O Ocidente deve acreditar nas boas intenções de Kim?
Sim
Caso a cúpula entre EUA e Coreia do Norte seja um sucesso, será só o começo de um longo processo. Eliminar a ameaça nuclear e alcançar estabilidade na região exigirá uma reflexão não convencional e medidas muito mais amplas do que a desnuclearização. Mas, da mesma forma como devemos nos preparar para a possibilidade de a cúpula fracassar, também devemos nos preparar para que ela “dê certo”. Os riscos são altos.
A Península Coreana é a região mais militarizada do mundo. A Coreia do Norte tem armas nucleares e mísseis que podem chegar aos EUA. Mesmo que Donald Trump e Kim Jong-un fechem um acordo, conquistar segurança e estabilidade exigirá negociações intensas e implementação abrangente por meses, talvez anos. Isso não pode ser encarado como uma discussão bilateral entre EUA e Coreia do Norte – deve também incluir China, Coreia do Sul, Japão e Rússia.
Uma negociação bem-sucedida exige que todos os envolvidos se beneficiem. Isso significa que todos devem ceder. Os EUA querem o desmantelamento nuclear. A Coreia do Norte, os be- nefícios econômicos. Será que é possível desen- volver ferramentas para que ambos ocorram simultaneamente? A história mostra que sim.
Em 1991, quando a União Soviética estava se desintegrando, elaboramos uma lei para dar assistência técnica e financeira para o inventário das armas nucleares e químicas. A iniciativa fi- nanciou trabalhos para cientistas do bloco sovié- tico e evitou a proliferação de seu know-how. EUA e Rússia aprenderam a cooperar na redu- ção de ameaças ao trabalhar juntos na implemen- tação do programa, de 1991 a 2012. Com essa ex- periência conjunta, se quisermos reconstruir a cooperação entre Washington e Moscou, a Coreia do Norte é um bom lugar para começar.
Embora existam diferenças entre Coreia do Norte e União Soviética, o conceito de coopera- ção é uma ferramenta poderosa na eliminação do arsenal nuclear norte-coreano. Certamente, não há garantias de que haverá avanço, mas de- vemos estar preparados para aproveitar a opor- tunidade. ✽
SÃO EX-SENADORES DOS EUA
Não
Os bons vigaristas dão o golpe sem que o pato chegue a saber que foi enganado. É com esse espírito que Kim Jong-un se prepara para bater a carteira de Donald Trump. Na terça-feira, Trump falou sobre o encontro que terá com o líder da Coreia do Norte. “Temos informações diretas de que os norte-coreanos querem essa reunião o mais breve possível. Acho ótimo para o mundo. Kim Jong-un tem sido muito aberto e, acredito, honrará o que diz.”
A declaração foi estúpida, errada e perigosa. Kim é autor das maiores atrocidades do mundo contra os direitos humanos. Segundo a Freedom House, “a Coreia o Norte é um Estado de um só partido, governado por uma dinastia ditatorial e totalitária. A população vive sob vigilância, prisões e detenções arbitrárias são comuns e a dissidência política é severamente punida. O Estado mantém prisioneiros políticos em campos nos quais ocorrem torturas, trabalho forçado, fome e outras atrocidades. Embora algumas mudanças sociais e econômicas tenham sido observadas nos últimos anos, violações dos direitos humanos continuam se dando de forma ampla, grave e sistemática”.
Não há nada nem remotamente honrado ou aberto em Kim, que entre outras coisas estaria por trás da morte de um tio e de um meio-irmão. Os EUA não deveriam nunca admitir esse regime como legítimo ou merecedor do mesmo tratamento dado a outros países. Trump parece ingênuo ao acreditar que ao usar o termo “desnuclearização” Kim esteja propondo se desfazer de suas armas nucleares e vá abrir seu país a inspeções. Trump não entende que para a Coreia do Norte as palavras têm outro significado. Kim honrado? Aberto? Nem em sonhos.
Dá para entender por que muitos estão preocupados em ver Trump e Kim na mesma sala de negociações. O perigo não é Trump sair da sala, mas sim que ele fique e diga coisas que Kim entenda de modo perigosamente errado, levandonos à beira de uma guerra nuclear ou de uma séria ruptura com nossos aliados. ✽
É JORNALISTA