO EXTERIOR DA FIESP
disse Lafer, que ainda afirmou que o País tem “porte médio” no mundo da diplomacia.
Da plateia surgiu a questão sobre aquilo que já foi considerado de importância estratégica para o País, mas que hoje aparece pouco em debates sobre a diplomacia brasileira: um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU.
“A alteração do Conselho de Segurança da ONU, se e quando ocorrer, vai depender da evolução da conjuntura internacional. Ela foi colocada no governo Fernando Henrique Cardoso, mas fazer dela prioridade número um da política externa como foi feito no governo Lula foi uma hierarquia que não atendia às necessidades do País”, afirmou Lafer.
“O painel levantou muitas questões, discutidas com muita competência. Me chamou atenção a parte sobre a necessidade de reconstrução da nossa diplomacia.” Edmundo Pinho Ayres EMPRESÁRIO “Discussão profunda sobre os problemas do País. As pessoas desenvolveram um raciocínio daquilo que foi feito de correto e incorreto no passado e o que precisa fazer no futuro.” Sérgio Carvalho CONSULTOR DE COMÉRCIO EXTERIOR “Os temas debatidos são relevantes. Ainda mais em um ano eleitoral – em que precisamos estar atentos aos detalhes da política.” Denise de Pasqual TENDÊNCIA CONSULTORIA “Esse tipo de debate tem o mérito de ser agregador, de reunir diversos pontos de vista e apontar para o futuro. Achei uma experiência bastante rica e esclarecedora.” Renata Zambelli ECONOMISTA DA CPFL “A inserção do Brasil no mundo é um tema fundamental. Acredito que esse encontro nos ajudou a entender a importância de um País integrado no contexto da economia internacional.” Jomázio Avelar PRESIDENTE DO CONSELHO BRASIL-NAÇÃO