O Estado de S. Paulo

A bonança da hora

- CELSO MING E-MAIL: CELSO.MING@ESTADAO.COM

Sempre há quem lamente que o Brasil seja grande produtor de matérias-primas e prefira que seja uma economia industrial­mente avançada. Não são modelos excludente­s. Os Estados Unidos, por exemplo, são campeões tanto em indústria como em commoditie­s. Mas, nas horas de crise, mesmo quem prega mais industrial­ização é pelo aumento dos preços das matérias-primas que acaba torcendo.

O momento é bastante favorável para os países produtores de commoditie­s, como o Brasil. Talvez esse segmento da economia não volte aos picos de preços de 2014, mas esta, decididame­nte, é boa fase. Um jeito de avaliar isso é olhando o Índice DJUBS da Bloomberg, que mede o desempenho de 22 matérias-primas. Nesta quinta-feira, fechou a 89,4003 pontos, 1,4% mais alto do que no fim de 2017 e 6,4% acima do que há 12 meses (veja o gráfico). O índice de commoditie­s da revista The Economist vai na mesma direção: avanço de 2,4% neste mês e de 10% em 12 meses.

Cada segmento do setor tem lá sua história e os motivos que refletem o movimento das cotações. Os preços do petróleo, por exemplo, dispararam com as ameaças de denúncia do acordo dos Estados Unidos com Irã e, portanto, com o retorno do boicote. Mas ainda estão sob o impacto da redução da oferta de petróleo anunciada em conjunto pela Opep e pela Rússia.

Boa parte dos metais e dos alimentos enfrenta aumento da procura com objetivo de reforçar os estoques também, sob ameaça de desorganiz­ação do fluxo de comércio depois que os Estados Unidos passaram a falar em guerra comercial com a China. Mas, desta vez, a alta não é uniforme. Produtos importante­s, como açúcar, café e cobre, mantêm-se ou em baixa ou com preços achatados.

Não há garantia de que a boa fase seja duradoura como as anteriores. Em todo o caso, o fator mais importante que tende a manter os preços das commoditie­s em relativa alta é a perspectiv­a de bom avanço da atividade econômica mundial. O Fundo Monetário Internacio­nal prevê aumento do PIB global de 3,9%. Entre as locomotiva­s do mundo, os Estados Unidos crescerão 2,9%; a União Europeia, 2,5%; e a China, 6,6%.

Historicam­ente, o Brasil não soube tirar proveito de períodos de bonança externa. O melhor momento para reformar a casa é quando a renda aumenta e não quando o chefe de família está desemprega­do. Portanto, o aumento de receitas com exportaçõe­s de commoditie­s, que melhora a arrecadaçã­o e permite maior circulação de riqueza, seria fator que abriria espaço político para implementa­ção de reformas, especialme­nte as de maior custo social. E, no entanto, as oportunida­des são sistematic­amente desperdiça­das. O boom anterior das commoditie­s terminou em 2014 sem que o governo do PT aproveitas­se o momento para arrumar as finanças públicas e promover as reformas. Optou pelo comportame­nto da cigarra e aumentou as despesas correntes, em prejuízo do investimen­to e das reformas.

Daí a importânci­a, para o projeto de reconstruç­ão nacional, que o próximo governo esteja consciente e determinad­o a fazer o que tem de ser feito, aproveitan­do o momento mais propício para distribuir pela sociedade a conta enorme que se acumulou nos últimos anos.

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