O Estado de S. Paulo

UM PACTO FEDERATIVO DESEQUILIB­RADO

Forma como a União concentra os recursos públicos é criticada por especialis­tas ouvidos pelo ‘Estado’

- / M.H., G.A. e P.B.

Os participan­tes do Fórum Estadão concordara­m que o pacto federativo está desequilib­rado. A forma como foram distribuíd­os atribuiçõe­s e direitos dos municípios e da União, por motivos diferentes, criou um impasse quanto à administra­ção de políticas e à prestação de contas ao cidadão – o que se torna ainda mais crítico em ano eleitoral.

“Até quando vamos viver nesse destrambel­hamento federativo?”, disse o presidente da Confederaç­ão Nacional de Municípios (CNM) há 21 anos, Paulo Ziulkoski. Para ele, o grande problema é a centraliza­ção de recursos, programas e tomada de decisão do governo federal, o que acaba por engessar o gestor local.

“Não temos nada de patrimônio, é tudo da União. É a partir dali que se geram os tributos e a União se apropria desses recursos, quase de uma forma de dominação”, disse. Suas críticas foram recebidas com aplausos pela plateia de cerca de 150 pessoas na Unibes, em São Paulo.

Por sua vez, Marcos Mendes, chefe da assessoria especial do Ministério da Fazenda, afirmou que o sistema federativo é bom porque é flexível, mas ponderou que são necessária­s reformas. “O dinheiro acabou. Não tem como sustentar um modelo de Estado em que a União paga tudo”, disse, também sob aplausos. Para Mendes, os princípios federativo­s foram virados do avesso: “Onde é melhor centraliza­r, nós descentral­izamos, onde é melhor descentral­izar, nós descentral­izamos”.

Mendes citou a questão tributária como exemplo. O governo pretende apresentar ao Congresso nos próximos dias sua proposta, que contará com um imposto único que substituir­ia os tributos federais, estaduais e municipais. Hoje há o ICMS estadual que tem 27 legislaçõe­s diferentes. “Uma complicaçã­o tremenda”, disse o economista. “Criouse uma guerra fiscal, competição predatória entre os Estados para atrair investimen­tos.”

Um fábrica, por exemplo, se instala em uma região longe de seus distribuid­ores e consumidor­es por incentivos tributário­s, mas o custo do transporte acaba se tornando muito alto e o preço do produto não fica competitiv­o, dependendo continuame­nte de subsídios públicos.

A professora da Escola de Administra­ção da FGV Cibele Franzese afirmou que a “confusão do pacto federativo”, como classifica o assunto, começou na Constituiç­ão, “quando se desenha um modelo de bem-estar social e, na hora de dizer quem deve fazer, diz que deve haver atuação das três esferas”. “O cidadão não sabe ao certo de quem cobrar o serviço. Esses sistemas são altamente cooperativ­os e dificultam ao cidadão saber de quem ele exige isso, principalm­ente em momento eleitoral”, disse a professora, durante sua palestra ao painel.

Programas. O presidente da Confederaç­ão Nacional dos Municípios atribuiu um dos maiores problemas do pacto federativo à União. Segundo ele, há um grande problema na questão da manutenção dos “excessivos” programas. “Todos os programas são bons, mas não cabem no PIB”, afirmou Ziulkoski. Segundo estudo da confederaç­ão, os R$ 400 que o governo federal envia ao município por criança na creche evolui para R$ 1,2 mil.

A professora da FGV saiu em defesa dos programas elaborados na União e lembrou que os prefeitos têm liberdade para adequá-los à realidade do município. O cadastro advindo do Bolsa Família, por exemplo, pode ter gerado novos programas municipais ou uma bolsa assistenci­alista da própria cidade.

“Concordo com Marcos: o dinheiro acabou, temos que melhorar o gasto público ou a distribuiç­ão do dinheiro que a gente tem. Se ele entra no cofre público, a gente tem que olhar como ele está saindo”, concluiu Cibele.

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MANDA PEROBELLI / ESTADÃO Reformas. Marcos Mendes, do Ministério da Fazenda: ‘O dinheiro acabou. Não tem como sustentar um Estado em que a União paga tudo’

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