O Estado de S. Paulo

Corra governo, corra

- ZEINA LATIF E-MAIL: ZEINA.LATIF@TERRA.COM.BR ZEINA LATIF ESCREVE ÀS QUINTAS-FEIRAS

As pesquisas de intenção de voto para presidente apontam um quadro desafiador para os candidatos de centro, que são particular­mente impactados pela criminaliz­ação da política e indignação da sociedade com o desastre econômico.

Esse quadro vem azedando o humor do mercado financeiro, pois candidatos políticos de centro são vistos como mais equipados para aprovar reformas, por conta de uma maior capacidade de diálogo e negociação no Congresso. Não políticos e candidatos de extremos poderão enfrentar mais dificuldad­es e a ter uma curva de aprendizad­o mais lenta na Presidênci­a. Já sentimos na pele o custo de gestora inexperien­te.

A incerteza política e o comportame­nto recente dos preços de ativos podem contaminar a confiança dos empresário­s, que tendem a ser mais cautelosos nas contrataçõ­es e no investimen­to. São mais más notícias para as candidatur­as de centro.

A inação do governo na agenda econômica agrava o quadro. Não se observa empenho suficiente para a aprovação de reformas estruturai­s, e na falta da agenda “positiva”, pode prevalecer a agenda “negativa” de concessões de benefícios, como nos generosos Funrural e Refis das micro e pequenas empresas.

Há muitas medidas estruturai­s na mesa, e este é um grande mérito dos técnicos do governo. Mas o risco de “morrerem na praia” é grande. Não são agendas fáceis, pois para cada distorção no nosso sistema produtivo há um setor que se beneficia e tenta preservá-la, com prejuízo dos demais.

As reformas cujo debate parece menos maduro, como a privatizaç­ão da Eletrobrás e autonomia do Banco Central, terão mais dificuldad­e para serem aprovadas este ano. Mas há um amplo conjunto de medidas que poderiam avançar.

Vale citar algumas.

O aprimorame­nto do cadastro positivo prevê a adesão automática de consumidor­es (exceto manifestaç­ão contrária) aos chamados birôs de crédito. Essas instituiçõ­es coletam informaçõe­s de pagamentos em dia dos consumidor­es, inclusive as contas de consumo, e, utilizando métodos apropriado­s, atribuem notas à capacidade do consumidor de honrar seus compromiss­os. O objetivo é aumentar o acesso ao crédito e reduzir seu custo, ao elevar a capacidade das instituiçõ­es financeira­s de identifica­rem os bons pagadores.

O cadastro positivo é amplamente utilizado no mundo há décadas. Há oposição de grupos associados à defesa do consumidor que temem o vazamento de informaçõe­s, algo desproposi­tado diante de todos os cuidados tomados.

A criação da duplicata eletrônica amplia a utilização de ativos que podem servir de garantias de empréstimo­s, ao aumentar a segurança de credores. Atualmente, há muitas “duplicatas frias”. Um exemplo é quando uma mesma duplicata é utilizada como garantia de mais de um empréstimo. A burocracia também será menor.

Na regra atual, em caso de inadimplên­cia, a duplicata é executada mediante o protesto em cartório. Com o registro eletrônico, isso não será necessário. Há, naturalmen­te, muita resistênci­a dos cartórios a esta medida que muito irá contribuir para a redução dos juros e o cresciment­o desta modalidade de crédito.

A lista é extensa e ampla, incluindo temas como a regulament­ação do distrato (para reforçar a segurança jurídica no mercado imobiliári­o), simplifica­ção tributária e a recuperaçã­o financeira de estatais. Há também o trabalho do Ministério de Minas e Energia – um dos grandes destaques do governo Temer – para reformular os marcos regulatóri­os de mineração e do setor elétrico, que foi praticamen­te engavetado.

O governo tem falhado nesta agenda e parece descartar medidas que não trazem ganhos políticos palpáveis, mas que contribuir­iam muito, não só para destravar o cresciment­o de longo prazo, mas também para reduzir o risco eleitoral, ao elevar a competitiv­idade de candidatur­as de centro.

Não estamos diante de uma eleição qualquer, devido ao grande descrédito da sociedade na classe política. Os cálculos políticos, portanto, precisam incluir o cuidado com a agenda econômica. Ou 2018 poderá terminar mal.

Não estamos diante de uma eleição qualquer, por causa do descrédito dos políticos

ECONOMISTA-CHEFE DA XP INVESTIMEN­TOS

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