Quipás contra o antissemitismo
Manifestantes usam quipás em protesto em Berlim contra ataque antissemita sofrido por dois jovens. No ano passado, na França, 11 judeus foram torturados até a morte, o que levou à mobilização de 300 personalidades. Esse “apelo à razão”, no entanto, aponta o dedo para o culpado errado, escreve Gilles Lapouge.
Como os incêndios florestais que os bombeiros conseguem apagar, mas renascem dali a uma semana, uma das mais hediondas bagagens da comunidade humana, o antissemitismo, entrou na Europa e na França em um novo período de fúria.
Algumas pessoas pensavam que Auschwitz havia cauterizado a ignomínia e, depois de Hitler, ninguém ousaria jamais levantar as mãos sobre os judeus, pelo simples fato de serem judeus. E é verdade que, durante muitos anos após a guerra, o ódio aos judeus parecia ter sido, senão erradicado, pelo menos mantido adormecido. Mas esse sono foi frequentado por sonhos e monstros – e eis que os monstros se tornam realidade.
No ano passado, na França, 11 judeus foram torturados até a morte por “arruaceiros” – porque eram judeus. Ataques na rua, insultos e cusparadas, as ameaças se tornaram tais que em alguns subúrbios, por exemplo, em Saint-Denis, em Paris, dezenas de milhares de judeus fugiram desse bairro malcheiroso para procurar algum outro lugar na França, ou mais longe, paisagens tranquilas.
O perigo chegou a tal ponto que 300 personalidades se mobilizaram para que essa onda de antissemitismo fosse contida. Como não os congratular? Infelizmente, esse “apelo à razão” aponta o dedo para o culpado da praga “antissemita”: são os “islamitas e os muçulmanos”. Primeira mentira.
De nenhuma forma podemos, especialmente se quisermos apagar as chamas, confundir no mesmo opróbrio “islamitas” e “muçulmanos”. Na verdade, a quase totalidade dos muçulmanos na França não são “islamitas”. Eles sofrem tanto quanto qualquer um com a selvageria islamita.
O chamado dos 300, então, recomenda que sejam relegados à obsolescência “os versos do Alcorão pedindo o assassinato e a punição dos judeus”. Mais uma vez, a seta está mal apontada. Primeiro erro: o Alcorão, ao contrário dos Evangelhos de Cristo, não foi escrito por discípulos ou exegetas, mas por Deus, pelo próprio Alá. Como alguém poderia se permitir “censurar” ou “cortar” a palavra de Deus? Nenhuma autoridade humana, nem imã ou qualquer pessoa, tem o poder de selecionar quais as boas e as más passagens do discurso de Deus.
Além disso, nos textos sagrados do Islã, passagens realmente abomináveis contra os judeus não estão no Alcorão, mas nos hádices. Por exemplo, no hádice “La Sahi uslin” encontramos essa indignidade: “Ó muçulmano, ó servo de Alá! Aqui está um judeu atrás de mim. Venha e o mate.” E há coisas piores. Apenas não temos o direito de afirmar que esta frase desprezível venha do Alcorão. Um hádice não faz parte do Alcorão. Ele apenas repete (depois da morte do profeta, as palavras que teriam sido ditas por Maomé e seus companheiros). Não é a palavra de Deus.
Portanto, pode-se realmente “purgar” os hádices de seus excessos. Mas o Islã não é organizado como a Igreja, com um papa, cardeais e uma cadeia de comando. Trocar esses textos, mesmo que sejam apenas os hádices, e não o Alcorão, exigiria longo tempo.
O que aconteceu na Igreja Católica é instrutivo. Roma começou a deixar o cristianismo prosperar e reinventar a lenda do “deicídio” atribuído aos judeus que teriam assassinado o Messias, Jesus Cristo, filho de Deus. Foi preciso esperar até 1566 e o Concílio de Trento para que a Igreja finalmente aliviasse os judeus desta acusação desprezível.
Em seguida, passaram-se muitos séculos para finalmente erradicar estas raízes do antissemitismo cristão. Lembremo-nos que, ao longo do século 19, incluindo o caso Dreyfus, a Igreja, com poucas exceções, permaneceu ferozmente antissemita.
A verdadeira ruptura com o antissemitismo data de 1965, com a declaração Nostra Aetate, que erradica esta fonte enlameada de antissemitismo. Mas, até hoje, uma parte da sociedade cristã e bem pensante abriga nas profundezas de seu coração alguns pruridos de antissemitismo.
Estamos, portanto, encantados com o fato de que 300 pessoas respeitáveis tenham tido finalmente a coragem de denunciar o antissemitismo na França e na Europa. Ao mesmo tempo, devemos estar cientes de que este texto tem outro alvo: o islamismo e os árabes.
Coincidentemente, no mesmo dia foi divulgado outro texto: 30 imãs franceses também denunciam o antissemitismo e o “islamismo” extremista, responsável pela jihad e por atentados suicidas, mas é cuidadoso ao não confundir “islamismo e Islã”. Na verdade, é o contrário: o melhor aliado contra a ameaça “jihadista” e contra o islamismo radical é essa vasta comunidade de fiéis muçulmanos que são os primeiros alvos da ira interminável antiocidental dos “islamitas”.
Os imãs que pregam o ódio devem ser expulsos. Os outros, a maioria, devem ser encorajados e protegidos. A estrada é árdua, faz fronteira com precipícios, mas não há outra se quisermos, um dia, provavelmente distante, viver num mundo reconciliado, libertado do abraço mortal do jihadismo.
A mobilização contra a nova onda antissemita não deveria apontar o dedo para o Islã